domingo, 29 de julho de 2012

REAL



Quinta-feira, no início da noite, estava tomando uma cerveja com um amigo que havia me pedido para ajudá-lo a refletir sobre os seus negócios. O bar fica em rua de um bairro residencial de pouco movimento tanto de pedestres quanto de automóveis.

Meu celular, que guardo dentro de bolso de minha calça, tocou e eu atendi. Terminada a ligação coloquei o aparelho sobre a mesa e voltei à conversa com o amigo. Dois ou três minutos depois se aproximou um rapaz e, sem que eu pudesse oferecer qualquer reação, pegou o celular e saiu correndo pela rua.

- Vovô.

- Oi, Liz.

- Você tem medo da Cuca?

- Tenho.

- E do Bicho-papão?

- Tenho.

- E da Mula-sem-cabeça?

- Tenho.

- E do Homem do Saco?

- Tenho.

- E do Boi-da-cara-preta?

- Tenho.

- Vovô, você é muito medroso.

- Por que? Você não tem medo deles não, Liz?

- No princípio eu até tinha...

- E agora não, por quê?

- Porque eles não são de verdade, né vovô?

- Quem te falou que eles não são de verdade, Liz?

- Você.

- Eu?! Eu nunca te falei que eles não são de verdade, Liz.

- Não, vovô, mas é que toda vez que você fala deles é sempre igual quando você me conta suas histórias.

- Você acha então que eles são de histórias?

- São.

- E você não tem medo deles?

- Não. Eu tenho medo é de... Ah, vovô, eu não sei. Quando eu saio com a mamãe eu vejo ela tão preocupada com os vidros do carro, pede prá eu entrar correndo dentro de casa, para eu não conversar com ninguém na rua...

- Ela tem razão, Liz.

- Ela tem medo de que, vovô?

- De pessoas...

- De pessoas? Que pessoas, vovô?

- Pessoas que podem nos fazer algum mal.

- Mal, vovô? A nós? Mas não fazemos mal a ninguém...

- Pois é, Liz.

- Mas por que é que tem essas pessoas, vovô?

- Porque...

- Fala, vovô, por quê?

- Liz...

- Por que tem pessoas que podem querer fazer mal prá nós, vovô?



Até breve.




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