Não há nada sobre o que se pudesse
falar durante um intervalo. Duas ou três horas escoariam até que voltássemos
para dentro do teatro. Quando se está muito próximo da estreia é melhor não
conversar muito sobre qualquer coisa. Melhor concentrar-se.
Mas acabou que não aconteceu assim.
Sentamos em um bar no térreo de um
prédio contíguo ao teatro. Pedi um café e ela pediu um chope, um cigarro
(imaginem) e uma porção de carne seca com fritas e cebolas.
- Estou com fome e sede.
- Vai fundo...
- Li meu horóscopo de hoje.
Deixe-me te mostrar aqui, abro agora no celular... Eu leio prá você: A sensação
de você ter perdido o domínio sobre a sua própria vida talvez não seja mera
sensação, porém, a mais fiel tradução da realidade. Contudo, também dá para
verificar que perder o domínio não é tão ruim assim.
- Para hoje?
- É. Dia 10 de agosto.
- E tem a ver?
- Ora, vá á merda.
- Isso não vale só para você. Todo
mundo anda meio que perdido.
- A questão é que eu estou de saco
cheio... Tô querendo deixar essa peça... Tô querendo parar de fazer teatro...
- Novela de TV, então?
- Num enche!
- O horóscopo tá dizendo que não é
tão ruim assim...
- Tá doendo às pampas...
- Grila não... Vamo tocar o texto,
a casa vai encher, aplausos nos embriagam... Pode até rolar uma grana legal. Se
bobear prêmio de melhor atriz de novo...
- Cagando e andando...
- Cê sabe que é importante ser
reconhecida... A crítica é burra, mas conta.
- Nem a cultura salva essa hora.
- Vamo fazer a nossa, tá legal? A
consciência do público é que dite qualé. Se quiserem ir para as ruas, que vão...
Senão, danem-se!
- Cê lembra como era?
- Acabou, já era, num rola mais...
- Mas que é foda é...
- Tá bom. Toma seu chope e vê se
desencana.
- Cê acha que nós temos chance
mesmo?
- A casa vai lotar...
- Num tô falando dessa porra, cara!
- Do quê, então?
- Ah, paga a conta aí e vamo voltar
pro palco.
Até breve.
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