domingo, 28 de agosto de 2022

AMÁLGAMA

 



Estamos desde a quinta-feira em Porto Seguro-BA.

Comemoramos aqui a passagem do aniversário de uma amiga-irmã com a qual convivemos há quase quarenta anos.

Além dela, seu marido e mais dois casais com quem, da mesma forma e pelo mesmo período, temos o privilégio de conviver.

No jantar de ontem, no belíssimo restaurante do Hotel Kyuara, nos perguntávamos o que determinou a longevidade de nossa amizade.

Foi Lydinha que, em minha opinião, trouxe o amálgama mais provável da química que nos entrelaça há quase quatro décadas: zelo.

Na saída do restaurante Lydinha me perguntou se eu conhecia o poema GUARDAR, do Antônio Cícero. Já em casa, de um dos casais do grupo, onde estamos hospedados, ela o colocou no celular na voz do próprio poeta que nos emudeceu a todos.

 

Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la.

Em cofre não se guarda coisa alguma.

Em cofre perde-se a coisa à vista.

Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado.

Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela.

Por isso, melhor se guarda o voo de um pássaro

Do que de um pássaro sem voos.

Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, por isso se declara e declama um poema:

Para guardá-lo:

Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:

Guarde o que quer que guarda um poema:

Por isso o lance do poema:

Por guardar-se o que se quer guardar.

 

Talvez seja isto que estamos todos necessitados para reduzir tantas rupturas. Rij, a querida aniversariante, há muitos anos, sempre que nos encontramos repete: “Cada dia que passa eu gosto mais das mesmas pessoas.”.

Eu também.



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