ALGUMAS, POUCAS, DAS OCORRÊNCIAS
DOS ÚLTIMOS DIAS (*):
1ª. O corpo da menina Íris Cardoso,
8, morta a facadas em Mococa (262 km de São Paulo), foi achado com roupas
limpas e sem marcas de sangue. Para a polícia, quem a matou limpou o corpo e
trocou a roupa da garota antes de jogá-lo em um terreno. Mãe e padrasto estão
presos.
2ª. "Tem que ajeitar o
foco", diz um preso a um colega que acabara de ligar a câmera do celular
em meio a um grupo de detentos rebelados. Vencida a discussão técnica, o que se
segue é um documento explícito do horror praticado no complexo de Pedrinhas, em
São Luís, no Maranhão, onde 62 presos foram mortos desde o ano passado. São
dois minutos e 32 segundos em que os próprios amotinados filmam em detalhes
três rivais decapitados. E se divertem exibindo os corpos - ou o que restam
deles.
3ª. Um homem foi preso suspeito de
matar a facadas a noiva, no Jardim Oratório, em Mauá (Grande São Paulo), na
noite de segunda-feira (6).O corpo de Janaína da Silva Evangelista, 25, foi
encontrado pelo pai enrolado em um cobertor embaixo da cama da casa onde ela
morava na travessa Itaparica.
4ª. Internada com queimaduras no
corpo após ataque a ônibus em São Luís (MA) na semana passada, a mulher de 22
anos que perdeu uma filha no atentado implorou aos criminosos para que
poupassem as crianças. "Ela gritava para que ele não jogasse combustível
nas meninas, mas não adiantou", disse Jorgiana Carvalho, 25, tia de Ana
Clara Santos Sousa, 6, que morreu nesta segunda-feira (6) em decorrência de
queimaduras por todo o corpo.
Perdoem-me, mas faço registro. Algo
se passa e é de todo grave. Não se trata apenas da barbárie em si, mas,
sobretudo, da sua frequência diária. Nossos olhos, corações e mentes não podem
continuar alheios.
Sei que de novo apenas denuncio.
Deveria ir fazer parte das manifestações pelo esgotamento destes episódios,
solidarizar-me com os mais próximos dos familiares das vítimas, agir de alguma
maneira e não ficar a todo o momento apontando massacres.
Sim, seria mais digno.
Ou então ocupar-me de meus pensares
outros, até cômicos, ou minhas absurdas narrativas de um cotidiano sem graça,
ou de meus diálogos com Valentin e antes com Noninha.
Comentar filmes diversos que estão
aí para quem quiser vê-los. Escrever ficções ainda que respaldadas naquelas
crueldades expostas pela desnuda realidade.
Alienar-me e gozar a vida, mais
íntima, que é sem reparos.
Ocorre que minha péssima memória
ainda registra algo de Trotski: “Devemos dar um fim, de uma vez por todas, à
fábula acerca do caráter sagrado da vida humana".
E me desespero.
Até breve.
(*) Publicadas no jornal Folha de
São Paulo, edição de hoje.
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