segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

DAVIDLIRA



Claro que a notícia mais importante do dia é a morte de David Bowie, que havia completado 69 anos no último dia 08. Lazarus, single de seu álbum também lançado na sexta, no apagar das luzes da ribalta, diz quanto que este cara foi emblemático.

Mas eu quero ficar com Wendell Lira, o jogador que ganhou pelo gol mais bonito feito pelo mundo todo ao longo do ano de 2015.

Na minha infância fiz uns quatro tal como Lira. Talvez até mais, com a agravante de eu estar descalço e muitas vezes sobre pedras pontiagudas de calçamento com pedras pé-de-moleque, terras batidas com nacos de grama misturada com ervas daninhas de lotes vagos, com as balizas marcadas por torrões, chinelos de dedo ou pedaços de árvore.

O gol de Lira foi como os inúmeros gols de minha infância.

E é por isto que eu fico com a notícia de que este brasileiro de 27 anos foi lá, levando sua linda e humilde esposa, à frente de três monstros do futebol atual buscar seu prêmio.

Prá mim o gol foi obra do capeta, aquele que ronda terrenos baldios. A plasticidade, a acrobacia, o tempo de bola, a batida tipo pica-aqui-prá-tirar-o-goleiro num teve comparamentos nem com o de Messi, um gol para placas, não para Olimpos.

Lira me trouxe de novo meus tempos mais queridos. Minha pobreza profunda e solitária e toda a minha paixão por qualquer coisa que lembrasse uma bola. Esse gol e o reconhecimento de sua singularidade me encheram de alegria.

Ainda há espaço no mundo do espetáculo para a distinção e Lira, no gol, foi distinto porque fez o que todo moleque de pé de morro, quadra desassistida pelo Estado, beira de córrego, enfim qualquer picada-mais-ou-menos-plana que rola um caroço com desenvoltura e futebol da melhor qualidade nas veias expostas.

Não estes pobres-de-uns coitados levados às escolinhas de futebol que desde pequeninos são violentados por regras impostas por medíocres que nunca romperam a cabeça do dedão, nunca tiveram os pés de moleques expostos a todos os tipos de farpas, vidros e que tais.

Precisava tanto que voltasse esse tempo, sô!!!

A gente fazia as coisas quase sempre por diversão e arte, embora a bóia fosse pouca e quase rara. Mas era bom de doer. Parecia que o mundo todo parava enquanto a gente corria atrás daquela esfera mágica e a levava decidida e deliberadamente aos três paus e ali experimentava uma sensação que mais tarde vim reviver em orgasmos.

Lilás, tenho aqui nos meus músculos e neurônios gols orgásticos. Um deles foi assim: eu vinha correndo pela direita e pisei em uma pedrinha que mudou minha direção e, nisso, tirei um adversário do lance; peguei a coisa na frente e fui levando até que dois outros entraram de primeira e juntos tomaram uma caneta desconcertante e humilhante (depois da pelada, tomei uns cascudos por isso, porque os caras eram maiores do que eu e meu irmão mais velho e o mais troglodita da turma não estava); quando o goleiro saiu tentando me agarrar dei um toquinho de leve na coisa e, antes dela entrar, ali na linha imaginária do gol sentei encima da coisa e simulei um peido deixando a menina lá dentro.

Gols assim foram aos montes.

Lira me devolveu a alegria daqueles tempos onde eu ainda sonhava. Bowie talvez tenha deixado no single uma esperança.

Hoje valeu.



Até breve.

Um comentário:

  1. Para vc curtir um pouco da história do David Bowie.
    http://www.portalcafebrasil.com.br/podcasts/491-o-homem-das-estrelas/

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