quarta-feira, 30 de setembro de 2015

SOCO



Um dos manifestos, a que eu fui exposto, mais contundentes do mundo pós-moderno.

Ai de nós se fossemos livres, felizes e orgásticos.

Belíssima coragem. O prazer como propósito será sempre revolucionário e perigoso.






Quando fossemos colocar senhas para programação adulta de nossas TVs deveríamos escolher os noticiários, especialmente nas matérias que abordam a pornografia porca e explícita que grassa de acordos vis em bacanais políticos.

Nossas retinas estão fatigadas de tantos atos desavergonhosos, nauseantes, doentios, de uma tara sem limites.





Até breve.



terça-feira, 29 de setembro de 2015

TECIDO



“Ninguém põe um pedaço de pano novo em um vestido velho, porque semelhante remendo rompe o vestido, e faz-lhe maior o rasgão.”
Mateus - XI – 16

Em um dos meus livros que escrevi na juventude, impublicáveis inclusive post mortem, abro com: “Tratarei nesta obra dos esforços lentos e contínuos que, pouco a pouco, dobram a cabeça dos povos sob a canga e lhes fazem perder a vontade e até a força de sacudi-la”.

Coloquei INFECTUM como título do livro, inspirado no Latim. Há duas subdivisões dos tempos verbais latinos: o infectum e o perfectum. No primeiro grupo se incluem os verbos cuja ação é vista como não-concluída. No segundo grupo se acham os tempos verbais de ação concluída ou perfeita.

Pois é.

Resgatei a memória por força de ter assistido ontem ao Roda Viva da TV Cultura cujos entrevistados foram o jurista Hélio Pereira Bicudo e a advogada e professora universitária Janaina  Conceição Paschoal.

Juntos ao jurista Miguel Reale Junior impetraram no último dia 01 – exatos 23 anos da data da saída de Collor - pedido de impeachment da Presidente Dilma. (PEDIDO)

Fiquei atento à Janaina, pela sua forma apaixonada de lidar com a questão sem perda de sua extraordinária competência em expor os fundamentos que sustentam o documento encaminhado ao Presidente da Câmara Federal.

Fiquei emocionado com Bicudo, que aos 93 anos de idade, ainda encontra reserva de energias para, mais do que se posicionar com seu brilhantismo intelectual e técnico-jurídico, agir deliberadamente em busca de seu sonho (que o levou ingressar no PT) acreditando estar ali a possibilidade da reconstrução do país.

Bicudo e Janaina, no mínimo merecem nosso respeito, nossa admiração, nossa atenção e nosso incondicional apoio em busca do esclarecimento dos fatos à luz da mais pura e cristalina legalidade e justiça.

Em sua argumentação Janaina esclareceu que o crime cometido pela Presidência da República foi de estelionato eleitoral, não porque tivesse proposto na campanha algo que não cumpriu em seu mandato. Mas por força de atos administrativos ilegais enquadrados na Lei de Responsabilidade Fiscal, as pedaladas. Janaina ainda fez considerações sobre a negligência da Presidenta então como responsável pela gestão da Petrobras.

Ocorre, porém, que em dado momento próximo ao encerramento do programa, parte dos entrevistadores aponta tanto a Bicudo quanto à Janaina a fragilidade de sua ação. Como o Presidente da Câmara, envolvido com a Operação Lava a Jato, poderia acatar o pedido de impeachment? O julgamento não deverá ser técnico, mas político.

Em outras palavras, tudo ocorrerá entre eles.

Janaina conclama para que tudo seja acompanhado pelo povo, mas sabe que somente se houver manifestação efetiva popular haverá chance de êxito para que o julgamento da improbidade administrativa da Presidente da República seja feito dentro do maior rigor técnico e jurídico e não a luz de um Acordão.

O desejo apaixonado de ambos, estes brasileiros invejáveis, de colocar um pano novo em um vestido rasgado pode levar mesmo a uma forte composição da elite governante deste país para impedir que se faça um rasgão na democracia de fachada.

