Ela recebeu emprestado um livro de uma amiga quando esta
soube da nossa viagem à Turquia: Istambul,
Memória e Cidade de Orhan Pamuk.(*)
Eu devorei as quatrocentas páginas desse livro nos últimos
três dias.
Meu interesse inicial era o de colher informações prévias
sobre o que deveremos encontrar: dicas, peculiaridades, pontos relevantes a
conhecer, monumentos, história, enfim.
Só que:
“Você é orgulhoso
demais, meu filho, disse a minha mãe. Mas eu gosto que você seja assim. Porque
a coisa mais importante da vida não é essa bobajada de arte, mas o orgulho. Há
muita gente na Europa que se torna artista porque é orgulhosa e honrada. Na
Europa eles não vêem o artista como um mercador ou um batedor de carteiras,
eles tratam os artistas como pessoas especiais. Mas você acha mesmo que pode
ser artista num país como o nosso e ainda conservar o seu orgulho? Para ser
aceito pelas pessoas daqui, que não entendem nada de arte, para fazer essas
pessoas comprarem as suas obras, você precisaria se submeter ao Estado, aos
ricos e, o pior de tudo, aos jornalistas semiletrados. Você acha que iria
conseguir?”
(pag.380)
Ou:
“Aqui não é Paris,
sabia, é Istambul. Mesmo que você fosse o melhor artista do mundo, ninguém lhe
daria a menor atenção. Você iria passar a vida toda sozinho. Ninguém jamais
iria entender por que você abriu mão de um futuro brilhante para pintar. Se
fôssemos uma sociedade rica que respeitasse as artes e a pintura, aí – bem, por
que não? Mas mesmo na Europa, todo mundo sabe que Van Gogh e Gauguin era
malucos.” ( pag.
378)
E:
“Quando você era
pequeno, mesmo quando as coisas iam muito mal, você estava sempre sorridente,
alegre, otimista – ah, você era um menino tão doce. Todo mundo que olhava para
você tinha de sorrir.Não só porque você era bonitinho, mas porque você nem
sabia o que era a tristeza. Você nunca se aborrecia; mesmo nos piores momentos
você inventava alguma coisa e ficava brincando alegremente horas a fio; estava
sempre tão animado. Uma pessoa assim, se transformar num artista perturbado e
miserável sempre puxando o saco dos ricos – mesmo que eu não fosse a sua mãe,
não poderia agüentar essa transformação.” (pag.382)
Pamuk em 2006 ganhou o Nobel de Literatura e no mesmo ano foi
apontado pela revista TIME como uma das cem pessoas mais influentes do mundo.
Em 2007, após receber uma série de ameaças, foi obrigado a abandonar Istambul e
a exilar-se nos Estados Unidos.
Se eu fosse você, que tem projetos a realizar, ia correndo a
uma livraria.
Até breve.
(*) Istambul: memória e cidade / Orhan Pamuk, tradução Sérgio
Flaksman – São Paulo, Companhia das Letras, 2007.
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