Penso que o episódio de Paris, todo
ele, é mesmo emblemático.
Para além daquilo que contempla o
atentado e, na sequência, a captura dos assassinos, as manifestações recorde
contra as ações dos terroristas e até mesmo o debate se são apoiadas por todos
os muçulmanos há, em minha opinião, algo ainda mais relevante.
Os mecanismos civilizatórios estão
em agonia, a civilização se brutalizou de tal sorte que perdemos o controle dos
atos. Não posso imaginar se em outros tempos, mesmo os mais remotos, fomos tão
selvagens.
Há um gosto pelo sangue no ar.
Por todos os motivos, dos mais vis
e hediondos aos menos justificáveis e compreensíveis, dos conflitos bélicos às
revoluções sociais e étnicas, aos de trânsito nas grandes cidades do Terceiro
Mundo (Brasil, em especial), por um celular ou tênis, por uma paquera à mulher
alheia, por qualquer motivo, por qualquer razão, das mais torpes às mais
insignificantes, estamos matando dizimando semelhantes e cada morte a cada dia
torna-se mais banal.
Nenhuma perda significa.
A raça se mostra no contemporâneo incapaz
de temer algo que a ultrapassa e possa puni-la na exata dimensão de seus
feitos. Fosse eu afeto à religião, qualquer que fosse, desde a de Cristo,
Maomé, Buda ou outros ícones, diria que a falta deles ou a fanática presença
deles nos torna primitivos como nossos antepassados não o foram.
Quando temíamos aos raios e a
outros fenômenos da natureza, depois explicados pela nossa ciência da razão,
talvez não fossemos tão bestiais.
Triste constatação. Nem os horrores
da Primeira Grande Guerra ou da Segunda, nem o terrível Holocausto, nem o
Vietnam, nem todos os conflitos que você possa listar comigo agora têm a
dimensão do que se mostra no tempo presente.
A morte do negro nos EUA que pedia
ar, o assassinato dos dois policiais em seguida. O atropelamento intencional do
amante da namorada de um jovem que culminou também com a morte de uma senhora
inocente que dormia em sua casa. O assassinato do policial à jovem carioca.
Todo dia, a cada hora, selvageria
pura.
Para além das questões econômicas
se vamos ou não ter crescimento no futuro que implique em melhor distribuição
de renda com a expansão do capitalismo o que devemos debater é algo que tem
sido mais selvagem que a nossa ganância.
É nossos intestinos, nossa ira,
nossa animalidade insana.
O coração sofre diariamente ao tomar
contato com o que se passa. Falava aqui outro dia se eu deveria manter minhas
janelas abertas. Noninha ontem, de passagem para o teatrinho onde foi com sua
avó, entrou vestida de bruxa em meu escritório.
Até quando vamos conseguir fazê-la aprender
sobre o temor pela fantasia?
Quão cruel seremos com nossos
recém-chegados quando estivermos apresentando a eles a cena da cruel realidade?
Como dizer um basta ao grande
inimigo desconhecido que inocula sobre nós o gosto de sangue?
Como conter o crescimento da
barbárie e nos dar a chance de nos fazermos Humanos. Mesmo que retornemos à
época em que éramos tão ingênuos que temíamos o trovão, o raio, a natureza.
Talvez Alá, Deus, sei Lá mais Quem,
deveria começar tudo de novo.
Ou somos obra de Lucíferes?
Até breve.
Nenhum comentário:
Postar um comentário