sexta-feira, 29 de novembro de 2019

KKKKKKKKKK




Pediram-me alegria.

Basta, Agulhô, de tanto astral dow. Leva pra cima o seu texto. Onde foi parar o seu humor, sua ironia?

Fale sobre o amor. Sobre Lelê, Liz, Tim e Totô, seus netinhos queridos. Deixe nossas mentes adormecerem e arrebate nossos corações. Busque o melhor de sua veia poética e nos acalente um tempo.

Ninguém mais aguenta análise ou denúncia de fatos. Eles são tão contundentes e óbvios, que gastar telas e telas com esse tema, acaba em um porre e em uma ressaca de amargar.

Outro ponto: não tente falar entre linhas nos seus posts sobre filmes, peças e livros que ninguém leu ainda e provavelmente, até por sua indicação, jamais lerá. Você mesmo não se compreende, como espera que alguém se interesse pelo que você escreve? Já há muitos labirintos, você ainda propõe os seus próprios?

Tenha dó!

Fale sobre a beleza. Lembra que certa vez você postou no Facebook uma foto do pé de lichia do sítio carregado das frutas exalando um vermelho abissal natalino? Tire outra foto deste ano, nos mande e diga algo que nos faça renovar esperanças.

Vamos cara! Conte-nos pelo menos uma piada.

Tá bom, tudo bem. Bora lá.

Renato, colega de um Conselho de Empresa da qual faço parte, nos contou ontem que Paulo, seu amigo, também corredor de rua (dessas inúmeras que hoje têm em BH) perguntou se ele iria correr em determinada prova há algum tempo. Renato respondeu que não e Paulo perguntou se poderia correr com o número de inscrição dele. Renato disse que sim e emprestou o crachá.

Poucos minutos depois de terminada a corrida, Renato recebeu um telefonema de Paulo, ofegante.

- Aí, cara, brigado hein! Você acabou de tirar o terceiro lugar na prova. Correu a média de 15km/h. Parabéns!

Infame, né? Mas da vida real.

Não, Agulhô, nos conte uma piada de português, de bêbado, de doido, de veado ou de negro. Aliás, nos conte uma piada que integre estes personagens, politicamente incorreta.

O Secretário da Descultura Federal empossou o presidente da Fundação Palmares, instituição criada para defender e promover a integração e o desenvolvimento da cultura afro-brasileira.

Num é que o sujeito no discurso de posse disse que as novas gerações devem agradecer pela escravatura, e que os negros no Brasil vivem muito melhor do que aqueles da África?

Mas isso não é propriamente uma piada, Agulhô! Por favor, concentre-se.

Ah, sim, a piada. Perguntado por jornalistas sobre a declaração do comandante da Palmares, o Presidente da República, declarou.

- Eu não o conheço pessoalmente...

E o bêbado, falta o bêbado, onde ele entra?

Ah, verdade. Faz parte de outra, ótima. Sujeito oculto no processo julgado nesta semana na TRF-4, de um tal de sítio em Atibaia. Viram as teses do advogado de defesa?

Eu chorei de rir.

Prometo que, no próximo post, conto piadas menos infames.



Até breve.

domingo, 24 de novembro de 2019

SUTILEZA




Não sou dos piores, mas sou Homem – e, acho, devo escrever sim com H maiúsculo.

E não me coloco aqui reduzido à condição de gênero, mas Homem como produto e reprodutor de uma Cultura, Homem como patrono de um modelo de estar e transformar o mundo.

Homem, que como disse Simone Beauvoir: “Vocês fizeram todas as peças.”.

Esta frase dirigida por ela à Sartre tem iluminado em mim a reflexão do lugar deste Homem como principal protagonista da História, e que protagonismo.

A VIDA INVISÍVEL, filme do diretor cearense Karim Aïnouz é um soco na boca do estômago deste Homem.

Retrata finamente a condição das mulheres no Brasil nas décadas de 1940 e 1950 com os corpos reservados à propriedade dos Homens e destinados à procriação. Duas cenas são reveladoras.

A primeira, quando uma das personagens comunica ao pai e ao marido que acabara de receber a notícia de que havia passado no concurso para o Conservatório de Música. O marido, de forma irônica e grosseiramente: “Então agora eu quem vou ter que olhar o menino, cuidar da casa, fazer comida?”. E recebe o apoio veemente do sogro: “Minha filha, seu marido tem razão. Você não pode mesmo ir para o Conservatório.”.

