segunda-feira, 24 de abril de 2023

PEDRA



 

“O pássaro voa porque tem asas, não porque é livre.”

Esta frase está contemplada no texto do espetáculo FICÇÕES, do encenador Rodrigo Portella em diálogo com a obra SAPIENS de Yuval Harari.

Performance gigantesca de Vera Holtz secundada pelo músico Federico Puppi, que arrasa num solo de Bach.

Fui no risco. Eu não consegui comprar os ingressos e fomos pra fila da repescagem, uma hora e pouco antes do início da peça. A produção abriu para mais treze pessoas, eu e ela estávamos em 11º e 12º lugares.

Deu.

E valeu às pampas.

Harari afirma que o grande diferencial do homem em relação às outras espécies é a sua capacidade de inventar, de criar ficções, de imaginar coisas coletivamente e, com isso, tornar possível a cooperação de milhões de pessoas – o que envolve praticamente tudo ao nosso redor: o conceito de nação, leis, religiões, sistemas políticos, empresas etc.

Estamos usando nossa característica mais singular para construir ficções que nos proporcionem, coletivamente, uma vida melhor?

Estamos bem? Somos felizes?

Próximo ao encerramento a atriz dirige-se à plateia com algumas indagações e pede ao público que se manifeste concordando ou discordando permanecendo sentado ou ficando de pé.

Lembrei-me de certa vez que recebi mensagem em WhatsApp de Pretinha. Ela postou uma foto e uma frase como se dita por Liz, minha netinha, então com meses de idade: “Bom dia, vovô. Primeira vez que, quando acordo, levanto sozinha no berço.”

Em algum estágio da vida as criaturas ainda se desenvolvem.

Pois é.

O pássaro voa porque tem liberdade, não porque tem asas.

Isto é uma ficção.


 

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