sexta-feira, 31 de julho de 2015

POLÍTICA





Fui desperto na madrugada de hoje por uma ideia estapafúrdia. Ou terá sido uma ilusão, mais um delírio, quem sabe uma quimera? O tempo dirá, como sempre.

Trata-se do seguinte: um burocrata lotado em um dos gabinetes da Casa Civil da Presidência da República, em Brasília, esqueceu-se de desligar o seu laptop e a iluminação vinda do aparelho, altas horas da noite quando o expediente republicano já havia se encerrado, despertou a vigilância do Palácio do Planalto que foi àquele escritório para averiguações.

Imaginei que o vigia responsável pela batida, deparou-se com a máquina ligada. Aproximou-se, não sem receios, e leu o que estava estampado na tela. Meu post publicado em 26 de outubro de 2014 com o título ÚLTIMACARTA.

Ali eu recomendava à recém-eleita Presidenta, uma série de ações estratégicas que pautassem o início de seu segundo mandato. “Que idiota!” Foi a reação do vigia depois de concluir a leitura do meu post e desligar, na tomada, a luz que semi-iluminava o ambiente.

Torci, nos meus devaneios madrugada de hoje, para que ao desligar a máquina o vigia possa ter contribuído para que o burocrata, ao retornar na manhã seguinte para o trabalho, não tenha encontrado na tela o meu post e, claro, dada a importância do texto, ter se esquecido dele definitivamente.

Ocorre que no post eu recomendo que a Presidenta faça uma reunião com os governadores, protagonistas chaves do meu plano estratégico recomendado.

Veja leitor como funcionam as mentes delirantes: foi aí que eu me lembrei de um filme muito usado em programas de desenvolvimento de executivos aplicados no milênio passado.

Os meus colegas contemporâneos, provavelmente hoje trajando pijamas e chinelos e levando seus netos à universidade, vão se lembrar do filme. Desenho animado, de umas figuras de bolinhas e quadradinhos que se movimentavam umas entre as outras, dando a conotação de como funcionam as equipes de trabalho, a formação de opiniões na comunidade e, também, o surgimento de líderes.

Em dada sequência, uma das bolinhas começa a circular em torno de quadradinhos e vai remodelando a figura até que aqueles, antes quadradinhos, tornam-se também bolinhas. E outras, agora bolinhas antes quadradinhos, seguem a mesma tarefa daquela que tinha iniciado o processo até que, de repente, uma bolinha-convertida, como se percebesse, se “rebela” e volta a ser quadradinho e repete a mesma ação da bolinha-inicial, remodelando as bolinhas-convertidas e tornando-as novamente quadradinhos. 

O que fazem as bolinhas-convertidas que se rebelam e voltam a ser quadradinhos? Juntam-se e vão ao encalço da bolinha-inicial e a massacram, literalmente.

Não sei se deu prá entender, mas é mais ou menos assim.

Qualquer semelhança com episódios recentes da cena nacional terá sido mera especulação de uma mente delirante. Cunha e bolinha-inicial parecem figuras muito próximas.

Na reunião de ontem, entre Presidenta e Governadores, um dos temas foi a escassez de vagas nas presidenciárias, me perdoem, penitenciárias.

Agora posso voltar a dormir.

Como um idiota, claro.


Até breve.

terça-feira, 28 de julho de 2015

COMUNICADO



ANÁLISE DE CONJUNTURA E RECOMENDAÇÕES 
 NÚMERO: AC-3567/2015

Também nós andamos preocupados com os índices de inflação. Especialmente com um dos itens que, todos sabemos, impacta na voracidade do dragão.

Não, não é energia, nem aluguéis, nem tomate e muito menos mandiocas.

Trata-se do “percentual de merecimento por transações especiais”, o PMTE. O PMTE é um fator de ajuste de preços contratados e de aditivos inclusos ao longo da execução dos serviços, tanto no mercado de empresas públicas como, menos, nas empresas privadas.

Há aí um combustível explosivo que pode afetar dramaticamente o PMTE, ou seja, as delações objetivaram que na formulação do índice, aumentará e em muito o risco das transações obrigando aos envolvidos a uma cuidadosa e criteriosa definição, doravante, do PMTE.

Claro, que para maior.

