Marisa Albuquerque sempre foi desse
jeito. Ninguém, nem mesmo os mais próximos, tinham por ela alguma simpatia. O
marido e os dois filhos a toleravam por força de circunstâncias.
Até que um dia, em um ônibus
urbano, ela conheceu Antônio de Souza, um guarda noturno.
Ela voltava para casa após o
trabalho e ele, amavelmente, cedeu a ela a passagem na entrada do coletivo.
Marisa não agradeceu a gentileza e nem sequer olhou para Antônio.
Já dentro do ônibus um rapazinho
levantou-se da poltrona e cedeu o lugar para Marisa. Da mesma forma ela não
agradeceu e sequer olhou para o gentil rapazinho. Antônio, de pé, um pouco
atrás do lugar onde Marisa havia assentado viu quando uma senhora puxou
conversa com Marisa e ela sequer olhou para o lado, deixando a mulher
constrangida.
Quando Marisa preparou-se para
descer do ônibus, Antônio passou à sua frente e colocou-se próximo à porta de
saída. Marisa descia o primeiro degrau quando Antônio colocou o pé na sua
frente e ela precipitou-se ônibus a baixo, estatelando-se na calçada.
O rapazinho que havia cedido o seu
lugar e a senhora que havia puxado a conversa exclamaram em uníssono:
- Bem feito!
Antônio desceu e:
- A senhora se machucou?
- Você me calçou, seu merda!
- A senhora que tropeçou no meu
pé...
- Foi você que me derrubou.
Antônio pegou pelo braço de Marisa
para ajudá-la a se levantar.
- Me larga... Eu me levanto
sozinha...
Antônio disse às pessoas que se
aglomeraram no momento da queda que ele cuidaria da acidentada e ao motorista
do ônibus que ele poderia seguir viagem. Uma senhora saiu da casa onde morava,
em frente ao ocorrido, com uma bolsa de primeiros socorros e convidou Marisa
para entrar. Antônio de Souza acompanhou-as apesar dos protestos de Marisa.
- Vou levar você até a sua casa...
- Não preciso que ninguém me
acompanhe...
Feita a limpeza dos ferimentos e
curativos nas escoriações nos braços e pernas, Marisa deixou a casa sem sequer
agradecer a mulher que havia lhe socorrido. Quando passavam pelo portão a
senhora comentou com Antônio:
- Que mulher mais mal agradecida...
Quando começavam a caminhar:
- Não quero que você me acompanhe.
- Por que você é assim?
- Vá à merda!
- Em que rua você mora?
- Não te interessa!
Assim foi até que Marisa ligou seu
celular.
- Jurandir?
- O que é, mulher?
- Tem um homem me seguindo...
- E daí?
- Daí que ele não larga de mim...
- Onde você está?
- Perto de casa, na Rua do Ouvidor,
perto da padaria...
- Entra na padaria e me espere lá
dentro.
- Tá bom.
Assim ela fez e Antônio resolveu
não acompanhá-la a partir dali. Antônio a viu seguir e sequer voltar o olhar
quando virou em uma esquina.
Na noite do ocorrido ela não
conseguiu dormir. Debateu-se na cama sem conseguir tirar o rosto de Antônio da
memória. Ela tinha certeza de que fora ele que deixara o pé de tal maneira que
ela tropeçasse e caísse.
Nos dias seguintes Marisa de
Albuquerque pegou o ônibus na expectativa de rever Antônio de Souza. Por
diversas vezes chegou mais cedo no ponto e aguardou mais do que de costume para
ver se ele apareceria.
Nunca mais o viu.
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