“A vida sem imaginação seria uma agonia.”
Anne
De
novo por pressão especial externa, assisti a todos os capítulos das duas
temporadas da série da Netflix, ANNE with “E”. O lançamento da
terceira temporada está previsto para o próximo mês.
Baseada
no livro “Anne of Green Gables” (L.M. Montgomery), de 1908, a série levanta
vários temas e tabus da época - feminismo, adoção, bullying, preconceito e o
conceito de “família” são alguns dos assuntos que nos conectam ao mundo de Anne
de forma muito leve e cativante.
Anne
retrata o amadurecimento de uma garota que enfrenta adversidades e desafios
para encontrar seu lugar no mundo e ser amada. Ambientada na ilha de Príncipe
Eduardo no final do século XIX, a série acompanha a vida de Anne Shirley, uma jovem
órfã que, após uma infância de abusos entre orfanatos e casas de estranhos, é
enviada para viver com um casal de irmãos em idade avançada que, na verdade,
queria um garoto para ajudar nas atividades da fazenda. Sem coragem de desfazer
a troca, os dois acabam recebendo uma garota cheia de imaginação e
completamente desajustada para a sociedade do final do século XIX. Com o passar
do tempo, a pequena garota de treze anos transforma a vida de seus “pais” e de
toda a cidade com seu jeito extrovertido, sua inteligência e imaginação
brilhante.
Matéria
publicada no Estadão de hoje, da qual tomo a liberdade de retirar alguns
fragmentos:
“A
cultura está, hoje, sob grande ameaça. Cada vez mais, ela é desprezada,
perseguida e, mais ainda, satanizada. Este horror à cultura se torna ainda mais
radical no caso da poesia. Ela não é, de fato, uma profissão produtiva –
não está, por exemplo, no campo dos espetáculos. Na verdade, não é, sequer, uma
profissão. Em um tempo no qual se privilegiam a velocidade, os objetivos claros
e os resultados, a poesia – a mais estranha e singular atividade humana – se
torna suspeita. Mais do que suspeita: perigosa.
Neste
tempo que não aceita a lentidão, a indefinição e o efêmero, não só a poesia,
mas também os poetas vivem sob grande risco. Eles ameaçam os princípios
dominantes da produção rápida e dos resultados a todo custo. Eles se tornam, em
resumo, um perigo que abala a chamada “nova ordem” que hoje se estabelece no
poder. Por isso, talvez nunca tenha sido tão importante refletir a respeito da
utilidade da poesia.
A
poesia é insubmissa e por isso ameaça tanto.
A
poesia resiste e insiste. Quanto mais a destratam e a amaldiçoam, mais ela se
fortalece. De onde viria essa incrível resistência? De onde a poesia, em tempos
tão inóspitos e mesmo tão antipoéticos, retira tanta força? Apesar da aparente
inutilidade, deve haver alguma relação profunda entre a “realidade poética” e a
“outra realidade” – isto é, a realidade comum. Algum papel crucial ela
representa, ou já teria sido varrida do caminho, enxotada, proibida. Alguma
força ameaçadora ela detém, ou já teria sido vencida pelo pragmatismo e pelo
utilitarismo.
Para
ver através da poesia é preciso, primeiro, abandonar nossos conhecimentos
passados e já organizados. Que nos dispamos de nossos preconceitos, de nossos
vícios intelectuais, de nossas certezas, pois o poema nos obriga a começar tudo
de novo, a retomar o ponto zero. Diante do olhar dos poetas, todos os objetos
são novos, o mundo está sempre a renascer.
Só
o olhar poético é capaz de apreender a novidade que se esconde detrás dos
objetos conhecidos. Uma onda predatória – do conhecimento, da sensibilidade, do
fazer – agita, porém, o mundo de hoje, que parece a cada dia mais guiado pela
ideia de destruição. Ao abrir novas maneiras de ver, a poesia descerra caminhos
alternativos, alarga o horizonte e ajuda a nos salvar da barbárie.
Platão dizia que a poesia é inútil, porque o poeta não produz nada. O poeta,
para o filósofo, seria um peso morto. Esta ideia se perpetuou e, nos últimos
tempos, se agravou. A globalização e o ultraliberalismo nos lançaram no domínio
do efêmero. Não temos escolha, parece. Ao descerrar novos olhares e novas
posições, a poesia nos abre, ainda assim, a possibilidade de outros destinos.
Embora infelizmente a maioria de nós continue a acreditar que a poesia não
serve para nada, nunca dela precisamos tanto”.
Ontem escrevi sobre sabiar, verbo meu que construí a
partir do pássaro (sabiá) que em tupi quer dizer “aquele que reza muito” e com
a intenção de passar a ideia de ação para o encontro de uma sabedoria.
Cada dia em que passo, adoro mais minha velhice.
Até breve.