Ultimamente, de uns meses para
cá, no final da tarde de domingos as pessoas que me chegam às sextas vão-se e
me deixam só.
Eu e Deus.
Herdei de minha mãe o gosto
pelo recolhimento. Ela adorava sua casa, seu jardim, seu altar de Nossa Senhora
Aparecida (?), sua sala de visitas sempre fechada.
As circunstâncias contribuíram
para permitir a mim o trabalho remoto, ainda que eu me ressinta de não o poder
fazer com o calor das gentes e seus corpos.
Na juventude escrevi um texto
em que consta: “Meu caminho é uma marcha para a solidão”.
Fiquem tranquilos, isto está
longe de ser deprê. Antes pelo contrário. Eu me relaciono muito bem comigo, são
raras às vezes que eu e eu mesmo entramos em conflito a ponto de produzir debaques.
E com Deus, sempre foi
pacífica a relação. Temos um acordo tácito que vem funcionando bem: ele me
aponta o caminho e eu, quando o transgrido, assumo a responsabilidade.
Trodia eu fui trocar lâmpadas
e coloquei os pés da escada em falso. Precipitei do último degrau sem maiores
consequências. Deus estava bem ao meu lado e, se risse, eu teria a mesma reação
que Lelê quando se estrebucha no chão.
- Doeu, viu Deus!
Ontem, por sua vez, quando fui
dar o alimento aos bichos (passarinhos que vagueiam soltos pelos meus jardins,
galinhas, peixes e cachorras), deparei com Laka e observei que ela estava
estranha.
Laka é nossa cadela mais
velha, está com 10 anos e quatro meses, portanto, se fosse gente, estaria perto
dos oitenta anos de idade. Seu olhar para mim suplicava atenção.
Estava ofegante e com a boca
aberta. Resolvi levá-la ao veterinário. Coloquei-a dentro do meu carro no piso do banco dianteiro de
passageiro. Quando saia da garagem, olhei pela janela e vi Deus na varanda. Ele
fez sinal de positivo com o polegar.
- Não vou demorar..., eu disse
abanando a mão direita.
Na clínica, enquanto a veterinária
examinava Laka e dava o diagnóstico de intoxicação, aplicava injeção de corticoides
e prescrevia um remedinho, vi Deus sentado na sala de espera.
- Caramba? Não te deixei em
casa?
Passei o dia em reuniões
alternadas e, à noite, fui como de costume zapear um pouco os canais iutubianos
a procura de vídeos musicais. Aliás, como Deus, a música anda sempre ao meu
lado. Onde vou a levo. Sem ela e sem Ele é como se eu não fosse.
Só que antes,
inadvertidamente, entrei no canal de notícias e vi que haveria hoje cedo uma
parada militar.
Amanheci com o firme propósito
de escrever uma história e ilustrá-la com uma foto que denunciasse minha solidão.
E formosa.
Deus tá vendo.
Até breve.
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