quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

ÍCONE



Korea (médico obstetra de Pretinha), com a calma que lhe é peculiar, fazia o exame de ultrassom e tecia comentários sobre o que via até que: “É menina!” Pretinha havia me deixado um convite para estar junto com ela durante o exame. Era o dia 27 de fevereiro de 2012.

Exatos doze meses ou um ano atrás eu recebi um dos presentes mais expressivos de toda minha vida: a constatação “in loco” que eu seria avô de uma menina. Naquele dia eu estava completando meus sessenta anos de idade.

Noninha passou a ser minha musa inspiradora mesmo antes de nos chegar em 01 de agosto. Alguns acham inclusive que tanta menção à minha netinha não passa de pura tolice. Escrever histórias absurdas com alguém que sequer havia nascido, voar de balão, estacionar para dormir na lua e tantas outras viagens.

Há, no entanto, aqueles que acompanham com interesse minhas nuances colocando Noninha como um ícone: o futuro. Paralelo com o que se passa, denúncia explícita das inúmeras barbaridades da nova época.

De fato os dias têm me deixado com as peles mais grossas. A da alma e a do corpo estão menos permeáveis a deslumbramentos de qualquer natureza, o que de certa forma me entristece sobremaneira.

Esta mudança de época que estamos presenciando, fundada na decadência abissal das instituições que foram moldadas durante centenas e centenas de anos, me assusta e me enrijece o espírito.

Eu deveria estar cuidando dos meus afazeres mais imediatos, das minhas questiúnculas do dia-a-dia, da busca frenética e incessante do vil metal para manter meus trens e aparências. E não estar “sofrendo” por Sírias distantes porque ali mais de cem vidas por dia estão sendo eliminadas e refugiados estão cavando grutas nas encostas de montanhas para esconderem-se de bombardeios.

Eu não tenho nada que ficar ocupado com o afastamento do representante simbólico da figura do Cristo, e não ligar a mínima para o desmoronamento grotesco de Algo que mudou a contagem do tempo ocidental.

Eu não deveria estar preocupado com Itálias disputadas por máfias berlusconianas ou por comediantes, fazendo do Estado pilhéria. Assim na França, no Egito, na Grécia e, por que não dizer também, do lamentável glamour de Michele ao saborear um recado ao Irã inimigo. Argo!  Arrrqqq!!!...

Eu não deveria ainda me ocupar com nosso lugar. Nas caminhadas matinais, entre as sete e oito horas da manhã, observo as pessoas disputando em frenesi vagas para estacionarem seus carros. É trágico. Sinal do esfacelamento da urbanidade.

Ao completar hoje meus sessenta e um anos de idade eu estou certo que devo seguir meu trote solitário.

Vou continuar com minhas toLizes.


Até breve.

Nenhum comentário:

Postar um comentário