A outra, quando a mesma personagem, tem um surto, atendida por um médico que diz ao marido: “Não se preocupe, ela estará pronta para parir novamente.”.

A cada salto no tempo da trama, percebemos as seguidas restrições às oportunidades de escolhas das personagens como a música, os amores descartados pela posição de mãe solteira, o cerceamento de opinião devido à condição de mulher, mãe, filha, esposa.

Aïnouz não precisa gritar a indignação contra o patriarcado: basta acompanhar a trajetória de décadas entre as personagens centrais, tão próximas e tão distantes, imaginando uma para a outra um destino melhor do que ambas realmente tiveram.

Recentemente citei Eduardo Galeano e sua tese sobre o arco íris terrestre, dentro de uma perspectiva da construção da História. A mulher teria sido, para ele, um dos matizes que foram impedidos de se manifestarem durante séculos e, portanto, invisíveis.

A História Humana forjada a ferro, fogo e lágrimas pelo Homem e Branco me ocorre como uma das questões mais relevantes a serem enfrentadas pelo contemporâneo. É verdade que a Mulher a partir dos anos 60 do século passado, por força de inúmeros movimentos libertários alcançou espaço de visibilidade.

No entanto, há amplos espaços de obscuridade guardados e defendidos por este Homem. Eu mesmo, em minha mais recôndita intimidade, às vezes me percebo, em pensamento, palavras e obras como um fiel representante da ignomínia.

A partir de mim mesmo sei que não será fácil depurar o sangue que corre nas veias daqueles que se julgam primazes. Há muito recalque, instinto primitivo, ferocidade componente neste Homem.

De novo o cinema, dando visibilidade às nossas mais dramáticas mazelas.

Ave, Aïnouz!


Até breve.

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

SINTONIA




O governo federal, em linha e coerente com a política de Mais Brasil e Menos Brasília, instituiu ontem através do Ministério da Educação e do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, um mecanismo para a criação de um canal de comunicação direta com todas as escolas do país.

Tal expediente tem como propósito o controle das práticas pedagógicas, disciplinares e institucionais dos órgãos de ensino facultando aos alunos, pais, professores e outros interessados em apontarem falhas, inadequações, comportamentos e/ou práticas nocivas e em desacordo com a política educacional vigente.

Assim, penso, parcela da sociedade (vinculada à questão educacional) terá como acessar diretamente aqueles ministérios para levar a eles as condições de funcionamento dos estabelecimentos de ensino.

Com a iniciativa a enxurrada de questões que desaguarão, em ambos os órgãos de Estado, seram analisadas e tomadas providências que tanto anseiam pais, mestres, alunos, bem como a sociedade em geral.

Em linha direta o governo federal não poderá deixar de tomar contato com todas as mazelas que vitimam a educação no país desde o desvio criminoso de verbas; a precariedade de instalações, móveis, utensílios e, sobretudo instrumentos pedagógicos; conteúdos distantes da realidade objetiva do educando e tantas outras questões que emolduram o quadro lamentável em que se encontra, há décadas, a parte mais sensível da alma nacional: a formação de seus cidadãos.

É claro que a medida receberá crítica dos opositores de plantão, o que mostra a evolução da democracia em nosso país. Questionarão que tal decisão aplica-se a governos autoritários, de exceção, politiburros e outras bobagens do gênero.

Ah, falando em gênero, reside aqui também uma grande expectativa com o governo central com o que receberá através do canal direto: ele poderá empreender ações corretivas sobre qualquer disfunção, aberração ou incitamento a opções transmutantes.

Escrevi este post hoje quando o dia amanhecia com a intenção de postá-lo agora à noite. De fato poderia continuar aqui falando de mais esta trapalhada do Exército de Brancaleone, mas vou não.

É que eu assisti agora à noite ao filme do Karim Ainouz, A Vida Invisível, cujo epílogo marca a grandiosidade de Fernanda Montenegro. Antes de entrar no cinema passei em uma livraria e comprei a biografia dela.

