Certa vez o Diretor Executivo de
uma empresa convocou o Conselho, do
qual eu fazia parte, para apresentar os resultados alcançados em um determinado
trimestre.
Passadas mais de duas horas de
reunião com o Diretor, que convidou
os seus diretores e gerentes, abriu-se a discussão plenária. Os resultados
apresentados eram muito ruins, preocupantes até. Os debates circularam em torno
de onde estavam os resultados negativos, isto é, em que segmentos de negócios a
empresa não havia conseguido realizar os seus planos contratados quando da
negociação com o Conselho.
E ficou nisso.
A reunião praticamente terminara e
o Presidente do Conselho, percebendo que eu não me manifestara até então, me
consultou:
- E ai, Agulhô, alguma
consideração?
- Eu penso que analisamos um
cadáver, vítima de várias perfurações à bala. Passamos todo o nosso tempo
verificando qual foi a bala que o matou, se foi a que atingiu o pâncreas, ou
aquela que atingiu o pulmão, ou outra qualquer. O que me parece é que o cidadão
está morto. Não seria mais pertinente debatermos como vamos nos preparar para
não levar bala?
Duas reuniões após o episódio,
voltamos a discutir sobre aquela reunião. Decisão do Presidente do Conselho: o
Diretor Executivo não deveria mais convidar sua equipe para apresentação dos
resultados. Poderia vir a desmotiva-la.
...
Em outra organização, essa fictícia
embora qualquer semelhança seja mera coincidência, a alta administração tomou
contato com denúncias, vindas de fora, de desvios no Caixa. As denúncias
tomaram vulto e consistência e os dirigentes nem os membros do Conselho de
Administração ou de Acionistas tomaram alguma providência.
Por força de lei, a empresa obra de
minha limitada imaginação, teria que divulgar o balanço e o fez sem a depuração
dos valores da sangria.
- Por que o senhor (ou senhora, como queiram) divulgou o balanço sem
considerar os maus feitos? – Perguntou a Presidente do Conselho de
Acionistas ao presidente ou presidenta (como queiram), da companhia.
- Se eu o fizesse assumiria que eles ocorreram...
- Mas ocorreram?
- Me parece que sim, mas eu não sei como estima-los...
- E por que não?
- Por que foi tudo “por fora”...
- Ah, intãotá.
Tipo do diálogo improvável, mesmo
em ficção, porque se torna pouco crível. No mundo real ou mesmo no suprareal a
história para ser palatável ou mesmo interessante poderia ter como epílogo:
- Se o senhor (ou a senhora, como queiram) permitiu que ocorresse a
sangria e durante tantos anos, como apontam as denúncias, não tomou nenhuma
providência teremos que substituí-la uma vez que o senhor (a) não foi capaz de
debelá-la.
Ou:
- Se o senhor (ou a senhora, como queiram) não sabia que ocorria a
sangria e durante tantos anos, como apontam as denúncias, não pôde tomar
nenhuma providência teremos que substituí-la uma vez que o senhor (a) não foi
capaz de prover a companhia de controles capazes de mitigar ou mesmo impedir
que ocorressem tais fatos.
Ou:
- E agora, como nós vamos sair dessa?
Qualquer versão que se quiser dar
aos fatos, nenhuma delas será mesmo crível.
Bem, seja pela primeira estória ou
pela segunda é que eu, por covardia, desinteresse, desesperança sei lá, a cada
dia mais abdico de certos papeis e me apresento como pajem de meus netos.
É mais nobre e menos estressante.
Até breve.
Entendo . . .
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