Assistimos ontem à De Coração Aberto, com
Juliette Binoche e Edgar Ramirez.
Eric Nepomuceno entrevistador no programa do
Canal Brasil Sangue Latino sempre indaga aos seus convidados qual a função da
arte, ou para que serve a arte. Em um destes programas, por exemplo, Ney
Matogrosso respondeu que a arte teria o salvado da loucura. Não fosse o palco,
onde ele extravasa todo o seu drama, ele estaria louco.
Mila e Javier são jovens, casados há dez anos. Experimentam
uma relação intensa, transam o tempo todo, riem muito, fazem piadas, visitam
lugares proibidos de madrugada e esbaldam-se em festas com amigos.
Até quê.
Javier tem o seu quadro de alcoolismo intensificado
e é denunciado à direção do hospital onde trabalha. Mila descobre que está
grávida. Ambos são cirurgiões cardíacos, trabalham em plantões o que implica em
alto nível de stress.
É dramática a perspectiva de ser para o outro, saí
do cinema com esse incômodo. Por mais rica, alegre, intensa que seja a relação
em algum momento vem à tona o limite. Ninguém consegue suportar o drama alheio,
do amor ao ódio e depois ao amor e ao ódio e depois ao ódio e ao amor, e ao ódio,
ainda. E ao amor.
Sempre o outro surpreenderá com suas origens e
seus quereres, suas fragilidades, sua agressividade, seu segredo, sua
impertinência e até crueldade. O drama é que o outro só é na perspectiva da
construção conjunta, para os projetos com partilhados, a minha
parte com a parte do outro. O outro só é no com (a)flito.
Javier desaba sob sua descendência trágica de pai
e mãe alcoólatras. Mila não quer a gravidez por força do que aspira ainda em
sua promissora carreira. Javier não faz nada para conter seu vício e ela decide
abortar, em que pese ser o grande sonho de Javier ser pai.
Até quê.
Decidem abandonar tudo e irem para a terra natal
de Javier, Iguassu, na Argentina. Mila tem a gravidez complicada e recebe da
médica recomendação para que aguarde o parto. Javier não suporta.
A arte tem sim uma função transformadora. O
esforço de diretora e montador do filme para narrar o drama em De Coração
Aberto é extraordinário. As cenas dão a exata dimensão de alegria e dor e,
carregadas de simbolismo nos remetem a uma profunda reflexão do que é ser para
o outro.
Para registro: o declínio físico, psíquico e
emocional de Javier nas cenas em que ele demole paredes do apartamento e Mila,
já com quase nove meses de gravidez, retira dois sacos dos entulhos, carregando
ao longo das escadas do prédio.
A arte além de nos salvar da loucura nos ajuda a
ampliar nossa lucidez.
Este post talvez faça algum sentido para quem já
assistiu ao filme e quer ter a pretensão de recomendá-lo para aqueles que ainda
não tiveram a oportunidade.
Até breve.
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