Temo muito que nos reste colocar nossa cabeça sob a canga e continuarmos sem a vontade e até a força de sacudi-la.

Ou estamos em um tempo infectum? O de uma ação ainda não concluída.

Assista ao programa completo em: RODA VIVA



Até breve.

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

BOLASEIS



Sinuca de bico pura! Para quem torcia para quanto pior melhor, notícias de ontem geraram orgasmos múltiplos.

Não há nada que esteja tão ruim que não posso piorar, ainda. Estamos longe do péssimo e nos invejarmos de uma Venezuela ou, se quisermos ser mais chiques, de uma Grécia.

Mas caminhamos a passos largos.

A extraordinária edição, digna de prêmios de academia de cinema, do programa gratuito levado ao ar em cadeia nacional é uma demonstração evidente.

O partido que está há trinta anos no Poder nos convida, em nome da Verdade, para reconstruirmos nossos sonhos.

Seu representante mor, Presidente da República em exercício, já que a Presidenta viajava para os states, conclama o povo a se reunir em torno de uma proposta de futuro.

Os verdugos sanguinários com uma mão apunhalaram pelas costas aqueles com quem, neste momento, negociam mais espaços explícitos na governança. Com outra, mais maquiavélica e vil, abriram o processo de impeachment na Cama dos putos.

Perdoem-me o chulo e debitem ao meu desespero.

Vemos toda a esperança de uma nação inteira ruir aos frangalhos. Por um lado, um partido que foi a grande transformação de final de século em que milhões depositaram todo o ardor por mudanças, nas vísceras, se espatifa a luz cinzenta de seus gangsteres.

De outro lado o maior partido da América Latina, de forma oportunista, canalha, tem a petulância satrápia de conclamar novamente o povo descrente, disforme, órfão, vulnerável, perdido, para mais uma empreitada suicida.

Há ainda a ação explosiva de instituição pública que, pela santa e magna Justiça deveria estar zelando pela varredura geral da bandalha faz o desserviço de fatiar processos que endereçavam os corruptos à cadeia.

Triste pátria!

Em nossas praias copacabanas arrastões de periféricos jovens excluídos. Gentalha da perifa que grassa sem chinelos, sem lenço e sem documento, sem perspectivas e futuro, sem endereço, sem nome e sobrenome tentam acordar os banhistas alienados.

Está acontecendo algo nesse país, cambada!

As redes sociais brincam com nosso câncer, por força da nossa saída histórica que não é outra, senão a nossa idiotia. A charge com Obama e o Papa é de chorar aos gritos.

Basta, diria o nosso Pensador.

Mas não basta, somos isto na mais pura de nossa formação. Uma gente sem eira nem beira, sem rosto, sem dignidade, mercê de vilões novelescos, de tudo o que deveríamos a séculos abominar.

Ontem ganhei uma bandeja de doce de coco. Escrito na bandeja um recado de quem me conhece:

“Quando nem tudo parece doce ou leve... Eis que aparece uma gostosura para elevar os sentidos e reformular os pensamentos.” Beijos da afilhada.

Não fosse pelo meu mundo pequeno eu não suportaria o que meu olhar alcança.



Até breve.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

DESCACHOLAR



Desculpem-me, mas de novo sou guiado pela astrologia:

“As coisas tendem a ficar dramáticas demais por algum tempo, isso é algo que você precisa considerar com sabedoria e de forma antecipada, preparando-se para não perder a cabeça de forma precipitada em momento algum.”

Como se não bastasse, li hoje também a coluna do Veríssimo no Estadão que ele encerra com:

“...conseguimos evitar a guerra nuclear, uma cura para o câncer é iminente e todo dia aparece um sabor novo de picolé –, mas, às vezes, parece que estamos escorregando para mais mil anos de obscurantismo e estupidez. Né não?”

