terça-feira, 7 de agosto de 2012

PULSAR



Não sei se ocorre com todo aquele que escreve.

Às vezes me vejo como um personagem do meu próprio autor. Ou seja: tem momento que eu sinto a sensação de estar servindo a um enredo.

Agora, por exemplo.

Na verdade não só agora, mas nos últimos doze ou quinze meses. Talvez a partir do momento em que eu entrei na contagem para completar meus sessenta anos.

A vida convencional, linear, repetitiva deu lugar a um processo que me é estranho, ainda que prazeroso. Mas estranho. Sinto que saí um pouco de uma ordenação, que é estruturante. Lé, meu mais velho, é que às vezes me aponta. Não que cobre, mas denuncia um distanciamento da vida como é de certo para ser vivida.

- “Vai trabalhar hoje não, pai? Tem uma vaga na VBA (nome da minha empresa)?”

Nunca me orientei pelo pragmatismo, intuição sempre foi minha bússola. Agora mais do que por intuição eu me coloco a serviço de um enredo.

Um homem na entrada da sessenteidade resolve entender a vida. Sem grandes devaneios filosóficos, religiosos ou morais. Quer apenas não alimentar-se do tempo sem sentir gosto, e olha para tudo com uma calma analítica. Escuta e vê, repara com zelo. Quer tirar de cada instante algo que verdadeiramente signifique.

Até mesmo em sua prática laboral, se observa como em uma cena. Talvez seja isto mesmo: ali como espectador atento do desenrolar de seus dias.

Encontra com pessoas, especialmente nos últimos dias, e sente cada uma delas como se elas tivessem sido passadas a limpo para se apresentarem.

Até para a sua filha, que descobre guerreira através de horas a fio no drama das dores do parto. Em nenhum momento ele a vê reclamar pelo sofrimento, antes pelo contrário. Ele sente que, para ela, aquele momento faz parte da alegria. Ele registra numa folha de papel os intervalos de tempo em que vêem e duram as contrações, ao longo de quase cinco horas.

Já no corredor que dá acesso ao Bloco Cirúrgico da maternidade anda de um lado para outro, sozinho, com a mente e o coração turbulentos. Ouve gritos vindos do interior do Bloco e sabe que são de sua filha.

- “Quantas parturientes estão agora no Bloco?” Pergunta a uma enfermeira que lhe cruza o caminho no corredor.

- “Uma.”

Pensa em entrar Bloco adentro, mas desiste até que não ouve mais os gritos vésperos da alegria.

- “Ela vai passar por aqui?” Pergunta à outra enfermeira.

- “Não. A neném vai lá para o berçário... É logo ali...”

Ele se dirige para a ante-sala separada por uma chapa de vidro e vê, no interior do berçário, sua esposa e seu genro acompanhando a enfermeira que coloca sua netinha numa incubadora. De lá de fora, através de gestos com as mãos, consulta se tudo está bem.

Ele está absolutamente certo de que viveu integralmente o dia 01 de agosto de 2012, desde o seu despertar até o momento em que desabou sobre sua cama para dormir o sono dos coadjuvantes.





Até breve.

2 comentários:

  1. Nossa agenda já está reservada para os proximos anos ...1°de agosto ..tem aniversário da Liz !!

    bjos, liz e roger

    ResponderExcluir
  2. É ,a natureza é sublime e aqueles que desejam a maternidade sabem que a doação para esse desfrute é desde a concepção. Vá, minha irmã, tem deslumbrado a todos pela paciência e pela dedicação.. A tranquilidade e o amor que transmite a todo momento.Estou muito orgulhosa e atenta a todas as dicas.Junto com a Liz, nasceu uma super mãe.

    ResponderExcluir