No segundo semestre do ano passado
recebi um convite de instituição controladora de cooperativas de crédito com
sedes no interior norte e sul do estado do Espírito Santo para realizar treze
palestras por ocasião das assembleias de prestação de contas pelos
administradores aos associados.
De princípio relutei, pois seria
uma maratona de viagens de carro cobrindo treze cidades do norte ao sul do
estado. E, principalmente, por acontecer todas ao longo da segunda quinzena do
mês de março de 2014.
Eu teria que, portanto, sacrificar
minhas atividades cativas como avô já que Valentin estava previsto, como
aconteceu, para o início deste mês.
Muito bem, o fato é que acabei
aceitando e acertamos o contrato. As palestras seriam realizadas à noite em
cronograma a ser definido posteriormente. Toda a logística de viagens seria
responsabilidade da contratante.
Já falei a beça por este Brasil a
fora, dezenas de milhares de pessoas passaram a constituir meu patrimônio
pessoal. Estive em eventos do glamour e porte da HSM (no Anhembi-SP), quando falei junto com
consultores internacionais sobre Alianças Estratégicas, empurrado na época pela
experiência que adquiri por ocasião da coordenação de alianças entre 23
hospitais de alta complexidade de Belo Horizonte, 21 de Salvador e 20 do estado
do Paraná no início dos anos 2000. A minha indicação foi feita pelo Hospital
Sírio Libanês onde eu contribuía, na época, com o Planejamento Estratégico de
um dos maiores hospitais da América Latina.
Estive ainda em dezenas de eventos
com altos executivos de empresas transnacionais de diferentes segmentos da
economia, porte, portfólio e mercados. Coordenei inúmeros debates com CEOs e Presidente
de Conselhos em grupos restritos de 12 executivos/acionistas sobre tendências
sociais, econômicas e políticas nacionais e internacionais.
Dei aulas em dezenas de programas
de MBAs e no âmbito interno das empresas, quando estive vinculado a instituições de renome no mundo
corporativo.
Enfim, rodei bolsinha pacas.
Agora me vejo aqui enfrentando
vai-daqui-prá-acolá em estradas nem sempre seguras falando para públicos de 350
a 2200 pessoas, cada. Estou me sentindo como Gonzagão: “Minha vida é andar por
este país...”.
E, confesso: estou profundamente satisfeito apesar de morrendo de saudades de Noninha e sem saber da exata medida
com que cresce e se mostra Valentin.
Estou maravilhado com as paisagens
do norte capixaba com suas monumentais configurações rochosas, seu verde
monumental e suas produções extraordinárias de café, mamão, cana, granitos,
mármores e quetais. A natureza aqui é mesmo exuberante.
O que mais tem me agradado, ainda, é o
contato com as pessoas que participam das assembleias. Os associados levam seus
familiares, inclusive crianças e têm o maior respeito com a solenidade. Estou
falando para grupos heterogêneos de diferentes idades, cultura e formação
escolar convencional. Estou falando à crianças, idosos, autoridades locais, empresários, lavradores, produtores rurais, comerciantes.
Depois da palestra é servido um
jantar de confraternização e a turma se acha. Chiquice para pessoas que moram
em rincões, perdidos no nada tocando suas lavouras, suas pedreiras, seus cafés
e mamões de exportação.
Juntos, perto de 50 mil destes associados,
construíram em 2013 mais de R$1,0 bi em operações financeiras.
Hoje à noite realizo a sétima do
ciclo de treze palestras. Durante o jantar que é servido procuro me aproximar
das pessoas e me emociono com suas histórias, suas heranças, sua labuta.
Histórias como a de um lavrador de 87
anos que ao lhe perguntar porque estava ali ele me respondeu: “Gosto muito de prestar
contas.” E alguém veio ao meu ouvido confidenciar que eu estava na presença de
um dos homens mais ricos do estado. Suas mãos escalavradas pelo trabalho
agrário me tocavam enquanto ele falava no seu linguajar maravilhosamente
matuto.
- Dia desse tive que comprar duas
dessas camionete e fui com meu filho, aquele ali óia lá, vem aqui cumprimentar
o moço da falatória, menino... Aí nós fomo em Vitória, o senhor conhece lá? Cidade grande...
- Morei lá um ano.
- Pois é... Aí quando eu cheguei na
loja dos carro, eu só ando desse jeito aqui ó, com minha sandalinha de dedo e a
única pessoa que me cumprimentô foi a mocinha que fazia a limpeza da loja.
Quando cheguei perto do sujeito da venda ele me tratô esquisito e aí eu pedi
prá falar com o dono, ele falou que o dono num ia lá e que eu podia falar com o
gerente. Cheguei pro cara e disse: eu quero levar duas daquelas ali agora e eu
pago à vista, só que num quero que você fique com a comissão. Eu só saio daqui
com as duas camionete raiolux se o senhor aceitar de pagar a comissão prá
aquela mocinha ali.
Ainda há gente que acha que quem está verdadeiramente produzindo o PIB vai ao Anhembi.
Eu não relutarei se as outras 541
cooperativas de crédito existentes no país me convidarem para as suas assembleias.
Até breve.