segunda-feira, 18 de abril de 2016

DEMOCRACIA



Que me perdoe o Huguinho por eu não ter comparecido ao seu primeiro aniversário festejado no sábado. Inadmissível a falta, papai e mamãe ficam credores de atenção contra mim.

Que me perdoem Alice e Ana, que vieram à luz também no sábado. Papai e mamãe, da mesma forma, em dobro, ficam credores de atenção contra mim.

Que me perdoem Liz, Valentin e Antônio pela minha ausência.

É que, neste final de semana, desde quinta-feira, sexta-feira toda, passando por boa parte do sábado e praticamente todo o domingo eu me recolhi em Santa Luzia. Sozinho, focado nos acontecimentos em Brasília.

Valeu a pena acompanhar um dos maiores momentos da história do país. Dos debates e decisões na Suprema Corte até os debates e a decisão final na Câmara dos Deputados sobre o processo de admissibilidade das denúncias feitas contra a atual presidente.

Saio do retiro com uma imensa alegria. Vi nestes dias, com orgulho e satisfação, um espetáculo de democracia com exercício pleno de liberdade dos cidadãos e dos membros integrantes das instituições basilares da República.

Vi o Brasil comprometido consigo mesmo e explicitando sem reservas os seus interesses, desejos, expectativas, demandas, catarses, drenando seus espíritos, expurgando seus demônios, enfrentando seus inimigos, colidindo com seus adversários.

Pela TV em diferentes canais e nas redes sociais senti pulsando a cidadania e a alma brasileira em pleno gozo de algo que tantos outros povos ainda sonham: a liberdade de expressão e de escolha.

O “muro de contenção” construído na esplanada dos ministérios, medida tomada pelos órgãos de segurança dados os riscos de conflitos, acabou sendo palco de troca de flores, telefones sem fio, mural de manifestações, peça rota.

Em 24 capitais de estados da federação e em centenas de cidades as pessoas foram para as ruas gritarem palavras de ordem, cantarem músicas, hinos, ostentarem faixas, flâmulas, bonecos estilizados, máscaras numa festa nada carnavalesca. A alegria estava carregada de sentido e responsabilidade. Havia uma razão muito forte para estar ali.

Emocionante!

Na Suprema Corte uma extraordinária demonstração de maturidade institucional no julgamento dos recursos impetrados pela parte denunciada, competência técnica, respeito aos poderes, rigor nos trâmites, gestão do sentido de urgência.

Na Câmara dos Deputados quase cem horas de trabalho praticamente ininterruptas envolvendo, ao final do processo, todos os representantes escolhidos pelo povo, apenas dois (por motivos justificáveis) não puderam comparecer.

A Câmara dos Deputados escancarou o país, quase ao escândalo. Escândalo de liberdade e democracia. O Brasil se mostrou a nu. Tal como somos, escrachados, irônicos, caleidoscópico de todos os matizes.

Espetáculo para ser visto pelo mundo todo e comentado por correspondentes de várias agências internacionais de notícia. O mundo não é capaz de compreender na extensão o que se passa.

Nós somos ímpares.

Dez milhões de desempregados, quase dez por cento de perda do PIB nacional em dois anos, milhares de fábricas e pontos de comércio fechados, a maior crise econômico-financeira desde 1930, desigualdades sociais e culturais agudas, diferenças de credo, raça, opções sexuais, e nenhum ato de violência social.

Um espetáculo de cidadania.

Os discursos inflamados dos contendores no parlamento não ecoaram nas ruas traduzidos em vandalismos, agressões, danos à integridade física ou ao patrimônio. Um ou outro registro de pequenos empurra-empurra.  

A tarde deste domingo será inesquecível.

Uma sessão memorável do parlamento pela magistral condução do presidente da Casa, irretocável participação dos membros com belíssima demonstração de brasilidade.

A firmeza, inteligência, perspicácia e equilíbrio do presidente garantiram a evolução e conclusão dos trabalhos sem grandes tumultos o que poderia ocorrer face à gravidade do tema em questão.

A Câmara dos Deputados não é uma academia de notáveis, luminares, e nem de cientistas políticos, muito menos de polidos e respeitáveis intelectuais: a Câmara é a Casa do Povo e como tal se mostra por inteiro.

Nada mais explícito da nossa brasilidade que as manifestações quando dos votos: como somos diversos, plurais, imensos. A ordem escolhida e o processo de registro e apuração foi um primor.

Fiquei fascinado pela fisionomia, pelo sotaque, pelas peripécias e salamaleques no representante de cada estado e redescobri neles quão diversa e múltipla é a nossa gente.

Desnecessário lembrar que estamos falando de Homens, portanto de todos e de todos os caráteres. Nossas mazelas, nossas idiossincrasias, nossa ingenuidade, nossa pequenez intelectual, nossas paixões e ideologias, nossos quereres, nossas inconfessáveis faltas estavam ali representadas por mais de cinco centenas de pessoas.

Ouvi minhas falas em diferentes bocas, inclusive nas ofensas que gostaria de fazer a determinadas pessoas, especialmente ao presidente da Câmara: gangster, facínora, canalha, bandido, ladrão. Se eu o fizesse, jamais precederia meus palavrões com Vossa Excelência ou Presidente ou Sua Excelência.

Ocorre que a democracia sustenta-se em bases legais. E o pior: nem sempre o que imoral é ilegítimo. O Presidente da Câmara até que seja julgado, ocupa a Presidência da Casa e, por isto, ela deve ser respeitada. Ele mesmo, disse quando incitado a responder por que se manteve impassível diante dos insultos: “Quem está ali é o Presidente da Casa, não a minha pessoa”. Demonstração desta conduta é que ele se levantou e foi a outro microfone para declinar o seu voto.

Sou obrigado a reconhecer que se fosse outro, não tão bem preparado para a tarefa, provavelmente não teríamos o desfecho pacífico da sessão.

Poderia escrever mais, mas cansa quem lê. O que me parece importante é que as redes sociais já estampam as nossas opiniões e espelham novamente nossa brasilidade. A vida segue.

Saio deste final de semana com o meu coração embalado: “Sou brasileiro com muito orgulho e muito amor”.

A continuar assim vamos encontrar o nosso melhor caminho.



Até breve.

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