Fiquei pensando em Manoel Castells, em quão distante está a visão dos governantes em relação à realidade dos governados e o que representam os movimentos em benefícios de maior dignidade.

Na orelha do livro de Fernanda o editor faz uma citação de Drummond sobre a diva: “Não se sabe o que mais admirar nela: se a excelência de atriz ou a consciência, que ela amadureceu, do papel do ator no mundo. Ela não se preocupa em elevar ao mais alto nível sua arte de representar, mas insiste igualmente em meditar sobre o sentido, a função, a dignidade, a expressão social da condição de ator em qualquer tempo e lugar.”

Ave Castells!

Ave Fernanda!


Até breve.

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

DEMANDA




Dói em mim a ignorância. Sinto-a fisicamente. O alargamento da complexidade do tempo presente e a multiplicidade de paradigmas que se apresentam para que possamos dar conta da realidade, me esgota.

Minha avidez por compreender a partir de referências intelectuais de profundidade que o quadro exige, me extenua.

As réguas com as quais medíamos os fenômenos não estão calibradas e o futuro não é mais como costumava ser.

Desde sempre vivi na superfície, sou formado por lacunas abissais de conhecimento. Some-se a isso uma preguiça doentia e uma irresponsabilidade intelectual condenável.

Parece paradoxal, mas é como eu digo. Eu merecia de mim mais atenção e zelo, talvez derivasse disso uma contribuição efetiva de minha prática com as letras.

Como se não me bastassem a preguiça e a irresponsabilidade ainda há uma mazela em mim que repugna: a inveja.

Senti dores musculares decorrentes de sentimentos de extensa inveja hoje enquanto assistia, em vídeo, à conferência de Manuel Castells, professor emérito de Sociologia da Universidade da Califórnia, Berkeley e professor de Comunicação da Universidade do Sul da Califórnia.

Castells é um dos maiores especialistas do mundo em explosões sociais. Este sociólogo e economista espanhol, que também é um dos autores mais citados nas ciências sociais, analisou a crise que a democracia liberal está vivenciando no seminário "Explosões Sociais: Uma Visão Global", organizado pelo Centro de Estudos Públicos, do Chile, no último dia 06.

Eu que deveria estar ali, dizendo todas aquelas coisas.

"Os movimentos sociais não são movimentos políticos, os movimentos políticos são políticos, buscam a transformação do Estado. Os movimentos sociais são aqueles que buscam a emergência, o debate de novas formas culturais", ao explicar as características do fenômeno. "O que acontece é que os cidadãos não têm confiança em seus parlamentares ou seus governos ou seus presidentes ou especialmente em seus partidos políticos. Há uma rejeição unânime de todas as partes, eles não são considerados legítimos ou viáveis.

Para Castells ocorre uma ruptura entre governados e governantes que se estende de um ao outro lado do planeta, amplificado pelo advento da tecnologia de informação que neste momento contempla 7 bilhões de números de telefones móveis.

E em todas as manifestações, em que pesem algumas nuances específicas locais, todo o mundo clama por algo que se pode traduzir numa palavra: DIGNIDADE.

Misturado à inveja nutro um imenso fascínio por pessoas como este catalão com sua ausência total de rigidez teórica, imenso apego ao estudo da realidade, forte exercício da imaginação para equacionar soluções aos problemas emergentes e, sobretudo, uma invejável carga ética e valorização da dignidade humana.

Ave, Castells!


Até breve.

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

MENDIGO




Não sei se aconteceu foi só comigo. Eu prefiro acreditar que sim. Num pode ser que todo mundo ficou sem assunto, pelo menos para produzir um texto que valha a pena de ser degustado.

Caramba, eu num consigo pensar em nada que verdadeiramente justifique uma lauda, uma lauda e meia.

A vantagem dos imbecis é que se não há nada que possa justificar um texto eles inventam e eu confesso que acompanho, às vezes. Na verdade, na maioria das vezes.

Eu gosto de música brasileira. Muito, mas muito mesmo. Pudesse eu andaria com um fone no ouvido. Qualquer hora eu tomo coragem e compro uma dessas gerigonças tecnológicas e me aparelho.

- Cê ouve o quê, Gulhô? Perguntarão.

