sexta-feira, 13 de novembro de 2015

BARATO



O quadro apresenta-se estável com sérias dificuldades para dormir à noite. Por força da intubação, quando da cirurgia, a garganta insiste em apresentar uma forte dor ao eu engolir a saliva. Persiste ainda aquela tosse idiota que não limpa a traqueia e, por ansiedade, fico com um ronron intermitente tentando me livrar da secreção.

Convalescendo, aproveito para feicebocar.

Que universo surrealista esse a que estamos expostos! O virtualismo, a sensação de liberdade de manifestação, a intenção de contribuir, de escrachar, de denunciar, de se fazer ouvir, de drenar espírito, de se relacionar, de encontrar eco, faz de nossa época algo ímpar.

Impossível uma análise conclusiva e global de tudo o que circula. Cada rede de “amigos” constrói uma lógica de interesses curtidos, comentados, compartilhados. O virtual é infinitamente maior e mais intenso do que a vida social.

Aliás, penso que estamos mesmo entrando em uma vida social de ausentes físicos. Na juventude eu investi horas a fio tramando com amigos, poucos, por bancos de praça, corredores acadêmicos, saraus, oficinas literárias, e era tão intenso. Eu amava a possibilidade de me encontrar com os amigos para destilar procuras.

Tenho me imiscuído em inúmeras conversas com pessoas que não vejo o brilho dos olhos e, a partir do que postamos, vamos construindo uma teia de articulações mais reais do que a própria vidinha levada no cotidiano. A vida virtual é uma droga alucinante.

Há nela, contudo, algo que incomoda: o efêmero. Os acontecimentos são objeto de inúmeras manifestações, aos milhares, mas não permanecem e, por isso, se esvaem numa furiosa velocidade.

Velozes e furiosos esses feicebocantes, drogaditos. Cada post implica um barato, que por sua vez demanda outro e ainda outro. Miscelânea de estímulos que levam à dependência contumaz.

Vamos ter salas para desintoxicação? Acho que não. Interagir não é uma droga ilícita e seus desdobrares ainda não são de largo conhecidos. É muito recente a ingestão da química.

Liberdade que nos aprisiona, possibilidade que nos restringe, tempo que nos esgota. Nossos “amigos” jamais saberão verdadeiramente de nós, quem somos, que cheiro temos, nossa estatura, nosso jeito de andar, nossa voz, nós mesmos.

Vou postar este texto. Um mísero grão de pó alucinante encarreirado em tela.

Funguem.



Até breve.

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