quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

IMPEDIMENTOS



Há uma estória – ou será História? – que se passa nos idos da ditadura.

A junta militar responsável pela eleição do próximo Presidente da República encaminhava o processo eletivo do general que deveria ocupar a posição.

Em reunião fechada, com a presença dos militares elegíveis, ocorreu a varredura de vários quesitos que deveriam servir à avaliação daquele a ser ungido. Próximo ao final das longas sessões de trabalho, o coordenador da banca examinadora teria dito:

- O candidato tem que ser honesto!

Depois de alguns longos segundos de um silêncio sepulcral alguém se manifesta:

- Serve Ernesto?

Teria sido assim a escolha do nosso lendário e saudoso General Ernesto Geisel.

Ontem abrimos, pela segunda vez depois daquele período de trevas, um processo de impedimento de um Presidente da República, agora ungido pelo voto direto.

A presidente foi à TV dizer que tal solicitação é descabida e o pedido inconsistente. Afirmou que não tem conta no exterior, nunca desviou dinheiro público e negou outros pontos com o propósito de dizer: eu sou honesta, portanto, devo continuar no cargo.

A fala é dirigida nitidamente àquele que, institucionalmente, tem o poder para acatar ou não o pedido emanado da sociedade de acordo com aquilo que prescreve a Constituição Federal.

Tudo que ela procurou negar, para dizer-se honesta, foi com o intuito de dizer que o seu algoz não o é, visando descaracterizar o pedido.

Entre os mais de trinta pedidos, nunca antes na história da república foram encaminhados tantos, o Presidente da Câmara dos Deputados optou por aquele que, em tese, encontra os elementos mais substanciosos para justificar a abertura do processo.

Os doutores Miguel Reale Junior e Hélio Bicudo foram os redatores principais da petição que, seguramente, vai ao encontro do anseio de milhões de brasileiros.

A essência dos argumentos que iluminou aos iminentes e mais do que testados juristas não tem cunho moral. O que se coloca em questão ali não é se a presidente é ou não honesta. A questão é se ela cometeu crime ou não e, portanto, deve ser impedida de permanecer no cargo.

O parecer unânime e inédito do TCU reprovando a prestação de contas apresentados pelo governo deveria ser suficiente para atestar que a principal mandatária cometeu sim crime de responsabilidade, na medida em que usou de estratagemas ilícitos (pedaladas) para fechar as contas da União. Fez isto ao longo do primeiro mandato e continuou a fazê-lo em 2015.

Ontem o governo obteve uma vitória em seu pleito de que fosse acatada a Meta Fiscal para o exercício de 2015. A maioria dos parlamentares em uma demonstração de inteligência política e visão de consequência aprovou a medida.

Trata-se, no entanto, de uma vitória trágica. Ela vem confirmar de maneira quase inquestionável que, diferente do que afirmava a presidente no período pré-eleitoral e ainda no início de seu segundo mandato, o Brasil fechará o exercício com um rombo de mais de R$100bi em suas contas.

Não fosse o processo que culminou na aceitação do pedido de impedimento, eu quero crer, que o Crime de Responsabilidade Fiscal continuaria a ser praticado pelo atual governo.

Sou a favor do afastamento da Presidente da República não porque ela seja desonesta e/ou incompetente, sou porque há uma lei que estabelece ser crime aquilo que ela praticou independentemente das razões que possam vir a justificar os atos como quer o ex-presidente Lula, quando argumentou em público que ela o fez não para subtrair para si, mas para honrar os compromissos sociais, entre eles o Bolsa Família.

Os fins justificam os meios não é e nunca será uma boa prática de um bom governo. Especialmente meios apontados em lei estabelecidos como crime.

O pedido de impedimento da presidente não foi endereçado à pessoa cuja conduta está sub judice na Comissão de Ética do Parlamento. Foi endereçado a quem de direito, ao Presidente da Câmara dos Deputados em exercício, que aceitou o clamor de milhões de brasileiros que anseiam pelo império da Lei.

Ele, a pessoa que ocupa o cargo, esperamos todos, também se haverá às barbas da Justiça. E que não seja tarde.

Lamentando saber que não há na cena política uma expressão de liderança que possa nos colocar, gigantes pela própria natureza, no lugar que merecemos ainda assim sou a favor e espero que a presidente deixe o cargo, ocorra o mandato-tampão desse vice e se abra uma perspectiva para que, voltando às urnas, nós possamos escolher com maior cuidado aquele que nos governará.

Que seja honesto é ponto pacífico. Somado ao caráter nos brinde com competência política para aglutinar as diferentes correntes de interesses democráticos e legítimos da sociedade e competência administrativa para desenhar e executar um plano de restauração nacional.

E que não seja, pelo amor de meus netos, uma nova e trágica quimera.



Até breve.

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