Pois é, reside aí o assunto para ocupar este espaço. Fui ao encontro do novo, quebrar paradigmas, fugir do lugar comum daqueles caras de minha época, os caras do “falô e disse, bicho!”.

Dia desses perguntei pro Vlad, meu mais velho, o que ele anda ouvindo.

- Umas banda inglesa...

Tendi.

Aí rumei de procurar googlenando e joguei lá: as cinquenta músicas brasileiras mais ouvidas no ano de 2019. Fiquei estupefastético com a pesquisa. Listo aqui algumas com o número de visualizações no iutubes.

Ø  Zé Neto e Cristiano – Largado às traças  -  676.692.015
Ø  Zé Neto e Cristiano – Notificação preferida – 540.170.533
Ø  Melim  -  Meu abrigo  -  275.267.207
Ø  Matheus e Kauan  -  Vou ter que superar -  265.680.413
Ø  Melim – Ouvi dizer  – 205.041.403
Ø  Ana Vitória   -   Fica  -  167.783.372

Ocês que me perdoem, mas vou ser sarcástico. Se quiserem vão lá no google e engrossem as estatísticas algoritibanas.

Eu fico aqui junto com outros 1.313.259, uma ninharia, com a bobagem composta por uns tolos miltonchicanos de uma época que a gente tinha, acreditem, corações e mentes.

O que será que me dá
Que me bole por dentro
O que será que me dá?
Que brota à flor da pele
O que será que me dá?
E que me sobe às faces
E me faz corar
E que me salta aos olhos
A me atraiçoar
E que me aperta o peito
E me faz confessar
O que não tem mais jeito de dissimular
E que nem é direito ninguém recusar
E que me faz mendigo
Me faz suplicar
O que não tem medida, nem nunca terá.
O que não tem remédio, nem nunca terá.
O que não tem receita.

O que será que será?
Que dá dentro da gente
E que não devia
Que desacata a gente que é revelia
Que é feito uma água ardente que não sacia
Que é feito estar doente de uma folia
Que nem dez mandamentos vão conciliar
Nem todos os ungüentos vão aliviar
Nem todos os quebrantos toda alquimia
E nem todos os santos
O que será que será?
O que não tem descanso, nem nunca terá.
O que não tem cansaço, nem nunca terá.
O que não tem limite.

O que será que me dá
Que me queima por dentro, será que me dá?!
Que me perturba o sono, será que me dá?!
Que todos os tremores vem agitar
Que todos os adores me vem atiçar
Que todos os suores me vem encharcar
Que todos os meus nervos estão a rogar
Que todos os meus órgãos estão a aclamar
Que uma aflição medonha me faz implorar
O que não tem vergonha, nem nunca terá.
O que não tem governo, nem nunca terá.
O que não tem juízo.

Perdoem-me, mas minha indignação pelo que está aí é uma “água ardente que não sacia”.


Até breve.


quarta-feira, 13 de novembro de 2019

GUILHOTINA




“O melhor negócio do mundo no futuro será a misericórdia.”
(Fala do protagonista do filme EUFORIA, em cartaz na Netflix)


Eduardo Galeano, em vídeo O Tempo e o Modo, nos convida a pensar. Ele diz que o arco-íris celeste é menor do que o arco-íris terrestre.

Todas as cores naturais estão contempladas no fenômeno celeste. Nós vemos apenas aquelas com as quais nos identificamos.

As “cores” do fenômeno terrestre são mais diversas e mais difíceis de serem aceitas, vistas, absorvidas ao longo de toda a História.

Ele se refere a quanto empobrecemos ao longo da História na medida em que excluímos tantas “cores” que deveriam ter sido usadas para compor o mosaico da tela humana.

As mulheres foram excluídas. A Declaração dos Direitos Humanos redigida pós queda da Bastilha foi um documento elaborado e imposto pelos homens. Uma mulher rebelou-se e entendeu que deveria ser também escrita a Declaração dos Direitos da Mulher. Ela foi decapitada.

Os negros, os índios, os pobres, os exilados, os refugiados. Pedissem que a Guerra de Tróia fosse contada por um dos soldados que nela combateram provavelmente teríamos uma versão de “cor” diferente daqueles que a relataram.

As guerras são historiadas pelos generais que não participam da luta, portanto não sabem do olor do sangue derramado.

