quarta-feira, 20 de novembro de 2019

DEMANDA




Dói em mim a ignorância. Sinto-a fisicamente. O alargamento da complexidade do tempo presente e a multiplicidade de paradigmas que se apresentam para que possamos dar conta da realidade, me esgota.

Minha avidez por compreender a partir de referências intelectuais de profundidade que o quadro exige, me extenua.

As réguas com as quais medíamos os fenômenos não estão calibradas e o futuro não é mais como costumava ser.

Desde sempre vivi na superfície, sou formado por lacunas abissais de conhecimento. Some-se a isso uma preguiça doentia e uma irresponsabilidade intelectual condenável.

Parece paradoxal, mas é como eu digo. Eu merecia de mim mais atenção e zelo, talvez derivasse disso uma contribuição efetiva de minha prática com as letras.

Como se não me bastassem a preguiça e a irresponsabilidade ainda há uma mazela em mim que repugna: a inveja.

Senti dores musculares decorrentes de sentimentos de extensa inveja hoje enquanto assistia, em vídeo, à conferência de Manuel Castells, professor emérito de Sociologia da Universidade da Califórnia, Berkeley e professor de Comunicação da Universidade do Sul da Califórnia.

Castells é um dos maiores especialistas do mundo em explosões sociais. Este sociólogo e economista espanhol, que também é um dos autores mais citados nas ciências sociais, analisou a crise que a democracia liberal está vivenciando no seminário "Explosões Sociais: Uma Visão Global", organizado pelo Centro de Estudos Públicos, do Chile, no último dia 06.

Eu que deveria estar ali, dizendo todas aquelas coisas.

"Os movimentos sociais não são movimentos políticos, os movimentos políticos são políticos, buscam a transformação do Estado. Os movimentos sociais são aqueles que buscam a emergência, o debate de novas formas culturais", ao explicar as características do fenômeno. "O que acontece é que os cidadãos não têm confiança em seus parlamentares ou seus governos ou seus presidentes ou especialmente em seus partidos políticos. Há uma rejeição unânime de todas as partes, eles não são considerados legítimos ou viáveis.

Para Castells ocorre uma ruptura entre governados e governantes que se estende de um ao outro lado do planeta, amplificado pelo advento da tecnologia de informação que neste momento contempla 7 bilhões de números de telefones móveis.

E em todas as manifestações, em que pesem algumas nuances específicas locais, todo o mundo clama por algo que se pode traduzir numa palavra: DIGNIDADE.

Misturado à inveja nutro um imenso fascínio por pessoas como este catalão com sua ausência total de rigidez teórica, imenso apego ao estudo da realidade, forte exercício da imaginação para equacionar soluções aos problemas emergentes e, sobretudo, uma invejável carga ética e valorização da dignidade humana.

Ave, Castells!


Até breve.

Nenhum comentário:

Postar um comentário