Teve
uma vez que eu fui. Acho que foi uma única. Não teve outra. Se bem que,
lembrando melhor, foram mais de uma sim. Duas ou três, talvez. Na verdade,
mesmo que tivessem ocorrido mais de tantas vezes, foi como se tivesse sido
única.
Estou
certo que sempre chovia, uma chuva fina e constante, daquelas que encharcam a
terra sem destruir plantações. Isso contribuía, e muito, para o contexto. Havia
certa tristeza no ar, a cor cinza assim cabia emoldurando a cena.
Outra
circunstância presente é de que sempre aconteceu à noite. Depois das vinte e
duas e quarenta, nunca antes. O mais interessante é que ninguém, nem eu mesmo,
combinávamos o horário e sabem-se lá cargas d’água porque, sempre aconteceu
depois daquele horário, nunca antes.
Eu
nunca cheguei primeiro, por isto acho sempre que foi uma única vez. Porque
também, os outros que chegavam depois de mim, sempre entravam na mesma ordem.
Todos os quinze, primeiro o Herasmo e, por último, Antenor.
Duas
mulheres participavam também. Uma senhora de uns oitenta e poucos anos e outra,
jovem, de uns trinta e poucos. Zenaide e Karla. Ambas descendentes de
estrangeiros. Não soube distinguir a origem. Mas cada uma a sua maneira tinha
traços diferentes dos nossos.
A
coisa durava exatos 185 minutos, nunca mais e nunca menos. Fosse o que
acontecesse durante, era batata. Do início até terminar podia ver no relógio
digital com frações de segundos. Na pinta.
Nunca
soube por que.
Ao
terminar todos saiam sem se despedir e nenhum acompanhado. Todos sozinhos, alguns
de cabeça baixa. Na rua, idem. Ninguém se comunicava. E sempre os destinos de
cada um pareciam o mesmo. Alguns seguiam a rua defronte, outros desciam a
ladeira e outros, subiam em direção à praça.
Uma
das mulheres, a mais jovem, subia a ladeira. A mais velha seguia a rua
defronte. Melhor, pois era uma rua plana, de calçadas largas e bem iluminada. A
única pessoa do grupo que encontrava já no meio do quarteirão um homem grisalho
que vinha busca-la. Suponho ser seu filho, ou um irmão mais novo.
Eu
descia a ladeira, pegava a primeira rua à esquerda, andava uns seiscentos e
trinta metros e depois virava à direita, na Rua Ramos Delgado, onde ficava o
Bar do Quincas, aberto até as duas da madrugada.
Quincas
era um filhote de português adestrado pela senhora sua esposa, homem bom,
bigodes espessos e sempre com seu mesmo chinelo de dedos com as tiras emendadas
com arames finos. Uma tristeza.
-
Fala aí, Quincas!
-
O de sempre, gajo?
-
Serve que é o mesmo...
-
Tá vindo de onde?
Nunca
disse.
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