O tempo histórico foi registrado ao modo da crueldade e da barbárie. Nenhuma raça do planeta se mostra tão iníqua e tão empobrecida diante da riqueza e da abundância de suas imensas potencialidades.

Por um feliz acaso depois de ter assistido ao vídeo citado, me deparei com o filme italiano EUFORIA, na Netflix.

Não é de todo possível fazer uma relação direta entre o vídeo e o filme, exceto por uma curta cena do enredo. O protagonista é um exitoso arquiteto que está negociando com autoridades da Europa a construção de abrigos para refugiados.

Na cena, ele está em um restaurante com um amigo e o irmão. Depois de tecer considerações sobre o projeto ele diz a frase epígrafe deste post.

O filme é belíssimo de uma “cor” diversa à ligação que faço com o vídeo de Galeano. Vale a pena ser visto pela sua contemporaneidade, pela beleza do drama e pela qualidade da fotografia além da performance do ator principal.

Fui dormir pensando sobre o privilégio do acaso em ter me defrontado com as duas obras.

Minhas retinas fatigadas e delimitadas pela minha imensa ignorância têm me impedido de olhar ao arco-íris terrestre e, no mínimo, compreender melhor o espectro amplo da sua matriz.

Talvez derive daí toda a minha pequenez.



Até breve.

terça-feira, 12 de novembro de 2019

PRESCRIÇÃO



“Só sei que nada sei, e nem disto eu estou certo.”
PIRRO, filósofo grego morto em 275 a.C.




Eu amo um primo meu, não só porque ele seja meu oftalmologista, mas por ele ter um coração cheio de mel. Foi ele quem me despertou para visitar meus parentes em Elche, na Espanha. E lá, foi bom de doer.

Quando de uma consulta sobre minha visão ele me disse que eu tinha algo de raro, uma vista que enxerga ao longe e outra que enxerga de perto. Egóico como sou não precisava de um melado maior.

Dali em diante fiquei cheio de si (como diriam os paulistas), já que - então - poucos gozam do privilégio de enxergar com amplitude. Para eu, que sempre me considerei o sujeito mais humilde do mundo, não precisaria de mais nada.

No dia a dia percebo mesmo essa prerrogativa. Dirigindo automóvel eu às vezes no trajeto me vejo já no destino e se não é a outra visão de curta distância eu viveria colidindo com o carro imediatamente à minha frente.

Se bem que isto parece não ter nada com a visão, mas com outra característica minha que é a ansiedade. Enfim, por que estou derivando sobre esta bobagem?

Ah, sim, para discorrer sobre o que se passa e por força de nossas escolhas.

Com a vista longa analiso o brilhantismo das propostas dos administradores da área econômica para criar mecanismos de saída da crise aguda pela qual passam as finanças públicas. Se houver seriedade legislativa vamos sim ter como resultante do debate projetos relevantes em boa direção.

Com a vista curta, minha íris perde luz. Os dois polos advindos do topo da pirâmide institucional, perpassando suas bílis pelas redes sociais e celebrizando oportunistas de plantão constroem a cena mais obscura dos últimos tempos.

As eleições de 2018 não podiam desaguar senão nesta catástrofe. Afinal a maioria não escolheu nenhum e nem outro que estão ainda nos palanques. O voto em um foi para que o outro não vencesse e deu no que deu. A maioria ficou com ambos que não queríamos.

Coisas da regulação normativa da democracia. Até hoje sofro com a forma que meu grito foi calado. Ao anular o meu voto assim como a grande maioria que votou contra para não votar a favor, não fomos considerados.

Talvez tenhamos que voltar às ruas de junho de 2013 para ouvir que o BASTA era para tudo o que estava ali. E em 2019 recebemos da história a consolidação do que mais repudiamos. Um condenado solto e um transloucado ungido.

E como nada pode estar tão ruim que não possa piorar a vizinhança se engalfinha também padecendo da mesma mazela: a ausência de líderes com estatura de estadistas para enfrentar a complexidade dos desafios que se apresentam.

Recebi de um empresário amigo que, inadvertidamente, acompanha meu blog, uma mensagem no zapzap, propondo que eu renovasse a esperança e procurasse tomar uma injeção de otimismo na veia.

