terça-feira, 14 de junho de 2016

DERRAÇÃO



Concluído este post terei tomado uma decisão extrema. Lançar-me-ei através da janela da sala do apartamento do edifício onde moro. Décimo-quarto andar. Acredito serem remotas as chances de eu sobreviver pós-queda.

Registro as minhas razões: a primeira, que considero determinante e as demais todas que reputo secundárias.

Depois de quase mil posts editados em meu blog, nos últimos cinco anos, não consegui atingir a milionésima marca da canção “Ai se eu te pego” do ex-célebre Michel Teló, e nem a milésima marca dos diferentes Safadões, nas estatísticas de acesso aos vários veículos de mídia.

Como se não me bastasse esta imensa frustração e as doses venenosas do vírus maligno da inveja, outras questões fizeram com que eu, de vez, desistisse de me manter entre os vivos.

Não encontro mais nenhuma razão para manifestar sobre Política.

Não encontro mais nenhuma razão para manifestar sobre Atentados.

Não encontro mais nenhuma razão para manifestar sobre discriminações.

Não encontro mais nenhuma razão para manifestar sobre Artes.

Não encontro mais nenhuma razão para manifestar sobre.

Não tenho mais nada a dizer sobre a minha infância, a minha família, os meus amores, os meus amigos.

Não tenho nenhuma ideia original que me remeta a conto, crônica ou romance.

Não tem ninguém que eu queira ainda conhecer e nenhum lugar que eu queira visitar. Nenhuma comida, doce ou bebida. Nenhuma roupa que eu queira vestir, ou sapato calçar.

Nenhuma música que eu queira ouvir. Nem quero mais rever Cinema Paradiso, Era uma vez na América, O Carteiro e o poeta.

Nenhuma pelada que eu queira jogar. Nenhuma trepada que eu queira dar. Nenhum gozo.

Nada que justifique alimentar isto que sou. Uma bisnaga de carne, vociferante.

Portanto, pedi ao zelador do prédio que aguarde por meia-hora a limpeza do pátio aos pés da janela de meu apartamento. Nunca suportei retrabalho. Comuniquei a todos os meus clientes que hoje não poderei atendê-los.

Escolhi a roupa mais surrada, vou de meias. Ou será voo?

Tomarei um copo d´água. Urinarei e escovarei os dentes, não necessariamente nesta ordem. Deixarei como estão os meus cabelos, minhas unhas tanto dos pés, quanto das mãos.

Deixarei portas abertas e a TV ligada, muda, sintonizada no canal do Senado Federal.

Mandarei uma mensagem para Ela, via WhatsApp: “Bem, hoje não almoçarei contigo.”

Lerei pela última vez o que está escrito em adesivo, que mantenho há anos, fixado em meu laptop:

“Se você tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades, teria ouvido as verdades que eu insisto em dizer brincando. Falei muitas vezes como um palhaço, mas nunca desacreditei na seriedade da plateia que sorria.” (Chaplin)

Descerei, lentamente, a tampa de meu laptop.

E o desligarei.



Até breve. (Entendam como quiserem)

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