domingo, 15 de março de 2015

SANTÊ



Ouvi a notícia no rádio do carro, quando voltava hoje de Santa Luzia. Meu coração estoou aos gritos. Meu berço acaba de ser tombado.

O Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Belo Horizonte tombou o bairro de Santa Tereza. Trezentas casas, igrejas, restaurantes e bares, além de praças, compõem a lista dos imóveis que compõem a lista de tombamento.

A ideia é preservar as edificações e, com isso, preservar o bairro nos seus aspectos intangíveis como cultura, história tradição e influência musical. "Santa Tereza não tem só o patrimônio arquitetônico e ambiental. Existe um patrimônio de cultura que transcende isso tudo", disse o presidente do conselho, Leônidas Oliveira.

Segundo Oliveira, a iniciativa possibilita a preservação não somente dos imóveis tombados, mas de toda a ambiência e do conjunto arquitetônico, paisagístico, urbanístico e cultural do bairro.

Bairro de classe média na zona leste de Belo Horizonte, Santa Tereza guarda características arquitetônicas da década de 1960 e abriga um dos mais tradicionais redutos boêmios da capital mineira com casas de serestas e bares, onde pessoas ligadas às artes se encontram para confraternizar, compor músicas e poesia, dançar e cantar, e beber, nas noites de Belo Horizonte.

Depois de ouvir a notícia resolvi passar pelas ruas por onde meus pés descalços vagaram em busca de aventuras e traquinagens na minha adorável infância. Eu conhecia cada beco, cada lote vago, precisávamos apenas de quatro pedras para demarcar os gols e jogar nossas peladas intermináveis.

A Praça Duque de Caxias, o Coreto, cada pedaço de chão tem um pouco de minhas retinas impressas. Eu estou ali, impregnado em lágrimas saudosas. Sim, eu fui muito feliz em Santa Teresa.

Só saí de lá aos vinte e três anos. Foi na matriz de Santa Teresa e Santa Teresinha que fui batizado, casei, batizei meus filhos, lavei-pés, vendi velas na semana santa. Cri.

Tenho esse lugar no meu sangue e nas lembranças. As peladas também em frente ao cinema, do qual o porteiro Pedrinho foi ameaçado de levar uma surra certa vez por um de meus irmãos se ele não permitisse que eu entrasse para assistir um filme com censura para 18 anos de idade. Eu tinha quinze.

Minhas andanças com o tabuleiro de bolinhos de feijão. Minhas aventuras em tábuas de sebo por ruas então calçadas com pedras pé-de-moleque, Bauxita, Formosa, Galba Veloso. Finca nos passeios de terra. Pipas empinadas até quando a lua branqueava o céu sem arranha-céus.

Minhas inúmeras noites na Praça Duque de Caxias, com amigos, tramando mudar o mundo e a vida.

Meu encontro com Ela, quando saía da missa.

Tornei-me eterno com o tombamento. Em algum lugar do mundo residirá minha presença. Basta a eu saber que não violentarão meu berço. Definitiva esperança e alegria.

Hoje em fiquei mais feliz.




Até breve.

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