Desde piquininim eu ouço dizer que o Brasil é o país do futuro. Como meu futuro deve contemplar, no melhor das hipóteses, duas décadas, acho que vou tomar duas ampolas de Otimismum na veia.

E duas capsulas de Omeprazol para atenuar o refluxo.

Tornar-me-ei, como tantos, em um drogadito.


Até breve.

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

LAVANDERIA





“O homem não é tão ferido pelo que acontece, e sim por sua opinião sobre o que acontece.”
Michel de Montaigne


Ingressei-me no processo formal de produção capitalista no ano de 1967, então com 15 anos de idade, quando tive a minha Carteira de Trabalho assinada pela primeira vez.

Antes disso, operei na informalidade, vendendo bolinho de feijão de porta em porta, distribui panfletos de propaganda, fiz faxina em lojas comerciais, fui balconista.

Não se assustem com a foto acima na CT. Sou eu mesmo, em versão clicada por aqueles fotógrafos lambe-lambe do Parque Municipal de BH.

Desde sempre tenho me empenhado em dar o melhor de mim para a maximização de resultados, fruto de meu trabalho. Recebi até aqui, como recompensa, em boa medida.

Entre 1967 e 1992, ascendi na carreira profissional, passando por organizações de grande porte dos setores têxtil, químico, minerador, siderúrgico, automobilístico, alimentício e financeiro.

Ao longo daqueles 25 anos, boa parte deles, estive a frente de negociações trabalhistas enquanto representante do campo patronal. Também rodei o país participando de mesas de debates, palestrante, conferencista em inúmeros eventos que problematizavam o trabalho dentro da economia capitalista.

Participei ainda de inúmeros cursos, congressos, simpósios, visitas técnicas, inclusive na Universidade do Trabalhador cujo patrono era o extraordinário educador Paulo Freire, com quem estive um par de horas debatendo em Cajamar. Nada melhor do que poder respeitar os opositores de nossas ideias que, até por isto, nos fortalecem e iluminam nossas convicções.

Nunca tive dúvidas daquilo que representava: o capitalismo em sua vertente mais potente – a geração de riqueza para todos nele aplicados.

Tenho lembrança do respeito e admiração por parte de todos com quem me relacionei: líderes sindicais de expressão nacional, os quais, mesmo em tempos das mais agudas crises negociais, sabiam que eu defendia que entre a tese (maiores lucros) e a antítese (maiores salários) buscávamos a melhor síntese.

Tenho isto como expressivo patrimônio pessoal: ter sido executivo defensor do melhor modelo capitalista. Pude contribuir para que organizações e seus colaboradores expandissem suas riquezas.

Em 1993 instalei minha empresa de consultoria. No mesmo ano fui convidado a dar aulas pela Fundação Dom Cabral, pelo IBMEC e pela FGV. Convivi com dezenas de milhares de executivos juniores, plenos, seniores e masters em programas de formulação estratégica e desenvolvimento de liderança de alta performance.

Essa oportunidade é outra riqueza de valor incomensurável contabilizada no meu patrimônio: pessoas com as quais pude, enquanto supostamente eu “dava aulas”, aprender mais do que todos.

Fui me afastando da cátedra na medida em que a consultoria roubava das salas de aulas, minhas horas de aplicação. A partir do início dos anos 2000 até hoje tenho me dedicado exclusivamente a prática consultiva e atuado em Conselhos de alguns grupos empresariais.

Às vezes lamento por não trazer aqui no blog experiências (e não são poucas) de sucesso na condução de projetos estratégicos. Não o faço por acreditar que apenas aos meus clientes pertence o protagonismo, pertence a eles o sucesso e, afinal, me pagaram por isto.

Essa longa introdução foi para dizer que, embora não goste de rótulos, pelas circunstâncias abro uma exceção e me autonomeio como capitalista.

E por que o faço? Para me distinguir e junto com todos aqueles que comigo se assemelham. Aqueles que diuturnamente, durante toda a vida, fizeram do trabalho o seu único meio para a geração de riqueza para si e para tantos que dela se beneficiaram.

Para me distinguir daqueles que, embora combatam o capitalismo com pseudodiscursos ideológicos amplamente distorcidos (a boa maioria deles nunca debruçaram sobre Marx, Engels e etc) desenvolveram uma práxis empresarial e política dentro de uma lógica torpe e criminosa.

