Sempre tive o privilégio de cultuar
um defeito grave. Sou obsessivo compulsivo com intensidade desmedida no limite
do insustentável. Foco no meu propósito e abandono tudo o que não diz respeito
àquilo ao qual me proponho.
Depois, atingido ou não, largo prá
lá e sigo a vida. Obsessivamente.
Há muito olhando para detalhes de
nossa casa em Santa Luzia vinha me dando conta de um abandono. O piso de
madeira de demolição com excesso de cera e com farpas perigosas para meus
netinhos. Paredes que já haviam perdido a cor, inúmeros pequenos e
extraordinários detalhes da nossa morada ocasional que, espero, em futuro breve
tornar-se-á nosso lugar para o cotidiano.
Despiroquei e coloquei minhas
roupas mais rasgadas a serviço de uma reforma geral à base de cotonetes e
relojoeiro, buscando restaurar pequenos detalhes que marcam a minha identidade
naquele lugar.
Minha casa sou eu. É verdade que
98,785% da cor, do projeto arquitetônico, dos jardins, de tudo o que é belo e
diferenciado tem autoria e não é minha. Todo mundo sabe ali quem manda.
Minha casa sou eu em 100% dos
1,215% que me conferem. Assim fica melhor.
Vem daí a obsessão. Estou há dias por
conta de reparar aquilo que ali não estava bem. Tão focado que nem ouço o
barulho do chiado no ouvido esquerdo. Meu olhar se volta exclusivamente para a
minha morada.
Só que não e se assemelha.
Minha obsessão me adoece também pelo
que se passa nas entranhas de nossa cultura política. Estou adoecido de tão
interessado nos acontecimentos recentes que marcam o tempo presente.
Meu coração e cérebro vivem loopings frequentes ao olhar e analisar
sob minhas profundas restrições o que se passa. Ouço a tudo e a todos, procuro
as fontes, tento desvestir paixões, abrir-me ao equilíbrio, estar com a isenção
e a calma necessária para compreender.
Pretinha me mandou uma mensagem
dizendo que achou que ontem eu não estava bem. Eu a respondo aqui: nunca estive
tão bem como agora ao viver meus quase sessenta e quatro anos.
É verdade que meu corpo, dá sinais
de destremelequecessenciamentos, mas eu nunca fui de carne, meu negócio são as
nuvens, entonces bora lá para meus devaneios tortos.
Emocionei-me ontem ao assistir
parte do julgamento do STF. Ilusão, obsessiva ou não, senti um profundo orgulho
daquelas pessoas que nos brindaram com um debate memorável.
A fala altiva do Relator do
Processo ao dizer-se vencido - mas não convencido - e ceder a redação do
Acordão para o colega que, tendo sido o primeiro a divergir de seu voto, levou
boa parte dos demais juízes à decisão final foi algo de um elevado senso de
justiça, humildade e competência ímpares.
A decisão foi, para mim, suprema.
Concordando ou não com as ponderações havidas pelos juízes e na minha mais
ínfima compreensão de todo o arcabouço jurídico em que se deram os debates saí
dele preocupado com o recesso.
Um amigo, no Facebook, postou a
tese de que a situação se assemelha a todo o Corpo de Bombeiros tirar férias
quando ocorre um incêndio de proporções gigantescas.
Não era hora de todos os atores
envolvidos vestirem suas roupas mais rasgadas e investirem compulsivamente
na reforma do piso?
Até breve.
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