Como consultores de mercados alertamos aos interessados para que tenham cautelosa e inteligente elaboração não só na composição das planilhas que sustentam os contratos como também na forma em que serão acertadas as condições para que a transação seja feita mitigados os riscos inerentes.

Claro que em o risco aumentando, aumentarão os ganhos, mas agora com a sofisticação dos processos recomendamos a elevação do nível intelectual dos envolvidos e, principalmente, da matriz de escrúpulos que integra o caráter dos mesmos.

Por exemplo: nada de contar com pessoas que tenham família minimamente estruturada e alienada daquilo que o seu membro faz na vida, esse é o risco mais primário e, doravante, inadmissível.

Nenhum comentário em alcovas, bares com supostos amigos, isso dejeitonenhum.

Outra recomendação: não usem bilhetes, mesmo que escritos em papel carta, e, nunca, nuncamesmo, escrevam email, zapzaps, msm ou qualquer outro meio digital ou impresso de espécie alguma, mesmo que sejam para reclamar de transações bovinas, suínas, equinas...

Nas transações que envolverem químicos, aqueles que fazem conversão de moeda real para moeda paradisíaca, especial cuidado para que jamais estes indivíduos tenham alguma fez na vida lavado os seus possantes importados em postos de gasolina, especialmente aqueles estabelecidos na Capital Federal.

Nossa preocupação com a inflação é de que precisamos ter muita calma nessa hora para que nossas transações não sejam drasticamente reduzidas face à retração de investimentos, acarretando em valores contratuais muito aquém daqueles que vínhamos praticando antes desse pequeno dissabor momentâneo.

Vale dizer, vamos manter o otimismo de que logo logo tudo voltará à normalidade nacional e poderemos, como sempre, caminhar a passos largos em direção à nossa riqueza tão suada e merecida.

Ao terminarem de ler este COMUNICADO ele se desintegrará em cinco segundos. Para adquirirem o software podem entrar em contato pessoal conosco. Fazemos, sem nota naturalmente, por uma ninharia.

CLEAN'S CONSULTING



Até breve.


NOTA: É que ontem assisti na TV Cultura ao programa Roda Viva que entrevistou Laurent Sourisseau, Diretor do jornal parisiense CHARLIE HEBDO.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

SESEGURAPEÃO



Iche!!! 

Agora a estratégia ficou complicada. O Planalto, para se safar, diz que o crime não é só federal. Estadual, também. O que eu acho cômico, para não dizer trágico, é que a notícia é publicada como se os mais atentos não soubessem do expediente.

“Ciente das dificuldades dos Estados, o Planalto espera contar com o apoio dos governadores. Um levantamento produzido pelo Planalto mostra que ao menos 17 governadores praticaram, em maior ou menor grau, operações idênticas às manobras no Orçamento conhecidas como ´pedaladas fiscais´, atrasando repasses de recursos a bancos públicos para conseguir cumprir programas sociais.

Embora o tema do encontro de quinta-feira entre Dilma e os 27 governadores convidados não seja a prestação de contas, o Planalto avalia que o cenário de incertezas batendo à porta dos Estados contribui para a sinalização de apoio à presidente, apesar das divergências partidárias.” (O Estado de São Paulo, 27jul15)

Não importam os meios, importam os fins.

Sei não, mas estamos de tal maneira que se formos consertar o País vamos acabar bagunçando mais do que já estávamos. Não é melhor fingirmos que está tudo bem e tentarmos fazer como vínhamos fazendo, isto é, todo mundo sabia de tudo, mas ninguém denunciava nada e se denunciasse acabava nas gavetas dos tribunais?

Essa meada não tem fim.

Olhando a partir das redes sociais vejo clima por uma expiação ampla, geral e irrestrita. É claro que todos estamos ainda mais tomados pelo nosso ganhapãododiaadia, mas a coisa lavaindo. E a jato.

No limite da lavagem, aqui no sentido de limpeza, pode atingir até a nós próprios em nossos microcrimeshediondos. Ninguém está puro, essencialmente. Do tipo: alô, meu dentista, vou ter que lhe pagar mais para que você me dê recibo?

Pois é.

Ontem, transitava em meu carro e parei num semáforo. Observei, nos poucos instantes enquanto aguardava o sinal abrir, uma pessoa que me lembrou da famosa obra de Rodin: O Pensador.



