quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

3,14...


Lydia, em seu comentário editado no post LENTE sugere que eu assista a “As aventuras de PI” e, fazendo alusão ao meu texto, classifica o filme como de ESTRUTURA E FACHADA.

O filme é do diretor taiwanês Ang Lee que dirigiu, entre outros: A arte de viver; Banquete de casamento; Comer, beber e viver; Razão e sensibilidade; Tempestade de gelo; O clã das adagas voadoras; O tigre o e dragão (Oscar de melhor filme estrangeiro) e O segredo de Brokeback Mountain (Oscar de melhor diretor).

Não é pouca coisa, portanto.

O filme tem fachada extraordinária pela utilização de recursos computacionais que nos levam ao deslumbramento com paisagens exuberantes e cenas surpreendentes, prendendo a atenção do expectador. Provavelmente mais de oitenta por cento da edição final contemple a utilização de imagens produzidas em computador, o que enriquece a obra enquanto cinema.

O filme tem estrutura montada, portanto, por um asiático que vive nos USA desde 1978 e, assim suponho, marcado também pela lente americana de encarar a vida. A lente é objetiva, difere da lente européia, mais existencial.

A questão central abordada no filme, me parece, diz respeito à luta do Homem pela sua sobrevivência e criação de identidade, incluída aí a existência ou não de Deus como “responsável” pelos nossos desígnios.

A primeira meia-hora do filme narra as dificuldades enfrentadas pelo protagonista quando criança/adolescente na escola por força de seu nome PISCINE, daí Pi e sua relação com os pais e irmão diante de sua procura religiosa.

Na escola, cansado de ser ridicularizado, ele reage buscando alternativas para explicar o que vem a ser Pi, o diminutivo de seu nome. Duas ou três cenas cuidam dessa passagem e dão encaminhamento à trama.

Em casa, à mesa do jantar, ao fazer oração antes da refeição é questionado pelo pai e pelo irmão sobre a sua opção religiosa. Pi já havia procurado em Khrisna, Cristo e Alá aquele que mais se aproximasse da sua idéia procurada de Deus.

Depois dessa primeira meia-hora, o filme apresenta o naufrágio, que ocorre na parte mais profunda das águas do Pacífico, e a partir daí a luta pela sobrevivência de Pi em uma balsa, acompanhado por um tigre, uma zebra, uma hiena e um orangotango também sobreviventes do naufrágio e que pertenciam ao zoológico dos pais na Índia e estavam sendo transportados para o Canadá onde a família procuraria melhor sorte.

As cenas finais, especialmente aquelas protagonizadas pó um Pi já adulto, propõem ao expectador a questão central da trama.

Posso caminhar por uma interpretação singela. Penso que o diminutivo do nome atribuído ao protagonista quer sinalizar quão amplo são os meandros para a busca de nossa identidade e a nossa crença ou não da existência de Deus.

Desde a Antiguidade, foram encontradas várias aproximações para o cálculo da área do círculo. Pi é um número irracional e transcendente, de forma que os métodos de cálculo sempre envolvem aproximações, aproximações sucessivas e/ou séries infinitas de somas, multiplicações e divisões. Um engenheiro japonês e um estudante americano de ciências da computação calcularam, usando um computador com 12 núcleos físicos, cinco trilhões de dígitos, o equivalente a 6 terabytes de dados.

Há no filme uma cena, em que Pi está na escola e vários alunos o vê escrever no quadro negro parte das dízimas que constituem o número Pi, cuja versão mais reduzida contempla 52 casas decimais.  

É. O círculo de nascimento, vida e morte nos remete a inúmeras aproximações, aproximações sucessivas e/ou série infinita de somas, multiplicações e divisões. É do protagonista a assertiva de que “A fé é uma casa de muitos quartos” e eu complementaria: e de inúmeros outros cômodos alguns desconhecidos ou sequer visitados.

Fiquei também com outra fala do protagonista: “A dúvida é útil”.

A procura do sentido da vida e da nossa transcendência é uma aventura real alucinante. Quero curti-la à exaustão.


Até breve. 

2 comentários:

  1. É isso aí, mestre! Ang Lee sabe mesmo tudo de cinema! Quantas vezes nos perguntamos, que nem PI: por que estou passando por isso? quem está me pondo à prova? será que não chega? nadando, nadando, e nada da praia! E aí, vem a resposta... São mesmo sucessivas aproximações! Afinal, o que é essa nossa vida? Cada vez mais quartos a serem visitados... Cômodos ainda não descobertos... Beleza, mestre! Fecha o pano!
    Bjs
    Lydia

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