Minha fala aqui no dasletra, como de resto qualquer outra, é parcial e parcialmente na medida em que ela está dentro de um espaço e um tempo sobre o qual não se tem nenhum controle. 

Meu tema, as Humanidades (as artes, a filosofia, as ciências humanas, a literatura), decorre de como a sociedade contemporânea capitalista vive a experiência do tempo.

Apoiados em vários filósofos poderíamos dizer que o tempo é o presente da sensação, o passado de uma experiência que é a memória e o futuro uma expectativa que, em geral, é a esperança.

Houve um tempo em que as Humanidades tinham a função formadora e civilizadora. Iniciado no século dezoito com o Iluminismo e a Revolução Francesa que cortou a cabeça da aristocracia, pregou que Deus não existia e que era apenas uma articulação da igreja para dominação dos homens. Ali se acreditou que o substitutivo da teologia seria um novo conjunto de discursos, que teriam a função de libertação da Humanidade dos laços da servidão.

Nascem as universidades com o escopo da análise do passado das letras, das artes e da filosofia para ensinar as novas gerações a se dirigir em direção à um futuro em que, para a ideologia burguesa ocorreria a acumulação do bem estar social e o progresso da razão.

Kant enunciava que as luzes eram para todos e que, nos futuro, elas eliminariam toda ignorância, toda a superstição, todos os homens seriam iguais, não existiriam diferenças de nenhuma ordem, nem de sexo, raça, cor e se viveria a pura democracia.

A gente sabe que não aconteceu bem assim.

Nos anos 80 houve uma gigantesca reformulação mundial dos meios de produção pelo capital e o advento da maciça informatização levou a uma redefinição de Cultura: o moderno havia acabado. Durou desde os iluministas até 1980 e, a partir daí, a sociedade passou a viver o pós-moderno.

A cultura passou a ser, como tudo, um bem de troca, um presunto.

Vivemos hoje o que filósofos e historiadores franceses chamam de presentismo. Nenhum de nós se lembra do que comeu ontem à tarde, a cor da roupa que vestiu ontem, nós não temos memória de ontem muito menos memória histórica do que aconteceu em nosso país há vinte anos.

Mas e se se pergunta: e a Revolução? E o futuro?

O mais grave para as Humanidades é que elas, também, passaram a se subordinar às leis do mercado. Valem hoje quanto pesam, ou seja, nada. Um livro quando é lançado é simultaneamente apagado por um trilhão de outros lançamentos e outros blablabás de outros textos que produzem uma poeira de discursos, uma simultaneidade.

Cinco minutos depois ficam esquecidos.

Somos uma sociedade sem memória e, portanto, sem futuro também.

Rockefeller dizia: quando me falam de cultura, eu saco o meu talão de cheques. Isso nos anos 20 quando ele estava comprando obras de arte, Picasso, Matisse, para doar para os museus americanos. Era um capitalista ilustrado. Um nazista diz: quando me falam de cultura, eu saco a pistola. A solução nazista é esta em relação às Humanidades, queima livros ou mata os autores.

Hoje fundimos o Rockefeller com o Nazismo, uma espécie de indiferença radical em relação às Humanidades.

Ocorre que esta destruição é mundial. Na Alemanha, por exemplo, em Munique as universidades estão fechando cursos de filosofia onde se estuda Estética.

Para quê ter esperança?

Acho que, neste momento, perdi a cabeça e de forma precipitada.



Até breve.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

CONTEMPORÂNEAS



Obesidade Mórbida é uma doença complexa, grave determinada por vários fatores, ou seja, é uma doença multifatorial e deve ser tratada como tal; é uma doença crônica, o que significa que seus sintomas desenvolvem-se lentamente durante um longo período de tempo.

Entre as causas que contribuem para a obesidade mórbida incluem a herança genética, os fatores ambientais, culturais, socioeconômicas e, em uma grande parcela, os fatores psicológicos.