O que pensava aquela pessoa? Perguntei-me.

Torci para que fosse:

“Depois disso tudo eu terei um lugar? Eu serei?”


Para enriquecer assista: 




Até breve.

domingo, 26 de julho de 2015

AVOS



Deixa de ser crime algo que eu cometa depois que outro, pelas mesmas razões alegadas por mim, tenha cometido em passado.

Essa é a nova conclusão à que estamos expostos, os Homo Otários.

A canalhice virou defesa-de-tese com foco em jurisprudência.

Os gestores da coisa pública (cada vez menos pública) fizeram de novo e agora a mesma coisa pela qual estão sendo julgados no TCU, com risco de demissão da chefia. Pedaladas!!!

Numa reunião sobre o quadro fiscal do governo na semana passada, a presidente e ministros da área econômica discutiram o assunto. Avaliaram, no entanto, que a defesa para a manobra do ano passado, recém-apresentada ao TCU, serviria para justificar também o que foi feito agora.

O governo argumenta que, tradicionalmente, a equipe econômica administra o Orçamento entre janeiro e dezembro baseada em projetos e medidas provisórias que elevam a arrecadação (pela alta de impostos, por exemplo) ou diminuem despesas (como mudanças de regras de programas públicos), que estão em tramitação no Congresso.

Além disso, o governo também observa na defesa que essa prática ocorre há muitos anos, sem nunca ter chamado a atenção do TCU. “A prática de usar cenários prospectivos não é uma coisa nova. Isso aconteceu em 2009, quando o governo alterou a meta fiscal, e também em 2002”, disse o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, há duas semanas.

Muito bem. Quando Noninha não quer comer ou fazer qualquer coisa que reprovo eu digo à ela que vou chamar o guarda e, para minha surpresa, até hoje tem funcionado bem a prática.

Mal comparando, é claro, como o guarda é uma obra de ficção e não disse nada, governantes de plantão acharam que podiam fazer esta e outras práticas que possam “administrar” as contas do condomínio.

Se bem que há, no caso atual, uma novidade inquietante. O governo alega se se não pudesse mesmo cometer crimes já cometidos ele, o TCU, deveria ter avisado e, portanto, eles não teriam incorrido na manobra.

Homo Otários!

Há uma historinha muito conhecida que conta o seguinte:

Era uma vez três porquinhos...

Era uma fez uma rainha muito má...

Era uma vez uma princesa que foi presa por sua madrasta em uma torre muito alta...

Era uma vez uma menininha muito pobre que ficou conhecendo, por acaso, um príncipe...

Era uma vez...

No dia dos avós ainda bem que temos estórias para contar para nossos netinhos, até que eles cresçam e descubram que a única parte verídica que conta no enredo é a vilania.


Até breve.


NOTA: O título deve ser lido sem o acento e não AVÓS. Avos no sentido de parcela, como em 10/12, dez doze avos.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

QUESOLIDÃOQUENADA



Falando de cunha e lama, apreciei muito o final da coluna A cabeça dos oligarcas de Elio Gaspari, publicada hoje na Folha.

“Afora os amigos que fazem advocacia auricular junto a magistrados, resta a ideia da fabricação da crise institucional. Ela seria tão grande que a Lava Jato passaria a um segundo plano. É velha e ruim. Veja-se por exemplo o que aconteceu ao vigarista americano Bernard Maddoff: na manhã de 11 de setembro de 2001, ele sabia que seu esquema de investimentos fraudulentos estava podre. (Era um negócio de US$ 65 bilhões.) Quando dois aviões explodiram nas torres gêmeas de Nova York e elas desabaram, matando três mil pessoas, ele pensou: ‘Ali poderia estar a saída. Eu queria que o mundo acabasse’.

Madoff contou isso na penitenciária onde, aos 77 anos, cumpre uma pena de 150 anos.”

Exatamente por isto quero crer na cunha colocada na lama (ABSURDAR).

Mais do que a recuperação aos nossos cofres dos petrobrasdoláresbandalhados o que podemos tirar da grita é a depuração da gentalha que ocupa as instituições políticas há décadas. Somente eles próprios seriam capazes de se destruírem.

Se os magistrados tiverem mais do que coragem, extremíssima competência contra as inúmeras cascas-de-bananas-processuais que o intricado arcabouço jurídico os coloca, a nossa chance de ver o circo pegar fogo, conosco – os palhaços – de fora da lona, é imensa.

