segunda-feira, 8 de maio de 2017

SEIS



Há exatos seis anos atrás publiquei o meu primeiro post aqui no dasletra. Entre as paixões que me acompanharam ao longo de toda a minha vida escrever foi e, enquanto estiver supostamente lúcido, será uma das mais intensas. 

Desde sempre escrevi e, por razões diversas, nunca publiquei. Acho porque nunca me levei muito à serio e, indisciplinado que sou, sempre achei também que não sustentaria a existência do blog. 

Mil e treze posts editados depois tenho esta atividade como uma necessidade visceral. Permito-me lavrar como uma catarse, tanto no tema a abordar quanto na forma.

De tudo o que escrevi o que considero de mais sério foram  as estórias que construi através de hipotéticos diálogos com a minha netinha que nasceria cinco meses depois de eu tê-las escrito. 

No dia 27 de fevereiro de 2012, dia do meu aniversário de 60 anos, recebi um convite com uma foto de um exame ultrassom. Minha filha me pediu que a acompanhasse no exame. E lá ficamos sabendo que era Liz, que estava por vir.

Minha vida é marcada à partir desta data. A chegada dos meus netos, Liz (01.08.2012), Valentin (07.03.2014), Antônio (06.12.2014) e Helena (30.04.2016).  Tudo o que um homem pode experimentar de realização e alegria.

Até o dia 31 de julho de 2012 (Liz nasceu no dia 01) escrevi inúmeros diálogos e me recordo com que prazer. 

Para memorar e agradecer à Vida por ter me gratificado com todas as vivências destes mais de mil posts escolhi aleatoriamente (será?) um destes diálogos que intitulei como NÓ.

- Vovô...

- Oi, Liz.

- Por quê que a gente morre?

- A gente morre, Liz?

- Sim. A Luciana, minha colega da escola, não foi à aula hoje. Aí eles falaram que foi porque a vovó dela tinha morrido.

- Você conhecia a vovó dela?

- Ela já foi muitas vezes na nossa festinha... Brincava comigo...

- Ela era muito legal então, Liz...

- Sim, muito legal.

- Sei.

- E então, vovô? Por que a gente morre?

- A vovó da Luciana estava doente?

- Não sei.

- A gente morre quando fica doente...

- Outro dia, você lembra vovô? Eu fiquei doente.

- Gripada, né?

- É. E por que eu não morri?

- Porque a gripe não é uma doença grave...

- Grave?

- É. Uma doença grave é quando ela deixa a gente tão fraquinho que aí a gente não agüenta...

- E morre? E aí?

- Aí o quê, Liz?

- O que acontece com a gente?

- A gente nunca mais vê a pessoa e...

- Ela vai prá onde?

- Ô Liz... Meu celular. Deixa eu atender...

- Pai...

- Oi, Pretinha.

- É a mamãe, vovô? Deixa eu falar com ela.

- Pode falar, toma...

- Oi, mamãe...

- Oi, querida! Tá tudo bem aí?

- Eu estou conversando com o vovô.

- Ele está te contando histórias?

- Não.

- Então vocês estão conversando sobre o quê?

- Sobre morte.

- Deixa eu falar com o vovô, minha filha.

- Beijo, mamãe.

- Pai, que história é essa?

- Ela que perguntou.

- Desconversa pai... Como você vai sair dessa?

- Espero que só daqui alguns anos. Eu quero viver muito ainda.

- Êh, pai, tô falando da pergunta da Liz.

- Eu sei lá!

- Pai, faz o seguinte: despiste ela, chama ela prá ver um filminho, leva ela lá prá baixo. Vê se faz ela esquecer desse assunto...

- A avó da coleguinha dela morreu.

- Qual coleguinha?

- A Luciana.

- Nossa, a dona Clara morreu? Que pena, meu Deus!

- Você a conhecia, minha filha?

- Sim, estive com ela na semana passada.

- Pois é.

- Vou ligar prá escola prá saber o que aconteceu.

- Faça isto minha filha.

- Puxa, que dó, né pai?

- É, minha filha.

- Beijo, pai. Tchau!

- Vamos ver um filminho, Liz?

- Agora não.

- Vamos dar uma volta?

- Onde?

- Lá embaixo.

- Quero agora não, vovô.

- Então o que você quer fazer?

- Continuar conversando.

- Então tá.

- Fala, vovô.

- Sabe que hoje eu fiz um exercício legal lá no pilates?

- Como foi?

- A gente fica pendurado em duas barras... Assim ó, sabe?

- É perigoso, vovô?

- Não, perigoso não é não.

- Se você cair você morre?

- Não... Posso só machucar um pouquinho.

- Quando a gente morre a gente vai prá onde, vovô?

- Liz, o vovô não sabe.

- Mamãe sabe?

- Não.

- O papai sabe, num sabe?

- Também não.

- As vovós? Vovó Tucha é professora, ela sabe. O vovô Cláudio...

- Acho que não.

- Quem sabe, então, vovô?


Hoje já não preciso escrever diálogos hipotéticos. 

Até breve.

Obs. Todos os diálogos estão no icone de assuntos com o título LIZ.

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