segunda-feira, 24 de agosto de 2015

CAROCHINHA




“Para tornar a realidade suportável, todos temos de cultivar em nós
 certas pequenas loucuras”.

Marcel Proust

Vou escrever um conto, quem sabe uma fábula ou será uma história. Começo na segunda.

Era uma vez três porquinhos e um lobo mau, naturalmente.

Um dos porquinhos construiu sua casa de palha, um outro de madeira e o terceiro de pedra e tijolos. O lobo só entra na história daqui a pouco.

Até hoje não entendi porque os porquinhos viviam solteiros e um em cada casa. Mas não é por ai que eu vou enveredar na minha história que começo a escrever segunda.

Dois dos porquinhos, dado o tédio da floresta, às tardes ficavam brincando de roda cantando canções aprendidas na infância. Uma das preferidas tinha um refrão tipo:

- “Quem tem medo do lobo mau, lobo mau, lobo mau”?

O outro porquinho achava uma tolice dos irmãos e preferia ficar na varanda de sua casa lendo as obras de Proust.

Um belo dia choveu muito e aí, então, a casa de palha de um dos porquinhos encharcou de dar dó. A de madeira ficou um mofo só. A de tijolos, embora úmida, demandou do porquinho proprietário uma limpeza um pouco mais rigorosa.

Contudo, no dia seguinte fez um belo dia de sol e os porquinhos conseguiram reparar todos os danos trazidos pela intempérie.

Aí, então, um porquinho sumiu. E, o pior, o que lia Proust. Os irmãos, desesperados, não tiveram dúvida. Aumentaram a atenção porque um novo ataque seria iminente. Ficaram mais de duas tardes sem brincar de roda e muito menos cantarolar uma de suas canções preferidas.

Um belo dia, por volta do almoço, o sumido apareceu trazendo em sua mochila mais livros.

- De Proust?!!! Perguntaram os irmãos incrédulos.

- E por que não?

Noutro dia faltou água e eles tiveram que ir buscar baldes em rio que ficava a muitas léguas da casa de cada um e no final do dia foram dormir exaustos. Sequer assistiram à Peppa na TV.

Acho que foi em fevereiro que eles resolveram fazer juntos, os três, um picnic. Foi ótimo, divertiram-se a valer. Mesmo aquele que lia Proust.

Até que, numa noite de domingo, o porquinho da casa de palha ouviu um som de passos pesados vindo de fora.

- Quem está aí? Perguntou com um tremor nos lábios.

Não obtendo resposta tentou enviar uma mensagem via WhatsApp para os irmãos, mas como esquecera de colocar para carregar a bateria do aparelho, não conseguiu. O pânico aumentava a cada som de passo vindo lá de fora, até que, de repente o som cessou.

Aquela noite os porquinhos não dormiram. No dia seguinte os três trocaram a notícia, atordoados, de que haviam ouvido passos.

Noutro dia, pela manhã, em frente à sua casa de palha, um dos porquinhos deparou-se com o lobo. Com seus dentes a mostra, espargindo secreção pelos cantos da boca imensa.

As pernas do porquinho transformaram-se em rodas alucinantes de trem bala e ele conseguiu entrar para dentro de sua casinha de palha.

- Abra esta porta, senão eu vou encher os meus pulmões e vou soprar!

Bom, é apenas um preâmbulo da história que vou escrever na segunda.

Se bem que, pensando bem, acho que não vou escrevê-la. Estou achando o enredo muito parecido – mesmo que com algumas derivações absurdas - com outras que nos contam diariamente nos noticiários políticos e, além do mais, todos já sabem o final.

O povo, (ops) o lobo, sempre sai escaldado dessa história, enquanto os porquinhos continuam cantando uma de suas canções preferidas:

- “Quem tem medo do lobo mau, lobo mau, lobo mau”?

                                           

Até breve.

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