Ao capitalismo mais selvagem pertencem aqueles que durante décadas vampirizaram, através de perversa trama público/privada, os bens públicos e remeteram os bilionários resultados via offshores.

No próximo dia 27, ocorrerá o julgamento de um desses elementos integrantes da pior parcela do capitalismo torpe nacional. Ele será julgado por uma quinquilharia de ter recebido um sítio como contrapartida por seus inestimáveis préstimos. As verdadeiras somas são explicitadas em diferentes fontes entre elas no filme em cartaz da Netflix: A Lavanderia.

A prova material já foi confiscada e leiloada pela União. Ele deverá ser naturalmente condenado pela indiscutível e insofismável culpabilidade. E poderá continuar livre, por força dos perversos e competentes tentáculos que bancam a parte podre do capitalismo.

Enquanto isto uma turba cega e fanática cantará hinos de louvor ao sátrapa.

Perdoem-me pela extensão do texto, mas se quiserem saber por que falo tanto de mim precisarão ler Montaigne.


Até breve.


sexta-feira, 8 de novembro de 2019

MANIFESTO




Face ao conjunto de ignominias, perversas ações de aviltamento contra os melhores ditames do devido processo legal, e fundados pela mais sacrossanta e ilibada conduta, os apenados hoje libertos pela lucidez e absoluta isenção de parte majoritária dos membros da suprema corte resolvem criar o SINDIPUS – Sindicato dos Apenados Injustamente.

Terão como presidente de honra um certo ex-presidente da repusblica que, por razões diversas, não consigo nem pronunciar e nem escrever o nome; como secretário geral, o herói revolucionário José Dirceu e integrando a comissão da frente por uma boa ética, celebres ex-executivos e/ou acionistas de organizações de indiscutível importância no mercado e políticos de longo percurso democrático.

A estrutura do sindicato será moldada pelas melhores práticas atualmente disponíveis, especialmente no que tange a qualidade da produção de conteúdos para a rede social, para garantir a solidez e a efetividade de seus propósitos.

Diversas estratégias serão empreendidas, sendo a principal delas, a elaboração de ação plúrima (contemplando todos os membros integrantes do SINDIPUS) a ser impetrada junto ao STF para ressarcimento pecuniário pelo Estado através de indenização pelo tempo em que os requerentes padeceram de injustas e abomináveis condenações e prisões em cárceres sob condições indescritíveis.

Conclama-se a todas às pessoas solidárias à causa para irem às ruas brandindo flâmulas de todas as cores preferencialmente com os dizeres: “RESSARCIMENTO JÁ”, “NOSSA LIBERDADE TEM PREÇO”, “BASTA DE INJUSTIÇA” e, aqueles que quiserem podem usar outras ideias correlatas.

Faz-se importante também o ferrenho, incansável e deliberado ativismo junto a redes sociais, grupos de WhatsApp, preferencialmente os familiares,  para manter a população atenta e vigilante contra as arbitrariedades perpetradas pela parte podre da justiça nacional.

Tal ativismo é medida indispensável para vir a barrar qualquer possibilidade de parte do congresso nacional querer legislar Projeto de Emenda Constitucional que venha derrubar a grande conquista dos membros do SINDIPUS ocorrida no final da tarde de ontem.

O SINDIPUS convencido do êxito de seus mais elevados propósitos e, convicto da vitória no plenário do Supremo, uma vez tendo recebido em moeda corrente os efeitos da ação de ressarcimento colocarão todos esses recursos em projetos do maior alcance social.

Pede-se apenas ao pessoal da logística que não monte o palanque da vitória antes do veredicto da suprema corte. Tipo da eficiência desnecessária e que pode suscitar perversas ilações de oportunistas de plantão.

Eventuais ações, todas elas de caráter persecutório contra os membros do SINDIPUS, serão naturalmente combatidas com recursos protelatórios ad eternum, garantindo a figura soberana da presunção absoluta de inocência.

Assim, o SINDIPUS continuará exercendo seus mais nobres direitos de atuar em benefício de seus mais relevantes e inquestionáveis propósitos.

O Brasil retribuirá com altivez e grandeza.

AVANTE SINDIPUS!!!


Até breve.