terça-feira, 23 de dezembro de 2014

NATALidades



Em infância era diferente.

Algo se passaria ao longo da madrugada de 24 para 25. E para tanto semanas antes era necessário construir o presépio. Minha mãe tirava do armário, embalados e colocados cuidadosamente em caixas de papelão, os personagens.

O principal deles, o protagonista, só era colocado à zero hora do dia 25.

Parece que algo acontecia entre os membros da família. As desavenças, os mal- entendidos, as pendengas eram deixadas de lado e a casa revestia-se de algo que na época chamava perdão.

Já na manhã de 24 estávamos todos ansiosos pela chegada da noite quando nos reuníamos para a ceia, a Missa do Galo, a colocação de Menino Jesus na manjedoura. A ligação das luzes do presépio de três metros de largura por cinco de comprimento. Com seus riachinhos, seus animais e na medida em que o tempo passava a aproximação dos Três Reis Magos até o estábulo onde se dava a cena épica.

Exausto pela espera, com o coração batendo forte eu aguardava tenso a colocação pela minha mãe da imagem do menino Deus, não sem antes de ouvir todas as cantorias alusivas à noite e todas as rezas pertinentes.

O natal não foi para mim época de presentes, lembro-me de ter ganhado um carrinho-de-guia (foi feito pelo meu pai) e que eu dividi com Getúlio, meu irmão dois anos mais velho do que eu. Outros presentes se houveram não me lembro. Nem sequer uma bola de futebol, talvez.

Nos tempos presentes, Jesus perdeu para Papai Noel. A prece hoje é dirigida ao consumo, à troca eufórica de todo tipo de tranqueiras e a corrida é aos shoppings para visitar o big star, Sam Nicolaw.

Noninha tem medo de tirar retratos com o “velhinho de barbas brancas todo vestidinho de vermelho”. Será por quê?

Se quiserem saber, ilusão por ilusão, eu fico com aquela vivida na infância. Estava revestida de maior glamour e encenação, todos virávamos personagens de uma história com enredo e que culminava na esperança de melhores dias.

E tudo durava até o dia seis de janeiro, quando minha mãe, solenemente retirava o Menino Deus da manjedoura, colocava-o delicada e respeitosamente na caixinha e o guardava junto às demais imagens em um armário embutido da copa.

Sempre achei aquele armário algo de sagrado.

Hoje, sem ilusões, nem Jesus e nem Papai Noel fazem a minha cabeça. Os anos legaram-me um endurecimento de espírito e a perda de significados para a data.

De qualquer forma eu fico com a possibilidade do perdão, talvez como lenitivo. Perdoem-me, de público, todos com os quais de alguma maneira faltei ou que não tenha sido segundo a expectativa.

De minha parte, não há ninguém, felizmente, a perdoar.



Até breve.

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