Associada a uma elevada incidência de complicações, tendo como consequência principal a redução significativa do limite de vida, é a segunda causa de morte evitável no mundo, perdendo apenas para os acidentes automobilísticos.

A causa é desconhecida. Estudos recentes mostraram um forte componente genético entre 25 e 50% dos obesos. Outros estudos confirmam a influência genética das proteínas produzidas pelas células de gordura no controle da saciedade. Estes dados confirmam que a obesidade mórbida é uma doença e não um distúrbio determinado pela falta de força de vontade, como às vezes implícita.

A cirurgia bariátrica envolve a redução do tamanho do reservatório gástrico, associado ou não a um grau de má absorção alimentar causado pelo desvio intestinal.

Celebridade Mórbida é uma doença complexa, grave determinada por vários fatores, ou seja, é uma doença multifatorial e deve ser tratada como tal; é uma doença crônica, o que significa que seus sintomas desenvolvem-se lentamente durante um longo período de tempo.

Entre as causas que contribuem para a celebridade mórbida incluem a herança genética, os fatores ambientais, culturais, socioeconômicas e, em uma grande parcela, os fatores psicológicos.

Associada a uma elevada incidência de futilidades, tendo como consequência principal a ampliação significativa do limite de alienação da vida real, é a segunda causa de estrelismo evitável no mundo, perdendo apenas para os prêmios e louros de academias e institutos de pesquisas.

A causa é desconhecida. Estudos recentes não confirmam componente genético entre 25 e 50% dos célebres. Outros estudos confirmam a influência de deformações éticas e culturais produzidas pelo desejo insaciável de reconhecimento. Estes dados confirmam que a celebridade mórbida é uma doença e não um distúrbio determinado pela força de vontade, como às vezes implícita.

A cirurgia desseslumbrática envolve a redução do tamanho do reservatório célebre desneural, associado ou não a um grau de má absorção estrelética causado pelo desvio fundamental.



Até breve.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

DEMODÊ



Em entrevista publicada no Estadão(*), Camille Paglia, provoca:

“A essência de nossa identidade se transforma no que fazemos no trabalho. Mas é correto nos identificarmos pelo que é tido como sucesso? Discutimos muito essa questão nos anos 60. As pessoas se interessavam por realidades mais elevadas, a vida, a morte, o sentido do universo. Hoje, quem se pergunta isso? Quando você coloca todo o significado na sua carreira, está fadado à superficialidade e ao vazio.”

“Antigamente, a composição fotográfica dos filmes na tela grande era baseada em pinturas. Havia iluminação por múltiplos ângulos, os atores pareciam esculturais. Essa arte está desaparecendo. Cresci em um período de telas grandes, vi Ben-Hur, Os Dez Mandamentos no cinema. Penso grande, como reflexo dessa época. E nossos pobres jovens, com seus smartphones, infelizmente vão pensar pequeno.
“A arte está perdendo sua centralidade cultural. Era nela que as pessoas trabalhavam questões difíceis. E agora não queremos dificuldades, nem nos sentir deprimidos. É um período em que as pessoas, pelo menos nos EUA, não querem ler Dostoiévski, Kafka, porque apresentam reflexões sombrias. Precisamos reaprender a ver para sobreviver nessa era da vertigem.”

Que bem faz a angústia, senão a produção de mais angústia? Que bem faz o saber, senão saber que se sabe menos? Que bem faz a reflexão se só se aprofunda? Os anos sessenta foram, na verdade, um porre.

Nos anos setenta em sobrevoei a Fafich e vivi o período mais profícuo dos meus dias. Livros aos quilos, papos aos montes, planos revolucionários de dar inveja, filmes aos quilômetros, teatro, jornalecos de DAs, juventude na veia.

A gente tinha e vivia uma utopia e nos chamávamos uns aos outros de BICHO.

A gente acreditava existir um inimigo comum e a possibilidade de uma revolução.

A gente ousava “pensar grande” um futuro.

