“Tempestade perfeita.” Esta é a expressão que analistas da realidade têm usado
para designar o que se passa.
Ocorre
que a realidade não consegue mais se expressar por meio da linguagem, na medida
em que não há escuta.
Na
juventude tínhamos uma expressão: “Falou e disse.”. As consciências resultavam
de alguma reflexão. Houve debate.
Hoje
o que há é embate. Mera troca de duas letrinhas, uma apenas de posição na
palavra.
E
o embate resulta em fora. Fora Lula, fora Dilma, fora Temer, fora Bolsonaro,
fora Congresso, fora STF, fora... O embate se dá na periferia da linguagem. Não
há conteúdo, não há “dentro” posto que não há debate.
Não
há diálogo, troca de ideias essenciais, portanto não há linguagem.
A
pandemia expressa simbolicamente a exaustão de um tempo. Estamos todos ensimesmados
dentro de nossas convicções. O horror do outro nos contamina e pode nos matar.
Ninguém
é, de fato, para o outro. No máximo, com o outro. Um outro cambiável, por
razões as mais superficiais e inconsistentes.
Há
um vazio fundante nas relações. Não há contágios legítimos de quereres,
saberes, teres, seres. Nada é. Tudo está sendo. Em nada.
Ocorre
que fatores externos determinam o viver. A economia, o trabalho, a sobrevivência.
A tecnologia colocará fora inúmeros postos de trabalho e estações novas serão
domésticas.
Esta
revolução acelerada pelo vírus determinará exclusões avassaladoras de seres
humanos para a periferia da existência. Milhões estarão fora.
As
ruas estarão ocupadas por tensões profundas. Por todas as faltas e sem a
linguagem, não se saberá por que clamam. As faixas e seus dizeres estão vazios tanto
quanto aqueles que empunham seus mastros.
Nas
madrugadas seres exóticos e de outro mundo ocupam as praças de todos os poderes
e empunhando suas tochas medievais entonam mantras transloucados. Ou não.
A
proliferação de meios e modos de se comunicar aguda-se. E a liberdade se sufoca
pela ausência de sentido e escuta daquilo que embarca. Tudo está passível de
ser judiciado, porque vem de um “eles” sempre monstruoso.
O
humor é macabro.
Todo
riso guarda certa esquizofrenia coletiva, própria dos patologicamente
diagnosticados por idiotia.
Somente
daqui a 980 anos a espécie humana (se ainda estiver por aqui) experimentará o
privilégio de cruzar um século e um milênio.
Nós
o tivemos. Resta-nos saber se continuaremos em tempestade ou vamos seguir em
beligerância. Ou, como já escrevi, em horrigerância.
Não
há nada de belo no que se passa. Horror é o que há.
Até
breve.
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