Dois eventos ligados ao processo de
julgamento do “Mensalão” merecem nossa atenção: o manifesto de intelectuais e
artistas endereçado aos Ministros do STF e a carta enviada a amigos pela
Presidente do Banco Rural uma das rés arroladas no processo.
O manifesto:
“Carta
Aberta ao Povo Brasileiro
Desde o dia 2 de agosto o Supremo
Tribunal Federal julga a ação penal 470, também conhecida como processo do
mensalão. Parte da cobertura na mídia e até mesmo reações públicas que atribuem
aos ministros o papel de heróis nos causam preocupação.
Somos contra a transformação do
julgamento em espetáculo, sob o risco de se exigir --e alcançar-- condenações
por uma falsa e forçada exemplaridade. Repudiamos o linchamento público e
defendemos a presunção da inocência.
A defesa da legalidade é primordial.
Nós, abaixo assinados, confiamos que os Senhores Ministros, membros do Supremo
Tribunal Federal, saberão conduzir esse julgamento até o fim sob o crivo do
contraditório e à luz suprema da Constituição.”
A carta:
“Caros
amigos,
A
semana passada estive muito mal. O cansaço e a desesperança se abateram sobre
mim. Sei do risco que corro e é claro que sinto medo. Mas descobri que não é o
medo que me derruba. Nesses últimos quase dez anos, desde a morte do Zé
Augusto, vivi momentos terríveis.
Por
muitas vezes me deixei abater, não por covardia, mas por temer que tudo o que
eu fizesse, e por mais que me esforçasse para fazer o certo, fosse insuficiente
perante as situações que a vida me trazia. Essa sensação de impotência é que
nos faz perder a razão de viver. Sim, porque ninguém, em sã consciência, pode
querer viver só por "diversão". A vida é dura demais...
Mas
Deus é bom e nunca nos abandona. Frases de consolo e apoio como as de vocês,
chegam a mim a toda hora e recarregam as baterias da fé.
O
sentimento de injustiça dói demais, e nessa vida não temos a escolha de sermos
ou não injustiçados. Temos, porém, o livre-arbítrio que nos permite a escolha
de sermos ou não injustos... E cada um é obrigado a conviver com a consciência
de seus atos. Lá no fundo, cada um de nós sabe o que fez e o que não fez... Por
isso estou em paz.
Nos
piores momentos do banco em 2004 e 2005, fiquei em desespero. Passei pelas
mortes da minha irmã, do Zé Augusto, e finalmente a morte do meu pai, que
sinceramente não tive como chorar, pois aconteceu entre as crises do Banco
Santos e do mensalão. O pior de tudo foi o pânico que eu tinha de causar
prejuízo a quem confiou em mim.
Felizmente,
pude honrar todos os compromissos assumidos, e o banco seguiu em frente. As
pessoas que se foram continuam presentes em nossas vidas através do nosso amor
e dos princípios e valores que nos ensinaram.
Sofro
muito pelos meus colegas. Sei o quanto é absurdo eles serem envolvidos nessa
história, mas a verdade às vezes é inconveniente...
Apesar
disso, temos que ser fortes e continuar lutando pelo que sabemos ser o certo.
Obrigada
por todas as orações e pelo carinho que tenho recebido.
Abraços,
Kátia.”
A mim não importa muito o desfecho
do julgamento em si, mas o que dele resultará. Suponhamos que todos os
sentenciados sejam levados para a cadeia e lá permaneçam pelo tempo previsto em
suas penas. Caso a resultante se restrinja a comemorações de desafetos ou a dor
para os familiares e amigos dos sentenciados não terá valido muito ao
essencial.
Qual essencial?
Eu entendo que a conduta deriva da
consciência de quem pratica cada ato. Essa consciência pode ser norteada “POR
DEVER” ou “CONFORME O DEVER”. Por dever é ato de consciência pura. Conforme o
dever é ato por força de sanções que, aquele que o pratica, possa vir a receber
por força de lei, convenção ou qualquer outra disposição coletiva.
Eu não mato por que tenho a
consciência de que não devo (por dever)? Ou não mato porque tenho consciência
de que existe uma lei que me colocará atrás das grades (conforme o dever)?
No essencial espero que o resultado
deste julgamento amplie o nível de nossa consciência. Que se amplie o receio da
prática de atos criminosos pela aplicabilidade de fato dos dispositivos legais
e penais.
No fundo, eu espero mais, que se
amplie a consciência do dever pelo dever algo parecido como aquilo que hoje,
quando manifestava seu voto, a Ministra Carmem Lúcia declarou:
“Ética é a única forma de se viver em sociedade.”
Até breve.
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