sábado, 6 de agosto de 2016

CLAMOR



Talvez não caiba paralelo. Talvez seja mesmo esdruxulo. Talvez desproporcional. Mas faço. A passagem de um poetinha regional e o evento esplendoroso da abertura das Olimpíadas.

Onde cabem? No singelo e no extraordinário.

Vander Lee foi um letrista menor, de passagem no universo de tantas massas. Tem, no entanto, uma importância porque em vinte anos de carreira, nove produções, tentou deixar sua voz.

Viver como um menino, morrer poeta.

A cerimônia foi assim, pequena e exuberante. Sem nenhum reparo, nenhum desdém, nenhuma crítica que possa refutá-la, antes pelo contrário. Penso que nenhuma outra manifestação artística possa traduzir de forma tão ampla a brasilidade.

Acho que nem para aqueles que a conceberam tinham tanto. Foram fazendo, crendo uma gambiarra, como é próprio da nossa desimportância. Mas não, sofisticadíssima aparelhagem tecnológica com enredo e cadência primorosa deram às três horas de espetáculo um vigor incomparável a outras cerimônias passadas.

Matamos a pau. Assim com nossas idiossincrasias, nossas mazelas, nossa preocupação de estar fazendo o que devíamos fazer. Os diretores, em entrevistas, confessaram a preocupação da partida, quando poderiam ser vaiados.

Como?

Todos, seguramente todos, ficamos pasmos com tamanho esplendor. A gente brasileira vazou por todos seus poros e ritmos no imenso palco do monumental estádio anfitrião.

Fomos divinos. Perdeu importância o momento presente e conclamamos o mundo a refletir fundo no futuro. O que está em jogo não são nossas crises paroquiais, há uma crise infinitamente mais grave para a qual deveríamos centrar nossa preocupação.

A Vida, toda Ela, está em risco.

Ontem confesso que passei o dia sobre fina emoção. A notícia pela manhã da perda de Vander Lee e ter assistido a cerimônia de abertura foi bravo. Por que Vander Lee?

Sabe o que eu queria agora, meu bem?
Sair, chegar lá fora e encontrar alguém
Que não me dissesse nada
Não me perguntasse nada também

Que me oferecesse um colo ou um ombro
Onde eu desaguasse todo desengano
Mas a vida anda louca
As pessoas andam tristes
Meus amigos são amigos de ninguém

Sabe o que eu mais quero agora, meu amor?
Morar no interior do meu interior
Pra entender porque se agridem
Se empurram pro abismo
Se debatem, se combatem sem saber

Meu amor
Deixa eu chorar até cansar
Me leve pra qualquer lugar
Aonde Deus possa me ouvir

Minha dor
Eu não consigo compreender
Eu quero algo pra beber
Me deixe aqui, pode sair
Adeus.




Até breve.

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