sexta-feira, 12 de março de 2021

MALUCO BELEZA

 

 





A esperança é, às vezes, uma droga alucinógena. Espere... Espere, não desligue, deixe eu me explicar.

Certa vez, deve ter uns vinte anos, fomos eu e família com um grupo de amigos à uma festa em cidade próxima de BH. Alugamos um micro-ônibus, já que rolaria umas e outras e todos queríamos ir e voltar. Vivos.

O micro-ônibus era dotado de vídeo. “Alguém tem uma fita boa aí?”, fui logo perguntando. Um dos passageiros, amigo, disse: “Vocês não podem perder a oportunidade de verem isto. Vai mudar a vida de vocês.”.

Pensei, caramba é tudo que eu quero, sempre, mudar de vida. Fui tão privilegiado ao longo de toda a minha vida que se houvesse alguma mudança viria para melhor.

O vídeo foi colocado uns quinze a vinte minutos depois da partida e a viagem durou pouco mais de meia-hora. Martírio, saca o que é? Pois bem, dobre. Horror total.

Pregação religiosa de droga pesada, com o amigo amplificando os efeitos com comentários e ingredientes químicos de um discurso assustador. Se não nos convertêssemos iríamos todos queimar no fogo dos infernos.

Médico, diretor de hospital, esclarecido, merecia crédito e eu pensei comigo: caramba, diabos é isso?

Pois é.

Lembrei-me desta “viagem” ontem por conta de ter entrado numa de tralhar. Hoje, Pretinha, foi logo me dizendo: “Ê, pai, entrou com política no face book, cuidado!”.

No ônibus, lembro-me, tentei inúmeras vezes interromper meu querido amigo perguntando sobre os mistérios da sua fé. E ele, como que transtornado pela droga, atropelava-se num mantra, repetido a exaustão.

“Tome cloroquina, não use máscara, isvermequitina nas veias...”, ou “Ele é o homem mais puro deste país, pobre, chegou à presidência, para o desagrado das elites...” ou “No meu reino nunca teve corrupção”, ou “Isso é uma gripezinha, coisa para maricas.”

Droga pesada esta esperança.

Quando desci do ônibus, estava com o corpo todo doendo das chibatadas divinas. Entrei na festa, tomei uma, duas e todas as outras que a minha consciência pudesse injetar.

Voltei e adormeci no ônibus. Sonhei e escrevi um poema onírico.

Que eu não conto pra ninguém. Vai que acreditem e vire uma droga.


Até breve!


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