Fico aqui comigo mesmo vendo o que sobraria. Provavelmente uma verdade que todos nós sabemos e de há muito, mas Homo Otários historicamente fizemos de conta que não fomos nós próprios que urdimos.
Não está na hora de se revelar não somente a recusa de uma sociabilidade envenenada, porém fazer o chamamento para um tipo de solidariedade nova, o apelo por uma comunidade por vir?

Mesmo que ao preço da familiaridade com o mundo se desprender de estruturas da vida aprisionantes e fazê-las voar pelos ares, mesmo que de maneira silenciosa? Com sua carga antissocial esse ímpeto pode até ter um elo demoníaco ou terrorista aos olhos de todos nós, mas o que está em jogo nisso de “pulsão anarquista” é uma resistência ao domínio aglutinante da pústula que nos (des)governa.

Quando a vida é reduzida a uma tal vida besta, nesse esgotado hipnótico mundo consumista dos homo otários, quando a dissolução das formas institucionais ou identitárias que antes asseguravam alguma consistência ao laço social, quando a dissolução dessas formas apenas reitera a gregariedade atomizada cabe indagar o que poderia ainda nos sacudir de tal estado de letargia.

Minha solidão me arrebata. Preciso ser solidário ainda que solitário.

Vivemos em um capitalismo em rede que enaltece ao máximo as conexões e esconjura a solidão, porém esse mesmo capitalismo produz toneladas de uma nova e outra solidão e uma nova angústia, a angústia do desligamento. O capitalismo contemporâneo produz não só essa nova angústia de ser desconectado da rede digital, mas também de ser desconectado das redes de vida cujo acesso é mediado crescentemente por pedágios comerciais impagáveis pela grande maioria.

Estou ciente disso. A grande maioria está excluída da consciência e dos fatos, portanto sem a menor condição de se rebelar contra eles. O Povo não há. Mas o que fazer senão pregar aos poucos que nos restam, privilegiados pela escuta e a visão verdadeira do que se passa?

Nós somos muitos, os solitários.

Que modalidades de êxodo, de escape, de exílio voluntário ou involuntário, que modalidades de curto-circuito silencioso ou ruidoso podem vir a denunciar tal contexto de sobrevivencialismo maciço, por mais místicos, psicóticos ou suicidas que pareçam essas formas de êxodo?

Quais e quantos gestos solitários, mas também experiências instituídas que lhes fazem eco podem reivindicar uma distribuição outra entre o que está vivo e o que está morto, entre viver e sobreviver, entre aquilo que é desejável e aquilo que é intolerável?

Quantos gestos solitários e também experiências instituídas podem reinventar a relação entre solidão e vida coletiva?

De modo tal que o desafio dos solitários contrariamente a qualquer reclusão autista, ainda que eles se chamem aliens e mesmo que termine em um hospício o desafio deles é sempre o de encontrar ou reencontrar o máximo de conexões, estender o mais longe possível o fio de suas simpatias vivas.

Puta drama, esse, daqueles que serão condenados especialmente por si próprios, por terem visto tanto e transformado tão pouco.

Filosofia demais apenas para dizer: Abaixo a Vigarice! Que a lama seja movediça e drague os infames.



Até breve.

terça-feira, 21 de julho de 2015

DESABSURDAR



Eu continuo aqui, ainda, destilando letras em palavras fraseantes.

Atordoado, às vezes, desesperançado, muitas vezes, ocupado com minha imensa ignorância para dar conta do extraordinário mundo novo.

Na sua coluna de hoje na Folha (A dura cabeça digital) Luli Radfharer, escreveu:

“Hoje que cada um é capaz de (e obrigado a) desenvolver suas próprias referências éticas para distinguir entre usos legítimos e ilegítimos de conteúdo em seus ambientes culturais - ou seja, de fazer sua própria seleção e edição de conteúdo – a internet se transforma em uma espécie de lente cultural através do qual se constrói ou distorce a realidade. A maneira como uma busca é elaborada pode fazer uma grande diferença no tipo de resultado obtido.