Mas a Vida, essa imitação de segunda categoria da ficção, teima em acontecer. E nos deu esse presente que está aí.

Gilberto Gil disse em uma entrevista: “A tecnologia suplantou a reflexão”

Para Bibi Ferreira: “O inferno existe, é a velhice!”.

Vamos sim, nós os mais antigos e reflexivos, ter que – para sobreviver - padecer na vertigem deste inferno.

Há um lenitivo, entretanto: daqui sete anos (até um pouco menos) tornarei inimputável e setentenário. Qual o privilégio disso? Serei mais profundo, mais angustiado e saberei menos.

Liz, Valentin e Antônio me explicarão a Vida.



Até breve.


sábado, 19 de setembro de 2015

BRONHA



Penso que todo aquele que escreve espera que, ao fazê-lo, arrebate milhões. Arrebatamento no sentido de conversão.

Todo autor espera que o leitor após lê-lo modifique radicalmente a sua forma de pensar, de agir, de ser.

Ingerido um texto, é da expectativa do escritor, que a pessoa solte a franga, chute o balde, torne-se espírita, budista, esquerda ou direitista, polissexuada, assexuada, dormente, eufórica, ou coisas do gênero, ou nada disso.

Eu, no meu caso, não. Eu jamais pensei que, com o meu tesão pelas letras, eu pudesse fazer alguém gozar com elas.

Tem horas que nem mesmo eu atinjo o clímax. O ponto “G” da palavra é mais múltiplo, insabido, estranho e surpreendente do que o do Feminino.

Aliás, tai uma ideia.

Escrever, como atividade solitária, mesmo que ainda dirigida ao outro, é masturbatória e, não diga que eu disse, mas adolescente.

É como estou no banheiro pondo à mostra fantasias mirabolantes que só são possíveis no claustro e proteção de recinto fechado e que serve ao banho ou mesmo para expelir os inservíveis, líquidos e sólidos.

Não fosse assim o escritor seria tudo menos um animal que escreve.

Duvido que qualquer um que padece do ofício discorde e, se discordar, é porque tem vergonha de dizer que pratica o cinco contra um.

Correndo risco de arrebatar, digo que a partir desta introdução (aqui meramente no plano intelectual) a cultura não deriva de cópula, mas de ejaculação proliferante e milhardária.

Ai daquele que se permite prenhado por algo que lhe infiltra pelos olhos que leem.

Porra, isto está ficando contraditório.

Então peça alguém aí para explicar o prazer...




Até breve.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

PRED(G)AÇÃO



Dei alta para meu analista e tenho deitado no sofá do meu astrólogo preferido. Vejam o que ele me sinalizou hoje:

“Essa saudade de um passado melhor que te faz desprezar a realidade atual da civilização é fruto de imaginação distorcida. Nenhum passado foi melhor do que o presente, onde houve humanos, houve sempre complexidade e, além disso, nossa atualidade não é mero fruto do passado, é também o resultado de nossos anseios por um futuro que pressentimos. Desprezar a humanidade como se fosse o único reino predatório e que sua presença coloca em risco a natureza, pensa melhor e analisa bem esse discurso, se o levas até as últimas consequências perceberás que não se sustenta, porque se fosse verdadeiramente sério e considerasses tua própria humanidade, terias então que eliminar tua presença do planeta terra, ou aceitar que desejas, como os radicais, eliminar uma parte da humanidade para salvar outra”.

Meu passado foi sim melhor do que o presente. Acreditava na Utopia, nos sonhos, nos propósitos. Eu tinha um rol de referências pensantes que me nutria a esperança, mesmo que eu fosse por demais delirante havia sim um projeto de revolução histórica para alcançar isso, que é hoje o meu presente, um pouco melhor do que vivíamos.

É verdade que, como diz o Darin, que tomo se quiser dois banhos quentes por dia, não preciso me levantar para mudar o canal de minha TV, nem de máquinas de tirar retratos ou de filmar, posso viajar para os quatro cantos do mundo, posso um monte de facilidades operacionais. Posso interagir com amigos reais e virtuais, instantaneamente.

