"O mundo não é como esperávamos.”
Esta frase é dita por um dos personagens do
longa dinamarquês que a Academia
Europeia de Cinema (EFA, na sigla em inglês) consagrou do diretor Thomas
Vinterberg, como Melhor Filme Europeu do ano. Grande vencedor da cerimônia de
premiação, que aconteceu de forma virtual "Another Round" conquistou
todos os quatro troféus a que concorria, incluindo ainda Melhor Direção,
Roteiro (também de Vinterberg) e Ator (Mads Mikkelsen).
Ecoa em 2020, ecoa nessa sombra artística
embaçada pela pandemia ecoa na profusão de factóides em que vivemos, a história
de quatro amigos, que estão literalmente estagnados na vida.
Durante um jantar entre eles – todos professores (entre 40 e 55 anos) contemporâneos em situações similares – surge um
debate acalorado acerca da teoria do psiquiatra norueguês Finn Skårderud de que
os seres humanos possuem um déficit de teor alcoólico no sangue, que deveria
ser compensado diariamente para uma vida mais plena. Achando que não têm nada a
perder, eles decidem testar essa hipótese, o que desencadeia uma louca e
tocante sequência de eventos.
Inspirados por essa
teoria, e principalmente focados no deprimido e deprimente Martin (Mads
Mikkelsen), o grupo com o desejo de escapar da rotina diária, começa a
experimentar grandes quantidades de álcool, e os primeiros resultados da experiência
são animadores, injetando energia nas suas vidas e galvanizando os alunos com
mais confiança e entusiasmo do que o normal.
À Martin falta disposição, encorajamento, falta
despertar do torpor onde o mundo o jogou, esvaziado em algum momento entre o
casamento e o agora. O personagem perdeu a motivação não apenas no trabalho –
onde vem sendo chamado a atenção – como também em casa, transformada em um
modelo robotizado de família industrial, sem paixão e sem entrega. Quando uma
faísca alcoólica o acerta junto a seus três companheiros de quadro negro, o que
parecia uma saída obviamente se mostrará o real labirinto.
Vale à pena assistir pela maravilhosa trilha
sonora e por, pelo menos, três cenas brilhantes:
1. quando eles tomam o primeiro porre pesado e,
posteriormente, há uma sucessão de quedas no vazio da escuridão, onde as
imagens e sua luz por si só já constroem um texto imaginário sem falar nada;
2. a seleção de imagens de líderes mundiais
bêbados, um registo documental irreverente que encaixa na perfeição nesta
viagem ao fundo dos copos.
3. A cena final, uma das mais belas cenas do ano,
um tour de force completo
que vai do calcanhar aos fios de cabelo e coloca a celebração e a efervescência
que o estado alcoólico, quando bem dosado, pode levar ao humano.
Oportuno e necessário por este momento de
ressaca mundial; este entorpecimento no mundo de hoje, uma paralisia seguinte a
um furor alucinante que nos prometeu soluções, consertos e qualidade de vida.
Se nem a Dinamarca viu esse momento contemporâneo acontecer por completo, fica
até difícil cobrarmos uma evolução no Brasil.
Até breve.
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