“... o presidente de um país
imaginário, mas não muito, declara que na sua administração só participará, se
não for filho, quem se ajustar à linha dominante do governo. Qual é essa linha,
presidente? E eu sei? Falem com o Paulo Guedes que tem todas as linhas do
governo no bolso e se recusa a mostrá-las até a mim. Presidente, nós
acreditamos que a terra é plana ou redonda? Depende. Que dia é hoje?
Presidente, o que significa essa anedota que ninguém ainda entendeu? Vocês
querem que Eu entenda?!”
Luiz Fernando Veríssimo em sua crônica de hoje (Anedotas) no
Estadão.
Pois é, prefiro que isto sugira mais uma tragicomédia do que
propriamente uma piada que nos faça rir, por força de nossa idiotia a cada dia
mais aguda.
Estive, na última sexta-feira, em um encontro nacional no qual
participaram representantes da alta cúpula do empresariado brasileiro. No palco
secretários de governo, ministros, empresários, senador, governador, presidentes
de entidades de classe e o presidente do Supremo Tribunal Federal.
Sentei em cadeira colocada na fila do gargarejo. O evento
transcorreu de dez e pouco da manhã até perto das dezenove horas com cada
palestrante tendo vinte minutos para a sua exposição.
Saí de lá melhor do que entrei. Ou seja, mais informado e,
portanto, mais preocupado com nossa pátria amada.
Os diagnósticos apresentados pelos integrantes do governo (todos
da área econômica) do quadro são translúcidos, contundentes e pragmáticos. Até
eu os entendi e, por isto, saí do evento mais tenso.
Os planos, embora apresentados apenas em tópicos e não em
detalhes, são também igualmente bem construídos e de uma obviedade acachapante.
Resumo: o que não nos faltam são diagnósticos e planos. Nosso
drama histórico reside na execução por força de que isto só se dá, constitucionalmente,
pela via política.
Não vou entrar nesta seara. A puslítica me dá náuseas e já
derramei aqui minha mais explícita bílis.
Duas empresas que se fizeram representar no palco me proporcionaram
certo alento. Uma ferida de morte pela operação Lava a Jato, e outra por falhas
graves em suas operações que resultaram em tragédias de alcance internacional.
Gostei de ver, e até cumprimentei efusivamente o presidente da
empresa lavada, pelo extraordinário trabalho de reviravolta da governança
ressuscitando-a e recolocando-a em condições de operar em todas as dimensões de
seu magnifico portfólio de negócios.
Quanto à outra empresa, historicamente conhecida por sua postura
grosseira e imperativa junto aos seus stakeholders
fez, de forma genuína e crível, uma profunda e comovente lição de humildade. Às
vezes, pessoas e organizações, só mudam após um desastre.
O último expositor foi o presidente do STF. Ele apresentou o nascedouro dos três poderes e
deu ênfase ao escopo de papéis reservados ao judiciário, em especial à Suprema
Corte.
De forma clara e inteligível ele conclamou a sociedade a se
perguntar até quando ela se mostrará incapaz de equacionar, dirimir e resolver
suas inúmeras pendengas que desaguam aos milhares às portas da última instância
do poder.
Apresentou números e teceu considerações gerais sobre a dinâmica
dos processos que foram suficientes para dar a dimensão da gravidade do nível
de maturidade dos contratantes sociais. Só nas pendências fiscais há, em
processo de sentença, o montante de um trilhão de reais.
A cultura recorrente de nossas pendengas ao poder moderador
resulta em prejuízos imensos à credibilidade e a reputação do mercado
brasileiro dentro da cena internacional e, eu já ouvi isto antes, determina muitas
vezes o afastamento de investidores.
Pois é, minha tensão aumentou agora ao concluir este post. Se não
estou muito equivocado o que está aí foi escolhido por nós. Antes de apontarmos
o dedo acusatório de nossas mazelas para quem quer seja, deveríamos é estar
pensando o que temos feito para que nosso riso deixe o campo patológico e
derive de uma alegria recompensadora.
Deve ter alguma razão para que o cotovelo só abra em nossa
direção. Ou será necessário um desastre mais evidente do que aquele que está
posto para que afinal este país se emende?
Até breve.
No diálogo de surdos de nossa política não se sobrevive sem um chavão.
ResponderExcluirPena que realidade seja uma palavra sem nenhum Ibope.
Acho que, nos últimos tempos Agulhô, temos vivido apenas de "espera herança".
ResponderExcluirAgulhô, "somos o país do futuro? Ou temos um passado enorme pela frente?"
ResponderExcluirSerginho
Profeta Agulhô, quase um ano depois leio o seu post bem no meio do "desastre mais evidente"... Como dizia minha avó, "bocão"...
ResponderExcluirPois é, Mano. O quadro fica cada vez mais complexo e dificil. Temia por sérias dificuldades, mas jamais poderia supor que elas fossem amplificadas por uma pandemia. Não vejo lideranças surgindo que possam enfrentar os desafios que se avizinham o que agrava ainda mais a nossa sorte. Brigado por ter passado também por aqui. Bração, querido.
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