Posso optar por ser de outro gênero, de outra religião, de outro partido. A aparente liberdade me confere inúmeras ilusões de superfície.

Mas não dá para eu tapar os olhos, os ouvidos e os dedos que dedilham letras. Radicalmente não se trata de salvar ninguém e a nada, senão a mim mesmo. O meu discurso se sustenta às minhas vísceras que se embrulham diante do real.

É evidente, notório e insustentável que há inúmeros sinais de barbárie e a civilização corre riscos importantes. Todos que se rebelaram e que se rebelarão ainda contra fizeram, fazem e farão sim um serviço à Humanidade, mesmo que isso seja um projeto, ainda que utópico.

A Utopia não é o Bem, o Belo, o Humano. A Utopia é o direito à luta para que a natureza humana não se penda de vez ao iníquo, à besta.

A Humanidade é um risco em si mesma e cada um que busca em si negar e negar ainda faz um sentido imperioso. Viver não é uma decisão simplesmente moral, ética ou até mesmo religiosa.

Viver é ter com ciência. Ciência entendida como sapiência, descoberta, evolução. Ciência como análise, verificação, evidência. Ciência como Absoluto.

E os fatos comprovam que aponta-los, discuti-los, revela-los e opinar é uma tarefa de todos aqueles que supostamente têm (porque serão cobrados por isto) a tarefa de manifestar-se.

A presunção, a vaidade, a demanda para ser ouvido e com isto adquirir importância, a dificuldade com o anonimato e o ostracismo são sim, também, mazelas dos que se intelectualizam.

Livrai-me deste mal.

Apenas se ouçam.



Até breve.

sábado, 12 de setembro de 2015

BOLACINCO



Sinuca de bico pura! Para quem torcia para quanto pior melhor, notícias de ontem geraram orgasmos múltiplos.

O ex-presidente deverá ter que depor e os últimos elementos de defesa das pedaladas foram entregues ao TCU sob a alegação de que, se foram crimes do atual governo, eles já teriam sido cometidos pelo anterior.

Cereja do bolo o MPF pediu a dissolução de nove das empresas envolvidas na bandalha do Metrô de São Paulo.

Avaliação internacional do país como potencialmente caloteiro e dólar batendo em quatro perdeu até importância.

Não é último lance do tabuleiro de um xadrez, mas é quase.

Para qualquer casa que forem as peças embrulha, ou não?

Se se confirmarem evidências de que sim o ex-presidente sabia e a PF pedir o indiciamento, o exército de militantes já disse que vai para as ruas.

Se isto somar-se ao julgamento do TCU de que houve crime fiscal, o exército de militantes cresce.

Se não se confirmarem boa parte da sociedade vai desacreditar de vez das instituições e considerar que houve aí conchavo de baixo calibre. O ex-presidente sai fortalecido e 2018 corre um risco tremendo de lulalá.

Some-se a isto a confirmação da dissolução das empresas envolvidas com as obras do Metrô.

Orçamento 2016 em pauta com R$30 bi de déficit, e uns outros embrolhos a mais, é vamos ter mesmo um final de ano atípico.

Acho que nem os caciques do PMDB, protagonistas de todas as costuras desde o ocaso da redentora revolução de 64, vão dar conta de tecer tamanho novo tecido.

O gigante ter desperto e ter ido para as ruas em junho de 2013 implicou neste desfecho histórico. A História não precisa de homens para construí-la, apenas de um sucedâneo de fatos e ela se apodera da massa. E, muitas das vezes ou quase sempre, de forma passional.

Basta abrir qualquer grupo navegador de redes sociais ou comentários publicados em textos dos melhores articulistas do país. Nitroglicerina pura!

Dirão alguns: “Mas estávamos mesmo precisando disso e não há como fazer omeletes sem quebrar ovos”.

