A esperança é, às vezes, uma
droga alucinógena. Espere... Espere, não desligue, deixe eu me explicar.
Certa vez, deve ter uns vinte
anos, fomos eu e família com um grupo de amigos à uma festa em cidade próxima
de BH. Alugamos um micro-ônibus, já que rolaria umas e outras e todos queríamos
ir e voltar. Vivos.
O micro-ônibus era dotado de vídeo.
“Alguém tem uma fita boa aí?”, fui logo perguntando. Um dos passageiros, amigo,
disse: “Vocês não podem perder a oportunidade de verem isto. Vai mudar a vida
de vocês.”.
Pensei, caramba é tudo que eu
quero, sempre, mudar de vida. Fui tão privilegiado ao longo de toda a minha
vida que se houvesse alguma mudança viria para melhor.
O vídeo foi colocado uns
quinze a vinte minutos depois da partida e a viagem durou pouco mais de
meia-hora. Martírio, saca o que é? Pois bem, dobre. Horror total.
Pregação religiosa de droga
pesada, com o amigo amplificando os efeitos com comentários e ingredientes
químicos de um discurso assustador. Se não nos convertêssemos iríamos todos
queimar no fogo dos infernos.
Médico, diretor de hospital,
esclarecido, merecia crédito e eu pensei comigo: caramba, diabos é isso?
Pois é.
Lembrei-me desta “viagem”
ontem por conta de ter entrado numa de tralhar. Hoje, Pretinha, foi logo me
dizendo: “Ê, pai, entrou com política no face book, cuidado!”.
No ônibus, lembro-me, tentei inúmeras
vezes interromper meu querido amigo perguntando sobre os mistérios da sua fé. E
ele, como que transtornado pela droga, atropelava-se num mantra, repetido a
exaustão.
“Tome cloroquina, não use
máscara, isvermequitina nas veias...”, ou “Ele é o homem mais puro deste país,
pobre, chegou à presidência, para o desagrado das elites...” ou “No meu reino
nunca teve corrupção”, ou “Isso é uma gripezinha, coisa para maricas.”
Droga pesada esta esperança.
Quando desci do ônibus, estava
com o corpo todo doendo das chibatadas divinas. Entrei na festa, tomei uma,
duas e todas as outras que a minha consciência pudesse injetar.
Voltei e adormeci no ônibus.
Sonhei e escrevi um poema onírico.
Que eu não conto pra ninguém.
Vai que acreditem e vire uma droga.
Até breve!
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