quinta-feira, 18 de outubro de 2012

ALMA I




“A beleza é tudo aquilo que você não dá conta de ver sozinho. Quando você encontra uma coisa muito bonita, você fala assim: o fulano devia ver isso. Você vê um por de sol muito bonito, você fala: fulana podia estar aqui comigo para ver isso. Você assiste a um filme e sai dizendo que fulano que deveria ver isso. A beleza não cabe em nós. A beleza é profundamente triste quando estamos sozinhos. A gente não dá conta dela. Ela pesa muito. Então você tem que passá-la para alguém.”

Estas são palavras extraídas de Bartolomeu e traduzem o meu encanto pela descoberta.

“Devemos todo o desenvolvimento do mundo à fantasia. A educação não pode se prender somente ao que já foi feito. A educação deve abrir também uma porta para que o sujeito possa fantasiar o futuro e dar corpo a esta fantasia. A literatura deve assumir o lugar da transformação e não só da informação.”

“A gente só suporta o dia de hoje porque temos uma perspectiva do amanhã. O futuro está no campo da fantasia. Não há como viver sem fantasia. Quando você lê você dialoga com a fantasia do escritor. O fenômeno literário, então, é a fantasia do escritor dialogando com a fantasia do leitor e construindo uma terceira obra que jamais será escrita.”

“A literatura concorre para uma sociedade mais harmoniosa, porque pelo texto literário você percebe que o mundo vai além de você. Você aprende com o texto literário a democratizar a razão.”

“Democratizar a razão é saber que o outro também tem razão, a razão não é sua. A minha razão depende da razão do outro. Na medida em que a literatura me traz um outro olhar sobre o mesmo mundo em que eu estou ela me faz mais atencioso, mais cuidadoso, eu escuto melhor porque ler é escutar.”

“Meu avô me ensinou que com as 26 letras do alfabeto eu podia escrever tudo que eu quisesse. Eu achava muito pouca letra para escrever tudo. Então eu estava sempre pensando em escrever uma palavra que eu não desse conta de escrever. A palavra nunca escreve tudo que a emoção sente.”

Este avô teria sido elemento impulsionador para a veia literária do menino Bartolomeu. O velho ganhou a sorte grande na loteria e resolveu nunca mais fazer nada na vida. Comprou uma casa enorme e resolveu escrever pelas paredes da casa. Escrevia sobre tudo: visitas, acontecimentos, lembretes e até coisas impróprias para crianças. Estas eram escritas nas partes mais altas das paredes, dificultando o acesso para que as crianças pudessem ler. Bartolomeu usava todo tipo de móvel para conseguir alcançar os escritos “cabeludos” do avô.

Da mesma forma Bartolomeu foi nutrido por uma de suas avós. Ela usava saias longas e rodadas. À noite, ele conta em entrevista, ela colocava o penico encima da cama, sentava sobre o mesmo, rodava sua saia cobrindo toda a cena e chamava os netos para contar-lhes histórias. Duplo prazer e necessidade.

“Minha mãe morreu muito cedo, morreu de câncer. Ela tinha uma voz muito bonita e quando a dor do câncer era muito grande e ela não estava suportando, ela se sentava na cama e cantava maravilhosamente bem, então a gente sabia que a dor era muita. A voz atravessava a casa inteira, atravessava o quintal e a gente sabia que estava doendo muito. Então eu acho que a minha mãe está presente na minha literatura, porque quando a dor é muita, eu escrevo.”

Não deu prá ler ou ouvir sozinho e ficar só prá mim.


Até breve.

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