Nunca antes na história deste país estivemos com a elite governante com tantas feridas expostas: o Congresso, empresas líderes, o próprio judiciário, as instituições de controle, enfim, todos em uma vala comum os que os torna e a todos como adversários recíprocos.

Todos têm culpa nos cartórios.

O povo fará a sua revolução, disso eu não tenho dúvida. Pode ser até a de que, apesar da corte ruir literalmente de podre, vai seguir a vidinha e pular o carnaval do ano que vem esperando as Olimpíadas de 2016, as eliminatórias da Copa do Mundo.

Se bem que, num sei, vai que o povo é outro.



Até breve, eu acho.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

ROTEIROS





Como é de praxe vou ao horóscopo e me deparo com a “chamada” astrológica de Oscar Quiroga:


“Por que endereças esse olhar crítico e severo aos teus semelhantes, sentenciando que a humanidade sequer mereceria existir entre o céu e a terra? Não percebes que tudo corre da melhor maneira possível e que a civilização que nós inventamos é, hoje, muito mais sofisticada e melhor do que há apenas 150 anos atrás? Tuas sentenças se baseiam em teorias que nem tua própria alma é capaz de colocar em prática o tempo inteiro, pois cometes desvios e pequenas faltas. Por essas teorias tua alma é manipulada, pois para os conspiradores é mais interessante que tu sintas raiva e desprezo do que te confortes na verdade de que no somatório de esforços e boas intenções praticadas, o mundo só vem melhorando. Tu, que te regozijas nas críticas, desejas que o mundo termine. Aviso-te, o apocalipse é uma fantasia”.


Assisti ontem, no cinema, ao filme Homem Irracional do Wood Allen. Zapeando encontrei, entre outras, a crítica de Eduardo Benzatti: 


Woody Allen continua Woody Allen. Nesse novo filme "Homem Irracional", Joaquin Phoenix é o escolhido da vez para ser seu alter ego: um professor de filosofia (Abe Lucas), deprimido e desiludido com a filosofia e com a carreira de professor. Recém-chegado em uma pequena cidade dos EUA para lecionar, envolve-se com duas mulheres (uma professora casada e uma aluna também comprometida). É numa das saídas com essa aluna que presenciará (melhor: escutará) uma conversa que irá mudar definitivamente sua forma de ver o mundo: por que não matar outro ser humano que só prejudica outras vidas? Deixando de lado todo o debate filosófico sobre o Bem e o Mal, o Certo e o Errado, o Moral e o Imoral, o Ético e o Não Ético, Abe passa da teoria à práxis e coloca em movimento seu plano de assassinar um juiz (logo, um juiz que deveria representar a Lei, a Ordem e a Justiça, mas representa o oposto disso tudo). Essa decisão muda radicalmente a forma de Abe ver a existência e a humanidade. Passa a ver sentido nas coisas mais banais da vida, como um café da manhã. Claro que sendo um Woody Allen as coisas irão se complicar e a trama desemboca num final surpreendente - que eu não vou revelar.

Roteiro contado, resta se deliciar com os diálogos que saem da boca de Abe Lucas/Woody Allen, com seus trejeitos, suas caras e mais com tudo aquilo que nunca falta num filme desse diretor: interpretações teatrais, trilha composta por música clássica e jazz de primeira qualidade, referências à psicologia/psicanálise/psiquiatria - questões edipianas; tratamento farmacológico -, à literatura russa (o filme nos remete, não por acaso, à "Crime e Castigo" de Dostoievski) e aquele humor acre-doce "woodyalleano" que dá um tempero especial aos seus filmes. Fora tudo isso, ainda temos a boa interpretação de Joaquin Phoenix - com uma barriga típica de professor desleixado de meia idade - que fica citando (de forma bem superficial, diga-se de passagem) Sartre, Heidegger, Hanna Arendt para tentar explicar - e se convencer - o quanto o mal é uma parte intrínseca da constituição do ser humano, desse Homem que procura a racionalidade como antídoto aos seus "instintos mais primitivos", como diria... Roberto Jefferson.


