“Tu estás longe do teu mundo, és uma alma estranha numa terra estranha,
tudo te é hostil e a solidão te pesa sobre os ombros como os milênios que
sentes sem saber explicar o que sentes. Porém, te movimentas na direção de
retorno, pois nada mais há para experimentares que realmente te atraia,
reconheces que por trás de todo o brilho e excitação que buscas espreita a
decepção. É nesse momento que experimentas o maior perigo, pois
inadvertidamente podes te acomodar no exílio e deixar de te movimentar na direção
do retorno ao teu lugar; admirando-te com tua capacidade de suportar a solidão
existencial te apaixonas pela sombra de todos teus erros e exageros. O anseio
de te libertar é maior, porém, e, ainda mais, o que fizeres para te libertar
contribuirá também para a libertação de teus semelhantes.”
Chovia.
Uma tarde qualquer de uma
quinta-feira, 13.
Rebuliço na rua, gente que corria,
carros em garrafas. Alaridos.
Em um bar, desses copos-sujos, dois
homens bebericavam amarelas e pingadas brancas. Em silêncio com os olhos
perdidos no movimento ali de fora.
Dois guardas da Polícia Militar na
porta de uma loja de tecidos.
Camelôs, homens-placa, vendedores
de bilhetes de loteria, escondiam-se da chuva debaixo de marquises.
Crianças se acotovelavam ao redor
da provável mãe. Um cão latia.
Poças d´água.
Uma barata enlouquecida buscava
safar-se entre pedestres na calçada.
Um homem gritava promoções da loja
de cosméticos.
Uma mulher retirara uma toalha de uma
sacola. Em seguida descalçara os sapatos encharcados, colocara-os dentro da sacola.
Com a toalha enxugara os pés. Retirara da sacola um par de sapatos secos e os
calçara. Fora para os fundos da calçada, bem protegida pela marquise.
A chuva apertava.
A enxurrada engrossava e invadia a
calçada.
A barata já não era mais vista.
Um dos homens do bar debruçou-se
colocando a cabeça, sobre as duas mãos, apoiada sobre a mesa. O outro recolhia garrafas
vazias de cerveja e copinhos de pinga.
Na porta de uma loja de tecidos já
não se viam dois guardas da Polícia Militar.
Camelôs, homens-placa, vendedores
de bilhetes de loteria, escondiam-se da chuva debaixo de marquises.
O cão fugira.
A mãe levara os meninos.
Pouco depois o homem que gritava
promoções fechara a loja de cosméticos.
A enxurrada fora aos poucos reduzindo
até tornar-se gotas que pendiam do leito da rua ao fundo de bueiros.
Secara.
Nenhum comentário:
Postar um comentário