Hoje que há conteúdo abundante e todos são fonte de informação, não há mais carência de dados. Para evitar a obesidade, é preciso desenvolver um programa de ginástica mental. Antigamente se recomendava acompanhar três veículos de imprensa com linhas editoriais bem diferentes. Hoje isso praticamente não existe.”

Pois é.

Assisti também ao vídeo produzido pela Revista Trip, entrevista com o cineasta José Padilha, no qual ele diz que o absurdo não nos causa mais. Tudo fica incorporado à paisagem e, assim, tudo segue como está.

Tenho, portanto, sempre que posso, especialmente quando não estou diante de meus invasores – NINJA – zapeado redes sociais, o que me assusta diariamente. E por quê?

Sempre me interessei. Desde menino fui sujeito da pergunta e até hoje me faço. Não sou afeito a respostas. Até no nosso dito quando alguém responde algo, dizemos: “Matou essa!”. Por isto eu não gosto. A vida é pergunta infinita. A morte é resposta calada.

Intão?

Dennis, um amigo dos tempos de Fafich, compositor e poeta de pena fina, tem uma canção em que ele agulha: “Que tamanho tem o mundo, prá que lado fica o fim”?

Matou essa, Dennis!

Essa pergunta sempre acabou comigo e ao mesmo tempo me apazigua. A gente nunca vai saber e vai ter que continuar procurando. No meu caso fui privilegiado, porque principalmente nos últimos cinco anos, alarguei meus quilômetros de retinas e neurônios sobre esse mundaréu.

E o que ficou em mim e para comigo foi que deveria estar sempre vivo pronto para morrer. Hein???!!!

Isto mesmo, a sensação de ter vivido o suficiente para compreender que a vida encontra sua resposta na negação e, portanto, deve ser intensa. Dizer não a tudo que nos afeta e sim a tudo o que nos arrebata.

Por exemplo, para hoje: “Tem uma cunha no fundo da lama”.



Até breve.

domingo, 19 de julho de 2015

NINJA



Anos atrás a grade de programação das TVs abertas contemplava a exibição semanal de filmes temáticos: segundas-feiras Segunda Sem Lei (filmes de faroeste); às quinta-feiras filmes de terror ou suspense (inclusive Hitchcock) e, às sextas-feiras – acho – era exibida a série Os Invasores, alienígenas que vinham azucrinar a vida dos terráqueos.

Sexta-feira, bem cedo, me deparo com a seguinte mensagem no WhatsApp do meu celular:

- Indo.

- G2.

Desci para a garagem (G2) do prédio onde moro e, quando o carro de Pretinha desceu a rampa tive a nítida sensação de ser um daqueles Óvnis baixando à Terra. Atrás, os raios solares iluminavam a cena.

Fui de um lado para o outro do carro para retirar das cadeirinhas os meus mais caros invasores: Liz e Tim para uma jornada de sexta inteira sem lei, repleta de horrores, algum suspense e delírios.

- Ei vovô!!! Ei vovô!!! Vamos passar o dia inteirinho com você!!! Yuuuppiii...

- Eu quero colo, vovô!!!

- Pai, ás dez Tim vai dormir, você sabe, né? Dez e meia vai ter um teatrinho no BB e acho que às quatro no Shopping Pátio.

- Quero colo, vovô!!! Colo!!!

- Espere, Liz... Você não quer ir andando?

- Colo!!! Colo!!! Colo, vovô!!!

- Se der eu vou pegar o ingresso, mamãe vai estar às dez horas e você leva a Liz no teatrinho do BB. Depois à tarde a Val desce e fica com o Tim para você ir no Pátio. Às duas horas você tem que entrar na fila para pegar o ingresso antecipado...

- Vovô... Vovô, eu quero colo!!!

- Não deixa de dar banho antes dele dormir, nela não precisa não, deixa para dar antes de levar à tarde no teatrinho. Vai ser da Bela e a Fera, Liz adora... Ih, pai, Tim tá todo cagado. Troque ele logo se não assa... Não esquece de pegar os ingressos antecipado às duas... Tá dando maior filão... Gente à beça... Férias, cê já viu né?

Subi com Liz e Tim no colo, além de carregar a bolsa com as roupas para a estadia dos invasores. Liz carregava, como um troféu, um CD contendo fotos e vídeos do 1º semestre na escolinha.

Quando entramos no apartamento, assumiram o lugar.