Sempre acho que estes acasos, deslizes do cotidiano, remetem a algo em mim que tem a ver.




Até breve.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

ÁPICE



A criança síria me fez calar. Minha visão, mais do que a fala, viveu estes dias obnubilada e inibiu a verve compulsiva de vir às letras. O atual é tão avassalador que nenhuma notícia, nem imagem, nenhum fato causa. Tudo sucumbe à efeméride.

Traduzindo, a Vida sucumbe.

Há alguns dias enunciei aqui uma fala do pensador francês Alain Badiou em que ele coloca que a realidade apresenta-se travestida de complexidade, mas a vida continua simples.

Não consigo caminhar por este raciocínio. Está cada vez mais complexo ir ao simples. Penso que estamos diante de um ciclo agudo e ímpar de transformações. E elas se dão no cerne daquilo que convencionamos chamar de Instituições.

Família, direito e propriedade são pressupostos da liberdade de cada indivíduo, instituições que, paradoxalmente, determinam o ser humano em seu nível mais íntimo e o mantém sobre tutela.

Instituições é o elemento fundamental para que seja possível a expressão do humano. Elas nos livram de nossa essência bárbara, nos protegem de nós mesmos. A liberdade só se torna possível sob a égide das instituições. Para Kant “as instituições estão a serviço da proteção da liberdade”.

Ocorre que, no entanto, há evidências e cada vez mais contundentes de uma generalizada fragilidade do arcabouço institucional. Por qualquer ângulo que se procura colocar uma lente, observam-se contornos de uma crise preocupante.

A Democracia, por exemplo, esse pacto que assegura a nossa existência social e cotidiana e desvela a argamassa que, a cada instante, nos impede de desabar. Mas, com isso, paradoxalmente, vemos ruírem um a um todos os personagens competentes que garantem o negócio da administração da Vida.

O Território, de que nos apropriamos por força de onde termos nascido e nos constituirmos por força dele. Circula na rede um vídeo de uma jovem inglesa que em visita à sua cidade natal se depara com uma passeata de muçulmanos. Ela aborda alguns dos manifestantes que bradam que todos que não são muçulmanos devem queimar nos infernos. Ela tenta argumentar que eles não têm o direito de se expressarem daquela forma na cidade onde ela nasceu, como se a ela e exclusivamente à ela pertencesse aquele lugar.

Ou, ainda, esse imenso fluxo dos novos bárbaros, esses mais de sessenta milhões de refugiados (segundo dados de ONGs internacionais) migrantes impelidos por cruéis conflitos armados, fome, epidemias e outra série de iniquidades.

A quem pertence a abundância, a liberdade, o direito à vida digna?

O sociólogo polonês Zygmunt Bauman, no último capitulo (Convívio destruído) de seu livro Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos (*), escreveu:

“A unidade da espécie humana postulada por Kant pode ser, como ele sugeria, compatível com a intenção da Natureza, mas certamente não parece algo ‘historicamente determinado’. O continuado descontrole da rede já global de dependência mútua e de vulnerabilidade reciprocamente assegurada decerto não aumenta a chance de se alcançar tal unidade. Isso só significa, contudo, que em nenhuma outra época a intensa busca por humanidade comum, assim como a prática que segue tal pressuposto, foi tão urgente e imperativa como agora.
Na era da globalização, a causa e a política da humanidade compartilhada enfrentam a mais decisiva de todas as fases que já atravessaram em sua longa história.”

O Amor, esta Instituição fundante do Humano, agora líquido, sobreviverá?


Até breve.

(*) Bauman, Zygmunt, 1925 – Amor líquido:sobre a fragilidade dos laços humanos; tradução de Carlos Alberto Medeiros – Rio de Janeiro: Zahar, 2004.