Ontem, quando saia do auditório
onde havia acabado de dar a aula inaugural em uma faculdade de BH, um jovem veio
me parabenizar e me pedir uma opinião.
- Meu pai está com cinqüenta anos e vive uma depressão profunda... Ele é
fotógrafo, apaixonado pelo que faz, mas o mercado está péssimo e ele não
consegue trabalho que lhe permita pagar as contas. O que eu faço?
Pai. Cinquenta anos. Depressão.
Apaixonado. Mercado. Trabalho. Contas.
Durante os últimos dois dias inteiros
eu estive em reunião com a direção de uma empresa que vive um momento delicado
de caixa.
Empresa. Direção. Caixa.
Agora à noite, recebi mensagem de
Pretinha com fotos de Liz.
Pretinha. Liz.
Desde domingo estou vivendo uma
fragilidade física, uma disenteria aguda.
Disenteria.
Legal a gente ir levando o
cotidiano e pinçando dele palavras que o narrem. Assim, mesmo, feio desse
jeito: “o narrem”.
O mercado em depressão tem
proporcionado uma disenteria de contas exigindo da direção da empresa um
intenso trabalho de Caixa.
O pai de Pretinha, apaixonado, se
delícia com as fotos de Liz.
O pai é quem exerce a direção da
empresa. Foi acometido de uma tremenda disenteria quando tomou contato com as
contas. Em cinqüenta anos ele nunca havia experimentado uma situação tão
crítica de caixa. Como a ele, o mercado tem levado muitos à depressão.
Apaixonado o avô de Liz se diverte
com o trabalho de acessar as mensagens enviadas por Pretinha.
Liz tem dado um imenso trabalho
para Pretinha.
Um trabalho apaixonado de um pai,
quase em depressão, levou a direção de uma empresa a agitar o mercado pela
decisão inédita tomada em reunião colegiada: durante os próximos cinqüenta anos
as contas desse pai serão integralmente custeadas pelo caixa da empresa.
Você vê como as palavras podem
tudo? Dê tratos à bola aí e construa tantas quantas forem narrativas a partir
de palavras pinçadas deste texto.
De minha parte somente é verdade até
disenteria.
Até breve.
Nenhum comentário:
Postar um comentário