quinta-feira, 29 de outubro de 2020

FOSSO

 


Dos últimos meses, sobrevivo a quatro afastamentos.

Todos eles por minha e exclusiva responsabilidade. Eu poderia, eu deveria e se fosse hoje, estou certo, eu gostaria de tê-los evitado.

Não é uma questão de ligar o celular ainda que eu tenha o número de todos os envolvidos e eles o meu.

Meus atos não foram condizentes com o meu discurso, antes pelo contrário. Expuseram o pior de mim, que conheço. O que os amplifica e agrava.

“Falar” aqui sobre isto ainda sinaliza uma estranheza, própria de mim, mas é que todos sabemos que “este lugar” acolhe nossas partes mais dúbias, inconfessáveis, verniziantes.

Tenho convivido comigo com certa reserva, não que eu me cobre um perdão impróprio, descabido e sem efeitos naqueles que marquei. A coisa é comigo e, por extensão, com todos que me leem.

O que fazer com a pior parte de nós? Levá-la à um analista? Conscientemente?

Operar a culpa pela reminiscência familiar, deixá-la lá nomeando-a, classificando-a, pacificando-a deliberadamente...

Saber-se de porquê.

A pandemia acendeu lanternas com raios fulgurantes de sóis em ocaso.

Incendiaram a minha besta interior, ainda que ali dentro more uma lâmpada cruelmente apagada, desenérgica.

Todo um mistério.


Até breve.

terça-feira, 20 de outubro de 2020

TRUSTO

 

“As pessoas usam o Google porque querem, não porque são forçadas ou porque não conseguem encontrar alternativas.”

Kent Walker, vice-presidente do Google

 

Eu não acho, mas devo sim pedido de desculpas ao leitor que ainda me acessa. Desde que iniciei a edição de meu blog foi o período mais longo de ausência.

Pois é, continuo vivo, pelo menos nos contornos oficiais que dão a cada um de nós esta condição. Estar vivo ainda é demonstrável. Digo isto porque, aposentado que sou, anualmente sou obrigado a apresentar-me ao banco pagador do meu malefício inessiediano e, de posse da carteira de identidade e cartão do banco, mostrar-me vivo.

Existencialmente, continuo com dúvidas.

Existir, ou pelo menos fazer questão de, está sim cada vez menos interessante.

Há alguns meses deixei de acompanhar noticiários, decapitações em via pública de professores nos arredores da cidade luz, campanhas eleitorais aqui e acolá, cuecas abarrotadas de reais desestéticos e deséticos, aumento da criminalidade e, ainda, a 19, não, muito obrigado.

Prefiro o ignoramismo, termo cunhado agora para sugerir nanismo de realidade objetiva traumática nauseante crônica.

Por outro lado, há sim algo do que se poderia cronicar.

O Estado americano ingressou em juízo contra a Google, este truste. Não é embuste não, é pra valer. Li hoje no Estadão.

De há muito deveriam ter acabado com este absurdo. “Alguém” que sabe tudo, sobre tudo, de tudo, de todos, sobretodos, para e contra todos. Não é o fim? Onde vai parar o Estado soberano se trusticamente alguém se achar capaz de substituí-Lo?

Aí, jesuses, mamãe me acode! A coisa ficou muito explícita agora.

Quero viver pra ver se vai acabar em pizza, em um acordo leviano entre causídicos afortunados em verdes notas. Até na América, quase sempre, o filme acaba nestes tipos de acordos.

Enquanto o já sabido não ocorre, eu me permito, parodiando o Descartes (Penso, logo desisto), supor o que viria se o google passasse a imperar. Se bem que, se já não impera enquanto o Estado durmência em sua catatonia...

Só que isto eu não conto pra ninguém ainda que eu pudesse ganhar uma nota se colocasse num provável best seller.

Pois só não o faço por isto. Não coloco a mão em notas cuja melodia e letra desandam.

 

Até breve.

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

REDE

 

Publiquei em minha página do FB:

Mais de duas pessoas, gentilíssimas, perguntaram-me sobre minha ausência daqui e do meu blog.

Respondo: estou reduzido à minha insignificância, tentando ocupar-me com aquilo que sobra de mim.”

 

Claro que “insignificância” resume numa provocação aos afetos. Do lado de cá eu peço atenção, como desde sempre o fiz.

Adoro o palco, holofote, ribalta.

Imagina se minha luz não fosse incendiosa, reluzente, esclarecedoramente provocante. Especialmente agora, covidante tensão no obscurantismo que grassa.

Recolher-me é sempre um trabalho articulado de fuga, um ato de loucura controlante. Não fosse essa loucura, estaríamos em cavernas, recolhidos aí sim à insignificância natural.

De jeito maneira nenhuma, sem chance.

Agulhar ruge, ou será urge?

Sempre souberam todos que a pretensão é traço da minha humildade. Eu sempre soube de um tudo que interessa. O resto é frangalhos, outros alhos, bugalhos.

Vou direto ao ponto.

Isolar-se é um ato necessariante. Mesmo que alarmado pelos circunstaciamentos virais. Não sei por que, mas lá atrás, de há muito imaginava que um dia em acabaria sozinho aqui luziamente falando.

Santa Luzia é padroeira dos olhos, pelo menos eu acho.

Aqui, do alto de minha solidão compulsória e compulsiva, dá para ver uns trens, bem encadeadamente, um com o outro, um a partir do outro, um condicionando outro, como numa teia.

Urge a Existência.

Assisti na Netflix o filme do dilema das redes. Os caras que inventaram o monstro querendo que seus filhos não padeçam das garras. Bacana o contemporâneo, tem alucinação geral até sem pico na veia.

É só sair das cavernas e com néctar, pirar geral.

Tem trocentos anos que passo por uma avenida em BH, a Cristiano Machado. Diversos viadutos cruzam a via sustentados por pilares. Em alguns deles foram pintados poemas. Simbólica imagem. A poesia como sustentáculo dos andares.

“Pássaros voam livres presos por ares”... (verso de um poema).

 

Voltei às garras.


Até breve.