- Quero brincar de massinha... Desenhar... Quero ver o filme da escolinha... Vão vovô, põe o filminho no computador... Quero suco, vovô...

- Espere, Liz.

- Agora, vovô.

- Bó... Bó... Vovô, Bó...

- Já vou Tim... Já vou jogar bola contigo...

- Filminho, vovô...

- Bó... Bó...

- Suco, vovô... Suco...

- Vem Tim, vem aqui para nós tirarmos o cocô...

- Suco... Suco... Desenhar... Cadê os batons da vovó... Posso passar?

Eram dez e pouco e eu já tinha assistido algumas vezes com Liz e Tim no colo a todos os vídeos além de ver todas as fotos da escolinha.

Joguei várias partidas com prorrogação e disputas de pênaltis com Tim em todos os cômodos do apartamento.

Pausa para massinhas...

- Tim não meche, a massinha é minha!!! Faz uma cobra, vovô... Um monstro... Anda vovô...

- Bó, vovô... Bó...

De repente:

- Uai, pai??? Tim não foi dormir ainda? Você não deu banho nele? Ah, pai, não é possível!!! Cê acredita que eu não consegui os ingressos. Lotado...

Lavei as mãos do Tim, arrumei a caminha e deitei com meu netinho para fazê-lo dormir. Enquanto isto Pretinha toureava Liz.

Depois que Tim dormiu, eu saía do quarto e:

- Pai, se eu fosse você fazia as suas coisas enquanto eu estou aqui...

- Você vai almoçar conosco, Pretinha?

- Acho que não vai dar.

Liguei meu laptop, acessei e respondi alguns e-mails, li algumas notícias, fiz alguns pagamentos via internetbanking, quando:

- Bó, vovô... Bó...

- Não vovô vai brincar só comigo... Filminho, vovô... Massinha...

- Põe o sapato, Liz... O chão tá frio...

- Não, vovô... O sapato tá apertado.

- Põe o chinelo da vovó, então.

- Eu quero por o seu... Eu vou por o seu, então... Vou passar batom da vovó...

- Bó, vovô... Bó...

- Vovô, rápido, eu quero fazer xixi... Vem... Vem, vovô...

Eram onze e meia, Pretinha havia descido para almoçar junto com Liz em um restaurante que fica em frente ao prédio de nosso apartamento. Pouco depois, WhatsApp no meu celular:

- Desce, pai. Vem buscar a Liz. A mamãe não chegou aqui ainda e eu preciso ir para o trabalho.

- Desci com Tim no colo.

Pretinha tinha acabado de engolir a comida e tentava dar colheradas para a Liz e...

- Eu quero picolé, vovô... De chocolate.

Fiquei com os dois no restaurante tentando dar comida para a Liz quando, pouco depois, a vovó chegou:

- Mas você não deu comida para ele ainda, mozinho???!!! Que absurdo!!!

- Acho melhor dar lá no apartamento... Eu levo em uma marmitinha...

- Ah, que absurdo!!!

Voltamos para o apartamento e vovó foi fazer Liz dormir e eu dar comida para o Tim.

- Última... Última... Tinzão, última... Olha o bocão...

As treze e trinta saímos, eu com Tim no colo e a vovó levando Liz no carrinho, em disparada para pegar antecipado os ingressos no Shopping onde às dezesseis rolaria a peça.

Na fila já tinha umas cinquenta pessoas aguardando e o teatro é para 114 lugares assentados. Tranquilo, portanto. Só que, eu estava sozinho na fila com Tim que brincava com outras crianças. Não havia ainda iniciado a entrega dos ingressos. A vovó tinha ficado com Liz em uma das lojas.

Recebi um email urgente de um cliente e que eu deveria responde-lo incontinente. Escrevi a primeira frase e deparei com o sumiço do Tim. Putz, e agora? Pedi para guardarem o meu lugar na fila e desorientado fui à caça do meu pimpolho de um ano e quatro meses de idade. Segundos imensos depois o vi atrás de uma pilastra esbanjando um sorriso maroto.

A vovó voltou a tempo de junto comigo pegarmos quatro ingressos – Leandro e Mateo iriam comigo e Liz assistir à peça.

Voltamos para o apartamento e às quinze horas fiz a mamadeira deles: mamão, maça, banana e leite em pó. Troquei as fraldas de Tim e o coloquei novamente para dormir. Às quinze e trinta peguei Liz, que havia acabado de tomar banho junto com a vovó.

