quarta-feira, 10 de agosto de 2022

PEDRA

 


Entre minhas ocupações mais insanas está pensar sobre o declínio do Humano. E onde ele mais me inquieta diz da perda, inclusive em pessoas supostamente esclarecidas, da capacidade de simbolizar.

O prazer reduzido ao objeto.

Seguir assim é “evoluir”, como já apontei aqui, para a impossibilidade da Arte, toda ela, essencialmente, simbólica.

Quando um general se aproxima de Picasso e lhe pergunta apontando para Guernica: “Foi o senhor que fez isto?” e o pintor responde: “Não, foi o senhor”, a Arte grita em benefício das consciências.

Aqui, o Humano.

Há dias venho escrevendo “a partir” de meus netos e não “sobre” eles. Fui alertado recentemente pelo risco de expor os seus corpos, podendo fazê-los vítimas da barbárie que grassa.

Dor maior do que este risco real se fazer presente é o de não conseguir extrair daqueles que me acolhem a carga simbólica que busco atingir.

Talvez esta seja a dor do poeta, quando as letras que utiliza não são capazes de implicar em sentido para além delas.

“Debaixo dos caracóis de seus cabelos” é um verso que perde muito quando não se tem presente que o poeta ousou, provavelmente, dizer do que se passava na cabeça de Caetano de “uma história para contar de um mundo tão distante”.

Roberto compôs para Caetano quando o baiano vivia exilado em Londres.

Onde vamos parar se uma pedra for somente uma pedra, nada mais que uma pedra?

“Nunca me esquecerei deste acontecimento.”


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