Fui, praticamente correndo, com Liz no colo para o teatro que fica a uns quinhentos metros do nosso apartamento. No caminho, toca o meu celular:

- Agulhô? Já estamos aqui...

- Tô chegando...

Era Leandro.

Afinal já dentro do teatro ocupando os lugares dos quatro ingressos colhidos antecipadamente, quando:

- Tá demorando, vovô...

- Já vai começar, Liz.

- Tá demorando, vovô...

Alguns minutos antes do início da peça, a produção informou que havia muitas pessoas fora do teatro e se todos os presentes à sala poderiam fazer a gentileza de colocarem as crianças no colo. Duzentas e poucas pessoas lotaram o teatro, assentando-se inclusive nas escadarias e ficando de pé em outros espaços.

Liz no meu colo.

- Vovô, tá escorregando... Me segura direito, vovô... Tá demorando...

Para distraí-la passei a brincar com outras crianças próximas a nós, até que:

- Fica quieto, vovô!!! Parece menino...

Ao longo da peça:

- Vovô, a fera é boazinha, não é?

- Foi feitiço, Liz.

- Mas ela vai ficar boazinha, num vai?

- No final...

- Eu quero agora.

- Espera, Liz. Assiste.

- Eu quero que ela fica boazinha agora.

- Ela já vai ficar.

- Porque ela ficou fera?

- Feitiço.

- Da bruxa?

- É, da bruxa.

- Mas ela vai ficar boazinha?

- Vai.

- Agora?

Eram já dezessete horas e poucos minutos e retornamos para o apartamento, Liz, eu, Leandro e Mateo. Val havia ficado com Tim porque a vovó tinha que voltar para o consultório.

Eu, Leandro, Liz, Mateo e Tim descemos para a área de lazer.

- Eu quero ver a piscina...

- Não pode, tá frio, Liz.

- Eu também quero.

- Não Teteo, agora não pode.

- Bó, vovô... Bó...

- Vamos todos jogar bola, Tim.

- Eu quero brincar é de corrida, vamo Teteo?

Seis e pouco da tarde Leandro disse que tinha que ir embora para casa dar jantar para o Mateo e eu subi para o apartamento com Liz e Tim.

- Vamo brincar de massinha, vovô? Eu quero ver o filminho. Faz pipoca, vovô... Eu quero suco.

- Bó, vovô... Bó...

Perto das sete horas preparei o jantar para os meninos. Felizmente comeram bem, inclusive sobremesa Danoninho e alguns morangos.

- Última, Tim. Come, Liz. Abre o bocão, Tim. Come tudo, Liz.

Passava das sete e meia quando Cláudio chegou para buscar os invasores. Pretinha ainda continuava trabalhando. Desci à garagem com Tim no colo e dividindo sacolas com Cláudio.

- Brigado, Agulhô.

- Ora, Claudinho, não foi nada.

Onze e meia da noite, já em nossa casa de Santa Luzia, estávamos eu e a vovó terminando nosso lanche:

- Acho que vou tomar um Dorflex. Tá me doendo todo, até do lado esquerdo da orelha direita.

Dormi e acho que sonhei. No sonho me penitenciava por não ter dado banho no Tim às dez horas da manhã em ponto, o que foi menos grave do que tê-lo perdido por alguns imensos segundos no shopping.

Semana que vem tem mais. Liz entrou de férias. Nas brechas de minha agenda, vai sobrar de novo prá mim.

- Bó, vovô... Bó, vovô...

- Não, vovô, vem brincar comigo... Massinha, vovô... Eu quero ver o filminho de novo.

- Liz vai por o sapato, vai. O chão tá frio... Olha que eu vou chamar o guarda , hein!!!



Até breve.

NOTA: Para quem ainda não sabe: Liz (Noninha, três anos em agosto) e Valentin (Tim, um ano e quatro meses) são meus netinhos, filhos de minha filha Valesca (Pretinha) e de Cláudio. Leandro é casado com Camila nossa sobrinha/afilhada e pais de Mateo (Teteo, dois anos e sete meses). Val é Valdirene a pessoa que ajuda Pretinha nas tarefas de casa e cuida também dos meninos.